Memorial do Convento só abandona a escola durante dois anos

A controvérsia deu frutos. A obra que hoje é obrigatória para os alunos do 12.º ano só sairá do programa do ensino secundário durante dois anos, tempo de afirmação para O Ano da Morte de Ricardo Reis.

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Estudo do Memorial do Convento volta a ser opção em 2019 Enric Vives-Rubio

A obra Memorial do Convento, de José Saramago, não foi, afinal, banida do programa de Português do ensino secundário, que, tal com o de Matemática e o de Física e Química, foi homologado nesta segunda-feira. Face à controvérsia gerada, a comissão científica do Ministério da Educação chegou “a uma solução de compromisso” – em 2017 /2018 e 2018/2019 a obra de Saramago obrigatória no 12.º ano será O Ano da Morte de Ricardo Reis, que no ano lectivo seguinte passa a opcional, tendo como alternativa o Memorial do Convento.

A indicação foi dada ao PÚBLICO por Helena Buescu, coordenadora da comissão científica responsável pelo novo programa de Português, que considera que esta é uma forma de responder de forma positiva a quem defendeu que o Memorial do Convento se mantivesse e de, ao mesmo tempo, “garantir que O Ano da Morte de Ricardo Reis é encarada como uma obra alternativa". “A primeira obra está muito estudada e já foi produzido muito material de apoio ao ensino. Tornar a segunda obrigatória, durante dois anos, é a forma de garantir que também em relação a ela é feito esse trabalho, e que, a partir daí, a opção se faz sem esse condicionalismo”, explicou, em declarações ao PÚBLICO.

Helena Buescu admite que a comissão científica que elaborou a proposta e agora a adaptou (de acordo com os elementos recebidos em fase de consulta pública) foi “surpreendida pela controvérsia” que envolveu professores, especialistas em literatura e até a Câmara Municipal de Mafra, que contestou a substituição da obra de Saramago, alegando que a construção do convento que serve de pano de fundo ao romance "exerceu um papel fundamental na valorização turístico-cultural do concelho".

Recentemente, também em declarações ao PÚBLICO, a coordenadora da comissão científica responsável pelo novo programa de Português sublinhou que a proposta que seguiria para homologação nunca teria “como fundamento razões políticas ou económicas, mas científicas”. “O Ano da Morte de Ricardo Reis, em particular, é considerada pela crítica a melhor obra de Saramago e tem uma densidade social e política muito relevante, que permite uma abordagem de questões do século XX que não são menos importantes do que aquelas que o Memorial do Convento levanta em relação ao século XVIII”, referiu, na altura.

Outra das vantagens apontadas por Helena Buescu para a mudança, mais uma vez tendo como referência O Ano da Morte de Ricardo Reis, é a possibilidade de recuperar ou estabelecer ligações com outros conteúdos do programa e outros autores, como Cesário Verde e Fernando Pessoa”.

Com esta “solução de compromisso”, o romance História do Cerco de Lisboa acabou por não entrar nesta última e definitiva versão do programa. 

Os alunos que entrarem no 10.º ano em 2015/2016 serão os primeiros a ler obrigatoriamente O Ano da Morte de Ricardo Reis quando estiverem no 12.º ano, já que está previsto que o programa do ensino secundário seja aplicado de forma progressiva, a partir desse ano.

Segundo Helena Buescu, foram feitas outras alterações ao programa inicialmente proposto, considerado demasiado extenso pelos professores. “Foi possível fazer adequações sem colocar em perigo o que propúnhamos”, disse. 

A dirigente da Associação de Professores de Português (APP), Edviges Ferreira, remeteu para esta terça-feira a análise das alterações. 

Quando as propostas dos programas homologados esta segunda-feira foram conhecidas, tanto os representantes dos professores de Português como os dirigentes da Associação de Professores de Matemática (APM) consideraram-nos extensos e inaplicáveis e protestaram contra “um formalismo” e uma “especialização” “desadequados” que, na sua perspectiva, iriam aumentar o insucesso e desviar alunos do ensino regular para percursos alternativos.

“O programa é de uma extensão brutal, são introduzidos temas de uma complexidade matemática desajustada e as dificuldades da transição do ensino básico para o secundário são ignoradas — nada faz sentido”, criticou na altura Lurdes Figueiral, a dirigente da APM que nesta segunda remeteu para os próximos dias um comentário sobre a versão homologada, que hoje deverá ficar disponível na página da Internet da Direcção-Geral de Educação.<_o3a_p>

 
 
 
 
 
 

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