Um consórcio petrolífero que atenue a hegemonia australiana em Timor-Leste

Há meses que Timor-Leste visita os seus parceiros da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) para os convencer a criarem um consórcio petrolífero vocacionado para explorar o potencial do seu onshore. Esta quarta-feira, os líderes da organização de cooperação deram um passo em direcção ao grande objectivo dos timorenses para o semestre em que ocupam pela primeira vez a presidência da CPLP: os chefes de Estado e de Governo dos países-membros comprometeram-se a criar um grupo técnico para estabelecer um consórcio petrolífero.

A posição saída da cimeira dá um formato alargado ao consórcio a estudar para “exploração e produção conjunta de hidrocarbonetos no espaço da organização” e coloca o dossier na alçada das reuniões periódicas dos ministros de Energia. Para os líderes da CPLP, há “um enorme potencial de cooperação” no âmbito de uma “visão de conjunto da sua dimensão energética”, com estimativas que indicam que será em 2015 o sétimo maior produtor mundial e, em 2025, o quarto maior.

As grandes descobertas de petróleo no Brasil e de gás em Moçambique, nos últimos anos, e a expectativa quanto ao potencial de petróleo no pré-sal de Angola associaram-se ao interesse de Timor. No entanto, para este pequeno país asiático de língua oficial portuguesa, a ambição de um consórcio petrolífero lusófono representa muito mais do que interesse económico.

A braços com uma longa e dura batalha de afirmação da sua soberania em relação à Austrália, Timor procura um meio de atenuar a distância estratégica em relação ao Ocidente e a hegemonia australiana. O grande, rico e poderoso vizinho de Timor-Leste impediu até agora um dos mais novos e pequenos países do mundo de estabelecer as suas fronteiras marítimas e desfrutar em pleno dos recursos petrolíferos que a lei internacional lhe dá direito. Esta estabelece que entre dois países à distância a que estão Austrália e Timor, o que vale é a mediana, o que Canberra não aceita.

Se o interesse australiano prevalecer sobre as pretensões timorenses, que levou o caso ao Tribunal Internacional de Justiça no ano passado, Díli terá apenas direito ao seu território marítimo em 2057, altura em que a sua maior riqueza em petróleo e gás natural, que se situa no mar, terá sido retirada por empresas australianas. Por exemplo, o grande campo petrolífero Sunrise está três vezes mais perto de Timor do que da Austrália, mas é esta que fica com 80% das receitas.

Face a uma complexa teia de acordos que misturam petróleo e fronteiras políticas e que foram assinados por Timor pouco depois do fim da ocupação indonésia e sob forte pressão da Austrália, Díli denunciou o acordo de 2006, que impede o país do acesso soberano ao seu mar, e pediu arbitragem. Porém obstáculos não faltam, já que os australianos retiraram-se das convenções internacionais, em 2002, quando começaram actividade no mar de Timor, pelo que não podem ser formalmente chamados a responder.

Mas é desde o final do ano passado que as relações entre os dois países atingiram a maior tensão, envolvendo serviços de espionagem australianos. A justiça australiana mandou invadir o escritório do advogado que representava Timor-Leste, que se queixa também de que todas as negociações que levaram ao acordo de 2006 foram espiadas. A documentação foi apreendida pela Austrália e Timor-leste não tem acesso a ela.

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