Uma vitória para a democracia ou o prelúdio de uma catástrofe?

Seja qual for o resultado, este domingo é um dia histórico para a Grécia e para a Europa.

Os gregos vão neste domingo às urnas mais uma vez e o mundo volta a centrar o seu olhar no pequeno país mediterrânico. Como em 2012, as apostas são muito altas e podem-se estender para além da Grécia.

Para Antonis Samaras, o primeiro-ministro grego actual e líder do partido conservador Nova Democracia (ND), o que está em jogo é a estabilidade da economia grega, que começou a mostrar alguns sinais de recuperação em 2014. Mesmo mais do que a recuperação da economia, para Samaras uma mudança de governo neste momento poderia pôr em risco o lugar do país no euro e na família europeia em geral. Para Alexis Tsipras, líder da oposição parlamentar e do partido de esquerda radical Syriza, uma vitória do seu partido pode significar não apenas o fim das políticas de austeridade na Grécia, mas o primeiro passo da mudança política em toda a zona euro.

Uma das razões por que as eleições gregas têm atraído de novo tanta a atenção é o facto de que o Syriza, quase de certeza, será o vencedor. É provavelmente seguro assumir que o interesse nestas eleições seria muito menor se a ND estivesse bem à frente do Syriza nas sondagens. Desde a declaração de eleições antecipadas, rios de tinta correram já numa tentativa de especular sobre o que um governo do Syriza fará, se ganhar efectivamente as eleições. O crescente consenso de economistas e analistas de todo o mundo é que o Syriza tem razão sobre a insustentabilidade da dívida grega e no enfatizar a necessidade de a reduzir. Ao mesmo tempo, há um reconhecimento quase universal de que um Governo Syriza terá poucas vantagens, além do seu mandato democrático, numa negociação com os seus credores internacionais. Em 2012, o medo principal para Berlim e Bruxelas foi o potencial contágio económico que poderia ser causado por um default grego descontrolado, o qual poderia mesmo levar ao colapso da zona do euro. Em 2015, o medo de contágio económico foi substituído pelo medo de um contágio político que uma vitória do Syriza poderia provocar, especialmente com o Podemos em ascensão na Espanha.

Por esta razão, é expectável que um governo do Syriza seja confrontado por um governo alemão intransigente e que possa estar disposto a esmagar uma desafiante Grécia, a fim de enviar uma mensagem forte para outras forças políticas que possam querer desafiar o compromisso com o caminho de austeridade. Neste caso, o único recurso de um Governo Syriza poderia ser um volte-face e a aceitação de prosseguir com as políticas dos governos anteriores, arriscando-se a perder legitimidade tanto aos olhos do eleitorado como perante o próprio partido. O que vai mesmo acontecer está em aberto.

Mas, primeiro, o Syriza precisa vencer a eleição de hoje. A esse respeito, tudo está a correr muito bem para o partido de Alexis Tsipras. A diferença entre o Syriza e a ND cresceu de forma constante nas últimas três semanas. De acordo com as últimas sondagens, nesta semana a vantagem do Syriza nas intenções de voto era de cerca de 6 pontos percentuais face à ND. A campanha do medo desenvolvida pela ND não foi tão eficaz desta vez. A última chance de uma reviravolta, favorável a Antonis Samaras, foi uma exclusão explícita da Grécia do programa de compra de dívida que foi anunciado pelo Banco Central Europeu na quinta-feira. Mas Mario Draghi não respondeu negativamente às perguntas sobre a Grécia, como, paradoxalmente, as sedes da ND e do PASOK gostariam.

Portanto, a questão premente sobre os resultados deste domingo não é sobre quem vai ser o vencedor, mas se o Syriza será capaz de formar um governo. Se as sondagens estiverem correctas, o Syriza não ganhará os 151 assentos parlamentares de que precisa para obter uma maioria absoluta. As últimas sondagens dão a Coligação de Esquerda Radical perto, mas abaixo dos 36% e, o mais importante, prevêem que sete partidos ultrapassam o limiar dos 3% e entrem no parlamento. Para o Syriza ganhar com maioria absoluta, seria necessário que os “Gregos Independentes” (Anel), que agora estão perto da linha dos 3%, ficassem de fora do parlamento. Além da ND, os outros quatro  partidos que se espera que entrem no parlamento são o Pasok, o partido neo-nazi Aurora Dourada, o novo partido centrista O Rio (To Potami), e o Partido Comunista (KKE). Nenhum desses partidos regista mais de 7% nas sondagens e parece que O Rio e a Aurora Dourada vão lutar pelo 3.º lugar.

Se o Syriza não conseguir ganhar com maioria absoluta, terá de colaborar com um desses partidos, com excepção da Aurora Dourada. O aliado mais natural do Syriza, o KKE, rejeitou repetidamente ofertas de colaboração, e não há nenhuma razão para acreditar que desta vez será diferente. Evangelos Venizelos, líder do Pasok, e o ex-primeiro-ministro George Papandreou também expressaram a vontade de colaborar com Syriza, mas, no caso do primeiro, isso é algo quase impossível de aceitar pela base da Coligação de Esquerda, e, no caso do segundo, parece que o novo partido que criou não conseguirá passar a fasquia dos 3%. Por isso, os dois candidatos mais prováveis para participar num governo de coligação com o Syriza são mesmo O Rio e o Anel. O Rio está perto do Syriza na dimensão esquerda-direita, especialmente em assuntos relacionados com valores sociais e políticos. Mas O Rio está contra uma confrontação com os credores internacionais, pois pensa que tal poderia pôr em risco o lugar da Grécia na Europa. Pelo contrário, o ANEL é um partido da direita populista e há uma grande distância ideológica entre si e o Syriza, na maioria dos assuntos. Mas há proximidade na questão da dívida que “tem minado a soberania do país".

A formação de um governo minoritário do Syriza ou de realização de novas eleições, como em 2012, também são cenários possíveis, mas menos prováveis. Aconteça o que acontecer, uma coisa é certa: com um partido de esquerda radical no governo entraremos em um território desconhecido, não só na Grécia, mas na Europa em geral. Para alguns, isso vai significar uma vitória para a democracia. Para outros, o prelúdio de uma catástrofe. Seja qual for o resultado, este domingo é um dia histórico para a Grécia e para a Europa. Politólogo, investigador do CIES-IUL

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