Tensão no Báltico reabre debate sobre a NATO na Suécia e na Finlândia

A crescente tensão no Mar Báltico coloca Estocolmo e Helsínquia perante um dilema. Aderir à NATO seria a melhor garantia de segurança. Mas Moscovo diz-lhes que será exactamente o contrário

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Navio da Marinha sueca "HMS Koster" em busca do submarino suspeito MARKO SAAVALA/REuTERS

Sucedem-se os incidentes militares no Mar Báltico, que ameaça tornar-se num novo teatro de atrito político-militar na Europa. Como consequência, surge uma pergunta: vão a Suécia e a Finlândia abandonar a sua histórica neutralidade e aderir à NATO? De momento é improvável mas o debate foi reaberto.

A Estónia, a Letónia e a Lituânia, embora pertencendo à NATO, são os países com maior sentido de vulnerabilidade, temendo ser o próximo alvo de Moscovo. Mas também a Suécia e a Finlândia se inquietam. A tensão no Báltico cresceu nos últimos anos e disparou com a conquista da Crimeia pela Rússia.

Isolados, os incidentes não teriam relevância. O que “enerva” é a repetição. Exemplo: segundo a BBC, aviões da NATO interceptaram esta quinta-feira um “avião espião russo”. Um Ilyushin-20 foi impedido de entrar no espaço aéreo da Dinamarca por dois F-16 dinamarqueses, depois interceptado por caças suecos, entrando a seguir no espaço aéreo da Estónia, onde passou a ser escoltado por dois F-16 portugueses até reentrar no espaço internacional.

O submarino fantasma
O caso do “submarino fantasma” de Estocolmo dominou a semana. A Marinha sueca desencadeou uma operação de “perseguição e caça” a um misterioso submarino, supõe-se que russo, ao largo da capital. O aparato fez relembrar cenas da Guerra Fria: em 1981, os suecos retiveram durante dez dias um submarino soviético, com armas nucleares, junto da sua maior base naval.

A operação, com navios e helicópteros, foi lançada no sábado. Na segunda-feira, o diário sueco Expressen dedicou-lhe 20 páginas. Moscovo desmentiu as acusações. Os especialistas acreditam tratar-se de um “submarino-miniatura” que, na miríade de ilhas e baías ao largo de Estocolmo, facilmente encontraria esconderijo. Mais do que a intrusão, é a impotência militar que preocupa os suecos. Venderam em 2008 a frota de helicópteros anti-submarino e só em 2017 terão outra.

O mais traumatizante episódio remonta a 29 de Março de 2013. Bombardeiros intercontinentais e caças russos fizeram um exercício em que simulavam um ataque surpresa contra Estocolmo e alvos militares no Sul da Suécia. A Força Aérea sueca foi incapaz de reagir de imediato.

A Suécia dispôs de um dos mais poderosos exércitos do mundo. O fim da Guerra Fria e a crise económica dos anos 1990 levaram à sua drástica redução. Estocolmo apostou nas missões internacionais e descurou a defesa do território. Em Dezembro de 2012, o comandante das Forças Armadas chocou o país ao declarar que, em caso de ataque, o exército só poderia defender o país durante uma semana.

A nova Rússia de Vladimir Putin e a pressão que ela exerce sobre os vizinhos, designadamente sobre os três Estados bálticos, força os suecos a repensar uma neutralidade de dois séculos: “Nenhuma aliança militar em tempo de paz, neutralidade em tempo de guerra.”

A semi-neutralidade
A neutralidade da Suécia e da Finlândia já não é o que era durante a Guerra Fria. Entraram na União Europeia. Não fazem parte da NATO mas aderiram à sua Parceria para a Paz, em 1994. São “parceiros disfarçados da NATO”. Participam em exercícios da Aliança e em missões no Kosovo e no Afeganistão. Estocolmo teve um activo papel nas operações aéreas na Líbia em 2011. Em Junho, as marinhas russas e da NATO fizeram manobras navais paralelas e, entre as forças da Aliança, estavam navios suecos e finlandeses.

Até agora, ambos os países acreditavam na “solidariedade” — da UE e da NATO — em matéria de segurança. Mas sabem que a garantia perante um ataque militar só se aplica aos membros da NATO. Dinamarqueses e noruegueses avisaram a Suécia de que, em caso de agressão, só a ajudarão no quadro da NATO. Por isso a questão passou a ser objecto de debates parlamentares.

Escreveu em Março o diário sueco Aftonbladet: “Na verdade não há alternativa à NATO. Uma adesão retiraria a Suécia do vazio que caracteriza actualmente a sua política de segurança.” Em Abril, Martti Ahtisaari, antigo presidente finlandês, defendeu a entrada do seu país na NATO. Mas a opinião pública resiste. Para 50% dos suecos e 58% dos finlandeses, os seus países devem permanecer fora da Aliança.

Anota o britânico The Guardian que, se os suecos perderem a confiança nas suas Forças Armadas para garantirem a segurança do país, “a longo prazo, a lógica da posição geoestratégica da Suécia tornará a adesão à NATO quase inevitável”.

Perguntam-se os nórdicos: até onde está Moscovo disposta a ir? Para o ex-MNE sueco Carl Bildt, que defende uma linha dura perante Moscovo, “o Báltico será o grande teste à relação entre Ocidente e Rússia”.

Qual é a lógica das “provocações” de Moscovo, que não tem interesse em hostilizar a Suécia e a Finlândia? Responde Tomas Ries especialista de segurança no Colégio de Defesa Nacional, de Estocolmo: “A Rússia está a enviar uma mensagem ao mundo exterior dizendo que ‘a velha Europa’ acabou. (...) A Rússia quer criar um novo statu quo na Europa.”

Moscovo não tem interesse em antagonizar a Suécia e a Finlândia. O que lhes diz é que terão mais problemas de segurança se continuarem a aproximação à NATO.

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