"Penso em Rui Rio para fazer a limpeza desejável no PSD"

Miguel Veiga diz que partidos da maioria não têm sido hábeis e que o PSD deixou de ser social-democrata.

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Miguel Veiga, fundador do PSD, diz que o partido deixou de ser social-democrata Nelson Garrido

Fundador do partido defende que Rui Rio deve ser o próximo líder do PSD, mas só se tiver condições. Quanto às legislativas de 2015, diz que a vitória “será dada” ao PS, porque os portugueses começam a estar fartos dos desastres deste Governo e desta coligação.

PSD e o CDS têm condições para renovarem a coligação para as eleições legislativas de 2015?
Condições haverá, mas sem sucesso.

Porquê sem sucesso?
Sem sucesso porque não repetem a vitória eleitoral de 2015.

Mas do seu ponto de vista, há condições politicas para os dois partidos se entenderem?
Isso há, até por uma questão de sobrevivência de um e de outro e de afirmação política, porque um sem o outro não vai a lado nenhum.

Encontra vantagens numa reedição de uma aliança pré-eleitoral entre os dois partidos ou entende que o PSD deve estar disponível para um entendimento com o PS no caso de ter maioria relativa?
Encontraria se houvesse essa hipótese de ganho eleitoral e de vencimento eleitoral, mas pessoalmente não acredito que, mesmo coligado com o CDS, o PSD ganhe as próximas. A vitória nas próximas eleições vai ser dada ao PS.

O que está a dizer é que António Costa será o futuro primeiro-ministro?
Os portugueses começam a estar fartos dos desastres deste Governo e desta coligação e, portanto, não querem repetir a dose.

Que balanço faz do Governo liderado por Pedro Passos Coelho?
Quem dá o que tem não é obrigado a mais e eles [Passos Coelho e Paulo Portas] podem pouco. Politicamente não têm sido hábeis e o meu partido infelizmente, para mim, deixou de ser um partido social-democrata, deixou de ter passado. Hoje em dia, o doutor Francisco Sá Carneiro é apenas uma figura de cartaz, não é invocado para nada. O PSD é um partido híbrido, tendo acolitado gente — uma gente apreciável, mas outra gente não apreciável e muito discutível sobre todos os aspectos, a começar na fidelidade ideológica, porque hoje em dia é difícil situar o PSD ideologicamente.

Na hora de prestar contas aos militantes sobre o Orçamento do Estado para 2015, Passos Coelho assumiu que é “ponto de honra” tirar Portugal do défice excessivo em 2015. Acha possível atingir esse objectivo ou o primeiro-ministro já está com um discurso pré-eleitoral?
É muito difícil fazer esse tipo de previsões. Compreendo que ele o faça em termos eleitorais, quanto à viabilidade desse discurso tenho as maiores dúvidas. E tenho também as maiores dúvidas que o PSD, com Passos Coelho à frente, possa reeditar um ganho eleitoral. Já não seria a mesma coisa se o PSD tivesse à frente um Rui Rio, porque essa é a chave para muitas outras coisas…

Não acredita então que o ano de 2015 seja o “momento de viragem na recuperação do rendimento dos portugueses”, como, recentemente, proclamou o primeiro-ministro?
Tenho dúvidas, não tenho esse dom de adivinhação, mas não me parece muito provável.

O Presidente da República alertou recentemente para o risco de implosão do sistema partidário português tal qual o conhecemos. O que podem/devem fazer os partidos para mudar este estado de coisas?
Os partidos têm uma grande dificuldade de se auto-regenerarem, uma grande dificuldade, porque há um valor de inércia muito grande. Existem pessoas que entraram para os partidos e que se foram acomodando, que foram tecendo a sua teia de interesses e de influências próprias, interesses muitas vezes não legítimos, mas o que é certo é que são uma força. Desalojar esses indivíduos não é tarefa fácil. Só com um surto novo — e é por isso que eu penso em Rui Rio — e uma mudança de circunstâncias será possível fazer a limpeza desejável para o partido.

Mas o risco de implosão existe, como referiu o Presidente da República?
Implosão não. Os partidos estão muito arreigados e são as únicas forças políticas organizadas. Pode dizer-se que os partidos têm sofrido uma grande erosão e isso é uma verdade, o que dá origem a movimentos singulares díspares, quase todos de orientação populista, na medida em que se afirmam contra os partidos. Quanto a mim, os partidos ainda estão de pedra de cal.

