Governo cria estrutura para o presidente do CCB gerir zona de Belém

António Lamas tem de apresentar ao Governo um plano estratégico para aquela zona de Lisboa, cheia de monumentos e museus. Não se sabe ainda quando.

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António Lamas vai coordenar estrutura de missão para Belém Nuno Ferreira Santos

O Conselho de Ministros aprovou a criação de uma estrutura de missão para fazer o Plano Estratégico Cultural da Área de Belém, em Lisboa.

O plano, que tinha sido encomendado a António Lamas quando este assumiu a presidência do Centro Cultural de Belém (CCB) em Outubro de 2014, passa a ter assim uma entidade autónoma que responde pela proposta a apresentar ao Governo e pela sua implementação.

Segundo o gabinete do secretário de Estado da Cultura, será António Lamas a coordenar esta missão que quer pôr em prática uma gestão integrada no eixo Belém-Ajuda, considerada a zona monumental mais visitada do país. A estrutura - designada por Estrutura de Missão da Estratégia Integrada de Belém - fica na dependência directa da Presidência do Conselho de Ministros. “Juridicamente tem que estar na dependência da Presidência do Conselho de Ministros, porque é também na Presidência que está integrado o secretário de Estado da Cultura, que depende directamente do primeiro-ministro, mas o primeiro-ministro delega essa competência no secretário de Estado da Cultura”, explica Francisco Azevedo e Silva, do gabinete da Presidência.

O comunicado do Conselho de Ministros diz que “a concepção e a implementação de uma estratégia cultural integrada de desenvolvimento da área de Belém envolverá as diferentes entidades responsáveis pelos museus, jardins, monumentos e equipamentos culturais". O novo organismo foi criado por uma resolução do conselho de ministro "com o objectivo de assegurar a utilização eficiente de recursos”.

A estrutura de missão terá uma comissão directiva, presidida por Lamas, com dois vogais nomeados pelo secretário de Estado da Cultura, explicou ao PÚBLICO João Póvoas, do gabinete de comunicação de Jorge Barreto Xavier. Ainda não se sabe com quem Lamas vai trabalhar.

“Estou muito satisfeito com esta possibilidade de trabalhar num plano para Belém, é uma prova de confiança muito grande”, disse António Lamas ao final da tarde. “Até aqui as instituições instaladas na zona têm trabalhado juntas com base no interesse e nas relações que foram capazes de estabelecer. É muito importante que o diálogo entre elas tenha um enquadramento reconhecido”, acrescentou, remetendo para mais tarde qualquer esclarecimento adicional sobre o plano a desenvolver.

António Lamas será ainda apoiado na sua missão por "uma comissão de natureza consultiva", continua João Póvoas. Nesta comissão consultiva, soube o PÚBLICO, terão assento representantes da Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC), do Turismo de Portugal, da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo, do Estado-Maior da Armada, da Câmara Municipal de Lisboa, entre outros.

Embora o comunicado do Conselho de Ministros não detalhe quais são os equipamentos culturais envolvidos, poderão integrar a lista a Torre de Belém, o Mosteiro dos Jerónimos, o Museu de Arte Popular, o Padrão dos Descobrimentos, o Museu da Presidência da República, o Museu Nacional dos Coches, o Museu Nacional de Etnologia, o Museu Nacional de Arqueologia, o Jardim Botânico da Ajuda, o Palácio da Ajuda, o Planetário, o Museu da Marinha, o Jardim Tropical.

O Conselho de Ministros justifica a criação desta estrutura com “a elevada qualidade e a diversidade dos activos culturais que se concentram na área de Belém, conjugados com a beleza natural da foz do rio Tejo, e com o facto de se tratar de um destino privilegiado de visitantes nacionais e estrangeiros", apresentando "um potencial de crescimento que importa mobilizar para a criação sustentada de riqueza e de emprego”.

Luís Raposo, antigo director do Museu Nacional de Arqueologia (MNA), em Belém, uma das vozes mais activas no que toca às políticas públicas para o património, recebe a notícia desta estrutura com alguma reserva. Porquê? Porque o timing da sua criação, a poucos meses das eleições legislativas, quando a sua missão aponta para um horizonte de execução que entra claramente na esfera de um novo executivo, pode pôr em risco a sua eficácia.

“Criar um plano de gestão integrada quando isso implica equipamentos muito diferentes e com muitas tutelas é uma tarefa ambiciosa e complexa do ponto de vista técnico e burocrático”, diz ao PÚBLICO, numa breve conversa telefónica. “Decidir começar a trabalhar nela quando faltam poucos meses para mudar o Governo obriga-nos a relativizar a decisão tomada hoje pelo Conselho de Ministros. E se o próximo governo não quiser esta estrutura nem o seu plano?”

Luís Raposo reconhece “competência técnica e capacidade de trabalho” a António Lamas, e até concorda com algumas das suas ideias para Belém, como o enterramento da linha do comboio que separa a zona monumental do rio e o facto de os monumentos e museus da zona precisarem de uma gestão integrada, que os faça trabalhar em conjunto, mas tem uma divergência basilar: “Do ponto de vista profissional, seria óptimo [Raposo trabalha no MNA], mas como cidadão não posso concordar que se planeie distribuir as receitas dos monumentos de Belém, os mais visitados do país, apenas naquele perímetro e que assim se ponha em causa toda a política nacional para o património e o seu princípio de redistribuição.”

Raposo duvida ainda que o CCB deva vir a centralizar a gestão da zona, ainda que, do ponto de vista prático, perceba que a sua estrutura, mais leve do que a da DGPC, possa acelerar alguns procedimentos. “É preciso ter alguns cuidados para garantir que esta estrutura de missão não serve, sobretudo, para resolver a falta de receitas próprias do CCB nem para resolver o problema dos custos de funcionamento do novo Museu dos Coches. As verbas geradas em Belém fazem falta à gestão coerente do património espalhado pelo país.”

Se esta situação for acautelada – se se “impedir que o CCB e os Coches hipotequem o resto do património nacional” – Raposo acha que Lamas pode ser a pessoa certa para criar um plano com potencial estratégico, numa “óptica de longo prazo, capaz de fazer cidade”, para Belém.

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