Tsipras prepara remodelação do Governo depois do cisma no Syriza

Foi o programa aprovado com mais votos no Parlamento, mas também foi o memorando que mais revolta causou no partido do Governo. Há quem preveja eleições no Outono. Bancos abrem segunda-feira.

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Tsipras tem escolhas difíceis para fazer Christian Hartmann/Reuters

"Continuamos", era a manchete do diário Avgi, ligado ao Syriza, o partido do primeiro-ministro gregos, Alexis Tsipras É o que tenta fazer o partido e o Governo, depois de, na véspera, ter votado um programa de austeridade contra o qual sempre prometeu lutar, com uma rebelião significativa dos seus deputados

A primeira resposta parece ser uma remodelação governamental, que estava a ser preparada esta quinta-feira e deverá ser anunciada já esta sexta-feira. Fontes dizem que o primeiro-ministro tenta incluir personalidades técnicas para além de políticas.

O analista Dimitris Rapidis, do centro de estudos Bridging Europe, nota os “grandes esforços” de membros do Syriza para não partir o partido apesar da cisão evidente. O mais relevante ministro a votar contra, Panagiotis Lafazanis, que tem a pasta da Energia, e lidera a Plataforma de Esquerda, a fação mais radical do Syriza, disse que manteria o apoio ao Governo, apenas não votaria a favor das medidas do memorando.

“Mas é muito difícil ao Governo funcionar” assim, sublinha Rapidis. Especialmente com a segunda ronda de medidas a ser votada na próxima semana no Parlamento. “As perdas [de votos no Syriza] podem aumentar e aí Tsipras deverá anunciar eleições”.

Esse cenário foi já posto pelo ministro do Interior, Nikos Voutsis, em declarações à rádio Sto Kokkino, emissora ligada ao Syriza. “Dependendo dos desenvolvimentos, é muito provável que haja eleições em Setembro ou Outubro”, antecipou. Para Voutsis, a remodelação governamental terá de acontecer antes da votação das próximas medidas, no dia 22.

Cerca de um quarto dos deputados do Syriza (38 em 149) votaram contra (32) ou abstiveram-se (6) na noite de quarta-feira. Nunca houve uma revolta deste género em partidos do Governo na votação de anteriores memorandos, apesar destes terem tido menor aprovação parlamentar - este programa contou com 229 votos a favor, o primeiro, em 2010, teve 172 deputados a favor, e o segundo, em 2012, teve 199 - e ainda apesar das cisões causadas em aprovações anteriores (foi assim que surgiu o partido Gregos Independentes, de uma revolta de deputados da Nova Democracia contra a aprovação do segundo memorando).

O comité central do Syriza partiu-se antes da votação, e vários membros importantes do partido votaram contra: a presidente do Parlamento, Zoe Konstantopoulou, o antigo ministro das Finanças Yanis Varoufakis, para além dos deputados da Plataforma de Esquerda.

Segundo o analista Nick Malkoutzis, do diário Kathimerini e do site de análise Macropolis, Tsipras conseguiu mais do que o limite mínimo: “124 deputados do Governo [Syriza e Gregos Independentes] apoiaram a lei, o que é mais do que os 121 considerados mínimos para manter o mandato”, defende.

O papel da oposição
“Os partidos da oposição vão pressionar Tsipras para formar um governo alargado com eles”, diz Rapidis.”Isto é impossível porque se acontecer, os deputados que agora apoiam Tsipras deixariam de o fazer.” No debate que antecedeu a votação, a Nova Democracia já tinha deixado claro que “não há maioria a la carte” e que não iria cooperar com o Governo a qualquer preço.

O ministro Aristides Baltas explicou como o Governo planeia seguir: “a maioria dos deputados do Syriza e os neoliberais” aprovarão as medidas do memorando, a esquerda apoiará as outras reformas. “Podemos avançar para partes da nossa agenda que não sejam económicas”, disse Baltas, dando o exemplo da luta contra a corrupção.

Mas tudo isto é muito instável e poderá não durar. Se forem marcadas eleições, “a Plataforma de Esquerda poderá formar um outro partido para concorrer às eleições. Ou então poderemos ver uma mudança de liderança no Syriza, com Tsipras a formar um novo partido ou a demitir-se. Finalmente poderemos ver uma mudança de 360 graus no Syriza”, enumera. “É tudo muito pouco claro”, conclui.

Entretanto, os bancos na Grécia, fechados desde o dia 29 de Junho, vão reabrir na segunda-feira, mas os depositantes só vão poder levantar 60 euros por dia, revelou na noite desta quinta o ministro-adjunto das Finanças, Dimitris Mardas.

“A partir de segunda-feira, as pessoas podem ir aos bancos e fazer todas as operações", afirmou o ministro na televisão pública grega, salientando que os levantamentos mantêm-se limitados a 60 euros diários.

Na Praça Syntagma, tudo tinha voltado à normalidade depois da violência da noite anterior. Havia ainda câmaras preparadas para directos, embora cada vez menos. Segundo o diário grego Kathimerini, todos os acusados por danificar propriedade (no metro, e uma carrinha de exteriores de uma televisão) eram estrangeiros: alemães, franceses, polacos, e ainda um australiano, um holandês e um ucraniano. A polícia não confirmou nem desmentiu esta informação.

A juventude do Syriza já veio pedir a demissão do vice-ministro da ordem pública, Yannis Panoussis, por “provocações da polícia anti-motim” na manifestação. É muito duro para o Syriza que estando no poder um Governo de esquerda a polícia carregue sobre manifestantes, ainda que as provocações tenham partido de elementos radicais e não de activistas do partido.

 

 

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