Shinzo Abe à procura de legitimidade para a sua estratégia económica

O primeiro ministro antecipou em quase dois anos as eleições. No meio de uma nova recessão, quer testar a vontade dos japoneses para uma nova ronda de Abenomics.

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A entrada em recessão forçou Shinzo Abe a ter de ir a votos Toru Hanai / Reuters

Com a estratégia económica que implementou há dois anos em risco de falhar, Shinzo Abe decidiu esta terça-feira que precisa de uma nova vitória eleitoral para poder avançar com novas e mais ousadas medidas.

O primeiro ministro japonês anunciou em conferência de imprensa que irá propor a realização de eleições para a câmara baixa do parlamento já em Dezembro, antecipando em quase dois anos a consulta popular que decide quem lidera o Governo.

A gota de água para a tomada desta decisão foi a publicação na quinta-feira dos dados do crescimento económico do terceiro trimestre deste ano que revelaram que o Japão voltou, pela quarta vez desde 2008, a entrar em recessão técnica. O novo recuo da economia está a ser visto como mais um sinal de que a Abenomics – a estratégia delineada pela Administração Abe para retirar o Japão da armadilha da deflação em que caiu há mais de duas décadas – se arrisca a não resultar.

A opção de Shinzo Abe, contudo, não é a de dar um passo atrás e reformular a estratégia. É antes a de ir a votos com uma versão ainda mais agressiva de Abenomics, que adie por mais tempo a consolidação orçamental e que avance finalmente com algumas das reformas estruturais prometidas mas ainda não passadas à prática.

“Há opiniões diferentes em relação às reformas estruturais que propus e, por isso, decidi ouvir a voz dos japoneses e saber a sua opinião sobre se devemos ou não avançar com essas reformas”, afirmou Shinzo Abe na conferência de imprensa em que anunciou a antecipação das eleições.

Entre as reformas a que o primeiro ministro japonês se refere está uma alteração da legislação laboral, que é vista por alguns economistas como um obstáculo para a capacidade do Japão concorrer com economias vizinhas como a China, Coreia ou o Vietname. No Japão, que apesar do fraco crescimento económico tem uma taxa de desemprego relativamente baixa, existe nas empresas uma cultura de emprego para a vida. Isto é algo que a Administração Abe se propôs a mudar com o argumento de que é preciso dar a oportunidade a trabalhadores mais jovens e inovadores.

Mas para além das reformas estruturais, o que Abe quer ainda levar a votos é a decisão, também anunciada esta terça-feira, de adiar para 2017 uma nova subida do IVA que estava agendada para Outubro de 2015.

No passado mês de Abril, o IVA subiu de 5% para 8% e essa medida foi uma das causas para que a economia tivesse registado uma quebra no segundo e terceiro trimestres do ano. Abe diz agora que uma nova subida para 10% poderia colocar ainda mais em causa o objectivo de crescimento da economia.

O problema é que vários sectores da sociedade japonesa, incluindo dentro do Governo, viam esta subida de imposto como a medida que poderia compensar a expansão da despesa pública prevista na Abenomics, impedindo que a dívida pública continue a subir para além dos 200% do PIB em que já se encontra.

Shinzo Abe tentará agora convencer aqueles que estão mais preocupados com os riscos orçamentais de que, nesta fase, o mais importante é mesmo garantir que a economia volta a crescer e que a inflação se mantém em terreno negativo. Ou seja, que o Japão diz adeus à crise deflacionista em que caiu no início dos ano 90.

Este tipo de discussão, entre os que defendem uma política expansionista agressiva e os que temem que o país esteja a acumular uma dívida que não conseguirá pagar, tem sido decisiva na formação e queda dos Governos no Japão nas últimas décadas. E desta vez não será excepção.

Outros temas em debate serão a nova estratégia de defesa seguida por Shinzo Abe, que tenta dar um papel mais activo para as forças militares nipónicas, e o fiasco que constituiu a última remodelação governamental, que no espaço de poucas semanas resultou em três demissões no Executivo.

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