A piada de Schäuble: “Oferecemos a Grécia e recebemos Porto Rico”

Porto Rico e Grécia, com as suas finanças em perigo e sem poderem desvalorizar a sua divisa, têm problemas semelhantes, mas também muitas diferenças.

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Wolfgang Schäuble é o ministro das Finanças da Alemanha

A quatro dias da hora da decisão para a Grécia, o ministro das Finanças alemão parece estar a manter o bom humor. A falar numa conferência em Berlim, quando questionado sobre os apelos dos EUA para que a Europa aceite uma reestruturação da dívida grega, Wolfgang Schäuble decidiu responder com uma piada: “No outro dia, propus ao meu amigo Jack Lew [secretário do tesouro norte-americano] que nós podíamos ficar com Porto Rico na zona euro, se os Estados Unidos estivessem dispostos a levar a Grécia para o dólar. Ele pensou que eu estava a brincar”.

Na Grécia — e se calhar em vários outros pontos da Europa —, poder-se-á ter achado que o facto de o ministro das Finanças de um país brincar com a possibilidade de “entrega” de outro país aos Estados Unidos vai um pouco mais além do que aquilo que é razoável no humor negro, mas será que a comparação entre a situação de Porto Rico com o dólar com a que vive a Grécia com o euro faz mesmo sentido?

Porto Rico, que é um território dos Estados Unidos mas não é um estado da federação, tem como divisa o dólar e está com sérias dificuldades em fazer face à dívida pública que acumulou nos últimos anos. O governador Alejandro Garcia Padilla já afirmou que “não é possível pagar a dívida”. Esta é uma das semelhanças entre aquilo que se está a passar na Grécia e em Porto Rico. Com as suas políticas monetárias entregues, respectivamente, a Frankfurt e a Washington, ambas as economias cresceram em décadas passadas acumulando demasiada dívida e, agora, enfrentam uma situação em que o crescimento potencial é muito baixo, o desemprego atinge níveis muito elevados e a emigração dos mais qualificados está a atingir recordes.

Isto compromete ainda mais a capacidade para trazer a dívida pública para níveis mais sustentáveis, com os dois territórios pressionados a fazer mais para equilibrar as finanças públicas e tornar as economias mais competitivas.

Na Grécia, depois de dois resgates, o Governo discute com os parceiros europeus em que condições é que pode ser disponibilizado um novo empréstimo, enquanto em Porto Rico, a Administração Obama já tornou claro que não está disponível para ajudar as contas públicas do território.

Mas há diversas e muito significativas diferenças de circunstâncias que tornam a situação de Porto Rico mais facilmente gerível do que a da Grécia. A principal é que o sistema financeiro porto-riquenho não está tão interligado com o Estado como o grego. Os bancos porto-riquenhos não têm um fardo significativo de dívida pública em seu poder e não há qualquer perigo de perderem acesso ao financiamento da Reserva Federal, algo que agora acontece aos bancos gregos.

Outra diferença é que os detentores da dívida pública de Porto Rico são investidores privados, e não os próprios Estados Unidos. No caso grego, quem agora detém a maioria da dívida são, para além dos bancos helénicos, os outros Estados da zona euro.
Além disso, nos mercados, a hipótese de uma saída de Porto Rico do dólar não é sequer contemplada. O dólar é usado no território desde o final do século XIX e um regresso ao peso é considerado extremamente improvável. Na Grécia, a expressão Grexit foi uma das que entraram rapidamente no léxico de milhões de europeus.

Neste cenário, para os Estados Unidos, a opção de deixar cair as finanças públicas de Porto Rico em falência é uma opção encarada com relativa normalidade, tal como aliás já aconteceu com estados e municípios norte-americanos.

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