Síria, a marcha sem fim

As regras do jogo estão a mudar. Se Alepo cair, como tudo indica, Assad terá uma importante vitória.

Metade da população está deslocada ou refugiada no estrangeiro. São 11 milhões de pessoas. O conflito arrasta-se há cinco anos e já fez mais de 250 mil mortos. Há dias, durante a conferência de doadores de Londres, a directora de uma ONG síria que ainda não abandonou o país pediu: “Têm de negociar, não apenas falar.”

Parece simples, mas os sinais não são encorajadores. As conversações de Genebra acabaram por ser adiadas. Em Alepo, que antes da guerra era o centro comercial e financeiro da Síria, estão encurraladas milhares de pessoas. São os pobres dos mais pobres, que não conseguiram sair a tempo, antes de o “corredor de Azaz”, que faz ligação com a fronteira turca, ter sido cortado. Há pelo menos 12 países a bombardear a Síria neste momento. “Como é que estes 12 países conseguem organizar-se e mobilizar-se para lançar bombas, mas não conseguem mobilizar-se para lançar ajuda, comida e medicamentos?”, perguntava a mesma mulher. Em certas zonas de Alepo, há 250 bombardeamentos num só dia.

As regras do jogo mudaram – e não para melhor. Há um ano, as tropas do Presidente Bashar al-Assad tentaram tomar Alepo, mas não conseguiram. A fragilidade de Assad ficou tão exposta que Moscovo acabou por vir em seu socorro. Neste momento, Alepo está praticamente controlada por Assad e as suas tropas chegam à região vindas do norte, do centro e do sul. Teme-se o pior para quem não conseguiu sair.

Os que fugiram a tempo, estão há dias à porta da Turquia, sem que a Turquia abra a porta. Ancara já alberga mais de 2,5 milhões de sírios e não quer mais. Nos campos de refugiados entre a Síria e a Jordânia o cenário é igual. Mais de 70% dos que ali estão têm menos de 18 anos e mais de 50% são mulheres. Vieram a pé de Alepo. Há pessoas há três meses à espera, mas 17 anos é o tempo médio de vida num campo de refugiados. O Líbano, que tem mais de um milhão de refugiados, disse que “já não consegue dar resposta – as crianças não vão à escola e as rações de comida são cada vez mais pequenas”.

A última vez que o ACNUR fez um apelo para o mundo ajudar a Síria, recebeu metade do prometido. Filippo Grandi, o novo alto comissário do ACNUR, que acaba de suceder a António Guterres, acredita que desta vez será diferente. Acredita que o mundo está, finalmente, pronto a contribuir – porque quando um país ajuda, diz Grandi, fá-lo por generosidade mas também por interesse próprio. Antes de sair, e com dez anos de frustração acumulada, Guterres criticou abertamente o sistema em geral mas também países em particular. Deu a França como exemplo de um país que promete mas que nada faz no momento de enviar o cheque. O equilíbrio de poder está a mudar, a Turquia e a Arábia Saudita não têm opções simples em cima da mesa e ninguém, sobretudo os EUA, quer fazer frente directa a Putin. Vai Putin conseguir persuadir Assad a sair? Ou a nova dinâmica vai simplesmente aumentar a força do jihadismo na Síria? Com as eleições americanas à porta, ninguém espera que do actual impasse surjam soluções.

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