Um concerto para a libertação de activistas angolanos "que são eu e tu"

Lisboa e Luanda têm concertos ao mesmo tempo pedindo a libertação imediata de um grupo de 15 activistas presos desde 20 de Junho sem acusação formada. É apenas liberdade de expressão, diz o artista Kiluanji Kia Henda, "não é nenhuma ideia subversiva".

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O curador da ZDB sublinha que todos os artistas convidados quiseram participar Enric Vives-Rubio
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O curador da ZDB sublinha que todos os artistas convidados quiseram participar Enric Vives-Rubio

“Os tipos que são presos são eu e tu”, diz Natxo Checa, curador de artes visuais da Galeria Zé dos Bois, em Lisboa, no dia de um concerto no âmbito da campanha “liberdade já!” para os 15 activistas que foram detidos em Junho em Angola, enquanto decorria um concerto também em Luanda. “A mensagem é apenas optar pelo diálogo – não há aqui nenhuma ideia subversiva”, nota pelo seu lado o artista Kiluanji Kia Henda.

Há representantes de vários países lusófonos nos concertos de Lisboa: Cabo Verde, Guiné, Moçambique e Brasil para além de Angola. Natxo Checa ficou muito feliz que tudo pudesse ter sido organizado “num dia”: “foi pegar no telefone e não houve uma pessoa que tivesse dito que não”, excepto por terem outros concertos. É Agosto, há férias, mas as pessoas continuam a chegar à ZDB. “Toda a gente disse: sim, queremos ser solidários”. A questão é realmente muito simples: “é reivindicar democracia de facto”.

No Facebook, eram partilhadas fotos do início do concerto em Luanda, no Teatro Elinga, uma sala independente, parecida com a ZDB, a maioria com T-shirts brancas e o símbolo da iniciativa, pedindo “liberdade já”.

“Não é estar contra ou a favor, não há inimigos”, sublinha Kiluanji Kia Henda. “Não vejo como algum angolano possa não defender esta causa”, já que “não é agitação, é pela paz”. 

“Estamos a apelar ao respeito pela Constituição, e esta não foi escrita pelos artistas nem pelos activistas”, enfatiza Kiluanji Kia Henda.

Os activistas estão presos sem acusação formal, mas responsáveis políticos apontam-lhes uma “tentativa de golpe de Estado”. Os primeiros 13 foram presos quando debatiam política à volta de um livro sobre resistência não-violenta contra a opressão numa casa em Luanda, outros foram presos nos dias seguintes, ficando conhecidos como o grupo dos 15”. Para além da falta de acusação, familiares e advogados queixam-se de dificuldade nas visitas aos detidos. Na semana passada, a polícia carregou sobre um protesto que exigia a libertação dos activistas.

“É normal que haja erros no processo democrático numa democracia tão jovem" com a angolana, comenta Kiluanji Kia Henda. Não há fatalidade, nem catástrofe. É um episódio triste de imaturidade, mas com diálogo e entendimento tudo se pode ultrapassar”, diz o artista angolano, para concluir que “é preciso haver uma pressão constante da sociedade civil para melhorar”.

Um pouquinho de bom senso
Antes de actuar, o músico e colunista Kalaf diz que o seu desejo é que “haja um pouquinho de bom senso e que sejam libertados imediatamente os presos políticos”. Embora sublinhe que “é pena que tenha de ser feita na sequência de um evento tão dramático e trágico para as pessoas envolvidas e a sociedade em geral”, diz que é “saudável” discutir o tema liberdade de expressão.

“Agora está toda a gente atenta, a ver se a procuradoria apresenta provas.” Defendendo que “a sociedade se debruce sobre este assunto e exija aos dirigentes e organismos que não se esquivem às suas responsabilidades, que é servir o povo”, Kalaf termina com um desejo: “só espero que toda a gente seja muito sensata”. Apesar de apenas uma coisa estar em causa - “que quase 20 pessoas estão presas porque pensaram diferente” - ele diz que é “quase inevitável olhar para toda a política do Governo”, desde o julgamento de Rafael Marques por um livro centrado na indústria dos diamantes, até a detenções em Cabinda.

Kalaf termina dizendo que se “sente tocado” por viver um “bom momento de muita solidariedade no mundo que fala português”.

Da posição de Portugal, especialmente das autoridades portuguesas, é Natxo Checa quem fala: “Para que serve a bandeira da lusofonia neste momento? Portugal deveria dizer que a democracia também inclui liberdade de expressão”, defende.

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