Nova lei das insolvências visa acelerar processos e aumentar as recuperações

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Foto: Paulo Ricca

O Governo deverá aprovar nesta quinta-feira, em Conselho de Ministros, a revisão da lei das insolvências, cumprindo, à recta, uma imposição da troika.

Com as mudanças, os processos deverão ser tratados com maior celeridade e os casos de gestão danosa terão sanções reforçadas, numa altura em que os casos de falência judicial continuam a aumentar. O anteprojecto foi, porém, alvo de muitas críticas.

Fonte oficial do Ministério da Justiça garantiu ao PÚBLICO que a revisão do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas (CIRE) "será discutida na próxima reunião de Conselho de Ministros", que acontecerá hoje. Uma vez aprovada pelo Governo, a proposta legislativa "seguirá para a Assembleia da República, onde será apresentada, discutida e votada", acrescentou.

As alterações a esta lei foram impostas pela troika, na sequência do pedido de ajuda externa, face ao entupimento dos tribunais e às queixas de várias entidades do sector. No Memorando de Entendimento assinado em Maio, ficou estabelecido que o Governo teria de rever a legislação em vigor no máximo até Dezembro e de modo a aumentar os casos de recuperação de empresas e a agilizar os processos de insolvência, no máximo, até Dezembro de 2011. Falta agora discutir a necessidade de criar novos tribunais especializados nesta matéria, até Janeiro.

O anteprojecto de lei, enviado pelo Ministério da Justiça para diversas entidades no final de Dezembro, incluía algumas das mudanças que o executivo se tinha proposto a levar a cabo. Além da introdução de um novo mecanismo para negociação extrajudicial de dívidas, com vista a um aumento dos casos de viabilização financeira, previa um encurtamento de prazos e eliminava algumas fases dos processos, retirando trabalho aos tribunais.

Uma das principais alterações, com impacto na vida dos credores afectados pelas empresas insolventes, era a maior responsabilização dos gestores que forem considerados culpados pela falência judicial. Nestes casos, passarão a ser considerados inabilitados para administrar património de terceiros e arriscam-se a ser condenados a pagar indemnizações pelos prejuízos causados.

Anteprojecto criticado

O processo de discussão iniciado pelo Ministério da Justiça, que durou até meados deste mês, envolveu um conjunto vasto de entidades: os Conselhos Superiores da Magistratura, o Ministério Público, a Ordem dos Advogados e a Associação Portuguesa dos Administradores Judiciais (APAJ), entre outros. "Foi uma consulta pública que permitiu, de forma efectiva, enriquecer o anteprojecto de revisão do CIRE", referiu a tutela.

Porém, nem todos os contributos foram consensuais. A Associação Sindical dos Juízes Portugueses, por exemplo, considerou que "parte das alterações [efectuadas] nada têm a ver com os objectivos definidos pelo Governo (...) e nem sequer se compreendem face à realidade nacional".

A associação referia-se, por exemplo, ao facto de o novo mecanismo de negociação extrajudicial de dívidas consistir um processo judicial, o que acaba por não cumprir o objectivo de libertar os tribunais.

Também os administradores de insolvência, nomeados aleatoriamente pelos tribunais para acompanhar estes processos, criticaram o anteprojecto de revisão do CIRE. "Trata-se de uma revisão limitada, uma vez que não faz referência a alterações na parte correspondente às insolvências de pessoas singulares", que já representam mais de metade dos casos, referiu o presidente da APAJ, Raul Gonzalez.

Estes profissionais, que ganham a possibilidade de substabelecer com a nova lei (podendo passar a gozar férias), levantaram ainda dúvidas quanto ao facto de o Ministério da Justiça não se ter debruçado sobre "a harmonização e simplificação fiscal", referindo-se ao facto de continuarem a ser responsabilizados pelas dívidas que as empresas que acompanham deixam por pagar junto das Finanças e da Segurança Social.

Já a Ordem dos Advogados apontou, por exemplo, como falhas o encurtamento do prazo de apresentação à insolvência, que passará de 60 para 30 dias, por considerar que "não irá ter qualquer efeito útil" por ser um prazo demasiado curto. Além disso, sugeriu que, em vez de o gestor culpado indemnizar directamente os credores, pague a dívida à massa insolvente (património que resta da empresa) para depois se fazer a distribuição.

O Ministério da Justiça garantiu ao PÚBLICO que "procedeu a um conjunto de alterações ao anteprojecto de revisão do CIRE" face aos contributos apresentados e "com o intuito de aperfeiçoar" a nova legislação exigida pela troika. Não se sabe ainda, porém, se a versão final da lei conseguirá satisfazer todos os interessados e atingir os grandes objectivos: acelerar as insolvências e aumentar os casos de recuperação em Portugal.

Proposta da ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, foi alvo de críticas dos administradores de insolvências.

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