Tudo isso é muito triste

No âmbito da série especial sobre o Brasil, o PÚBLICO fez a diversas personalidades brasileiras a pergunta: para onde vai o Brasil?

O Governo da Presidente Dilma Rousseff, de qualquer lado que se analise, apresenta um resultado medíocre. Tal mediocridade refere-se, em primeiro lugar, a uma condução equivocada da economia.

É verdade que as conquistas sociais do Governo Lula mantiveram-se em geral. Mas o processo de diminuição da desigualdade e da elevação do padrão de vida do povo foi estancado pelo baixo crescimento da economia e pela inflação relativamente alta. Em outras palavras, o processo de inclusão social foi paralisado e pode sofrer uma reversão, se os fatores negativos persistirem.

Vejam-se as seguintes considerações:

O produto interno bruto apresentou números sofríveis, como se vê no exercício seguinte:

1. Durante o Governo Dilma, a taxa média anual de crescimento da economia foi de 1,9% (2011-14). Essa taxa é significativamente menor do que a taxa secular (1890-2014) da economia brasileira, que é de 4,4%. Ou seja, a “taxa Dilma” fica em apenas 40% da taxa média de todo o período republicano. Estes dados bastariam para caracterizar a mediocridade do atual Governo. O Brasil precisa, em média, 16 anos para duplicar o PIB, enquanto, com a “taxa Dilma”, o país só duplicaria o PIB real em 37 anos!

Estudos econômicos irrefutáveis indicam que 70% dos países têm tido um desempenho superior ao da economia brasileira nos últimos três anos.

2. Não é preciso uma análise muito profunda para se reconhecer que os protestos populares, que têm ocorrido desde meados de 2013, refletem, em boa medida, o desempenho medíocre da economia e a crise de legitimidade do Estado. A queda gradual nas pesquisas dos índices de aprovação do Governo refletem este mal- estar.

3. A comparação do desempenho da economia brasileira durante o Governo Dilma com o desempenho do conjunto dos países em desenvolvimento é muito eloquente. Então, é ainda mais evidente o péssimo desempenho do Brasil. A taxa média de crescimento econômico do Brasil no Governo Dilma (1,9%) é menor do que a metade da taxa média de crescimento do conjunto de 152 países em desenvolvimento (4,3%). Estes números frios demonstram o fracasso do Governo Dilma. O país perdeu o impulso que vinha modificando o seu panorama sócio- econômico e entrou numa zona de incerteza.

Com relação à performance econômica internacional, o quadro brasileiro é também sofrível. A posição média do Brasil no ranking de países é 22.º em amostra de 32 países. No ranking da América Latina, o Brasil ocupa a 33.ª posição, ou seja, 67% dos países da região têm desempenho superior ao do Brasil no período 2011-14. Mais uma vez, cai por terra a grande importância relativa atribuída pelo Governo à conjuntura internacional para explicar o desempenho medíocre da economia brasileira durante o Governo Dilma. Em suma, o Brasil perde gradualmente espaço internacional – como atesta o rebaixamento do país pela agência Standard and Poor’s – e vê seu futuro comprometido por erros que terão efeitos negativos além de um mandato presidencial.

Sem querer cansar o leitor com fatos e números da economia, diria que, no que diz respeito à infra-estrutura básica, ou seja, transportes públicos, fornecimento de  eletricidade, estradas, portos e aeroportos, o panorama é igualmente desolador. A trajetória do Governo é marcada por fraco desempenho, crescente vulnerabilidade externa, transformações estruturais que fragilizam e implicam volta ao passado; e ausência de mudanças ou de reformas que sejam eixos estruturantes do desenvolvimento de longo prazo. O quadro sombrio se acentua com a deterioração dos serviços de saúde pública e da educação básica. Tudo isso é muito triste.

A política externa do Governo não leva a conclusões mais animadoras. O Brasil tem sua posição internacional cada vez mais assinalada por uma opção ideológica, sem precedentes na nossa história diplomática. Cada vez mais alinhado com o chamado "grupo bolivariano", cujo expoente maior é lamentavelmente a Venezuela, o Brasil tem presença menos significativa no cenário internacional e regional. A pretensão de liderança regional tem como a única base o inventário territorial e económico formidável que temos. Porém, no exercício desta suposta liderança, o Brasil não desempenhou papel algum nas disputas políticas entre Estados sul-americanos, tendo-se omitido por completo no grave diferendo entre a Argentina e o Uruguai, sobre questões econômicas e territoriais. Tampouco desempenhou papel algum no conflito interno na Colômbia e suas repercussões sérias nas relações desse país com a Venezuela e com o Equador.

Este quadro infelizmente não permite tirar conclusões alvissareiras sobre o futuro do Brasil, que está sendo comprometido por um mau governo.

Antigo ministro dos Negócios Estrangeiros do Brasil, antigo embaixador do Brasil em Portugal

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