Se o PSD for muito penalizado nas legislativas, Passos Coelho terá condições para se manter na liderança do partido?
Não sei. Estou muito afastado da organização partidária do PSD, sobretudo dos seus meandros, das suas teias e, portanto, do seu sistema de auto-segurança e de autodefesa interna.

Falou de Rui Rio. O ex-presidente da Câmara do Porto pode vir a ser o próximo líder do PSD?
Se tiver condições para isso.

E que condições são essas?
As condições são ter o horizonte limpo dentro do PSD, porque Rui Rio, como toda a gente sabe, não é um adepto desta liderança e resta saber como é que as forças que hoje em dia dominam, pior do que isso, o ocupam inteiramente, poderão reagir a uma investida de Rui Rio. Eu acredito nela, espero por ela e faço votos que o consiga.

O que está a dizer é que Rui Rio pode tornar o PSD num partido diferente daquele que é hoje e que a si o “entristece” e “revolta”?
Sim, pela simples razão que o doutor Rui Rio é um social-democrata genuíno, ideologicamente e na prática. Portanto, tem todas as possibilidades de fazer renascer o espírito, a alma e a afirmação de um PSD social-democrata que ele hoje não é.

Então é o quê o PSD hoje?
É um partido híbrido que não sabe bem onde se situa, situa-se através de determinadas personalidades que, politicamente, são também muito discutíveis, díspares, fluídas, não convincentes e, sobretudo, não são fiéis ao espírito da criação do partido e à mensagem deixada por Francisco Sá Carneiro que hoje em dia no partido está absolutamente silenciado.

O PSD perdeu a ideologia?
Claro que sim, sem dúvida nenhuma.

Continua a pensar que o PSD é um partido apenas de Lisboa?
De Lisboa e de uma certa província que se agrega, por vezes, sempre interessadamente, mas normalmente pelos bons motivos à clique de Lisboa.

O PSD deve introduzir as primárias, abrindo o partido aos simpatizantes?
Nunca pensei a sério nisso, mas não tenho nada contra. Mas esta direcção do PSD nunca deixará que isso aconteça. Com Rui Rio será possível.

Nas últimas eleições autárquicas apoiou o independente Rui Morreira contra o candidato oficial do PSD, Luís Filipe Menezes, à câmara do Porto e o partido ameaçou expulsá-lo. Nunca deu muita importância a essa ameaça…
Nenhuma. Dei uma importância zero. Estava completamente a marimbar-me quanto à eventual reacção do partido.

Faltou coragem política ao PSD para expulsar alguns históricos do partido que decidiram fazer companha por Rui Moreira contra Menezes?
A direcção recuou, porque muitas vezes os mais incapazes têm réstias de bom senso.

Que avaliação faz do primeiro ano de Rui Moreira à frente da Câmara do Porto?
Boa. Conheço bem Rui Moreira considero-o um homem muito competente, muito interessado, muito sabedor e tudo quanto é tocado por ele fica com a sua impressão digital. Continuo a apoiá-lo e a felicitá-lo.

O PSD pode vir a apoiar Rui Moreira em 2017, prescindindo de um candidato próprio à Câmara do Porto?
Não. O PSD nunca fará isso, porque hoje o PSD não é um partido que tenha esse grau de inteligência, de mobilidade e de percepção do verdadeiro fenómeno político. As pessoas que estão à frente do PSD agarram-se ao poder de qualquer maneira e seja contra quem for que não seja do círculo deles.

Foi um erro político, o partido ter apoiado Luís Filipe Menezes?
Foi muito mais do que um erro político, muito mais, foi uma idiotice pegada e os resultados estão à vista. O povo pronunciou-se e de uma maneira claríssima…

Luis Filipe Menezes tem condições para regressar à política depois desta derrota?
Não tenho relações com o dr. Luis Filipe Menezes, portanto tudo o que eu possa dizer tem de ser interpretado com esta reserva. Não sei o que ele fará — e o que ele vier a fazer também pouco me interessa —, só sei que ele já fez tantas, tantas e tantas coisas e tão diferentes, algumas tão más, que tudo é possível. Mas auguro que o futuro dele não será muito risonho.

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