Sementes de choque e pavor

Muitos mais que botas no terreno são necessárias políticas activas de solidariedade às forças democráticas daqueles países.

Os países do Médio-Oriente estão mergulhados numa crise da qual não se enxerga uma saída a curto ou médio prazo.

Os países do Magreb e Macherreque criaram os seus Estados em torno de fronteiras artificiais estribadas num Exército saído das diversas libertações coloniais.

Nalguns deles existiam partidos seculares ou de cariz religioso. Noutros foram as monarquias absolutistas a base do regime.

No essencial uns seguiram um modelo de inspiração soviética com muitas diferenças, outros um modelo monárquico absolutista ou mais ou menos liberal. Em traços grossos.

A invasão do Iraque sob a designação “Choque e pavor” e a intervenção na Líbia e indiretamente na Síria criaram o caos naqueles países e em toda a região.

Se juntarmos a invasão do Afeganistão temos um cenário catastrófico em todo o mundo muçulmano.

As intervenções militares derrubaram os governantes, mas abriram brechas profundíssimas na frágil unidade nacional, fazendo saltar os pilares em que assentava a existência daqueles Estados.

Liquidando as elites dirigentes não tiveram em conta a existência de forças militares sem qualquer ideologia e prontas para invocar o nome de Alá, em vão, e assaltarem o poder.

No Iraque a sociedade mais ou menos organizada no aparelho de Estado a partir dos sunitas foi tomada pelos xiitas com forte apoio do Irão.

Na Líbia reina o caos total: todos contra todos. As lutas tribais tomaram o país. As riquezas do país estão a ser a ser disputadas em função das forças milicianas em cada região.

A insurgência na Síria fortemente apoiada pela Arábia Saudita, Emirados, Turquia e o Ocidente levou aquele país à beira da desagregação.

Os grupos jiadistas no terreno no Iraque tiveram campo aberto com reforço de todo o tipo de meios para avançar no terreno e criar o auto proclamado Estado Islâmico, uma espécie de fascismo clerical brutal, cujas ações são de tal modo sanguinárias que parecem irreais.

As vitórias festejadas por George W. Bush devem merecer, passados todos estes anos, uma reflexão de todos quanto se preocupam com o caminho desta parte do mundo, tão rica em petróleo e gás natural.

Os grupos jiadistas no terreno no Iraque tiveram campo aberto com reforço de todo o tipo de meio para avançar e criar o auto proclamado Estado Islâmico, uma espécie de fascismo clerical brutal, cujas ações são de tal modo sanguinárias que parecem irreais.

As vitórias festejadas por George W. Bush devem merecer, passados todos estes anos, uma reflexão séria de todos quanto se preocupam com o caminho desta parte do mundo, tão rica em petróleo e gaz natural, mas também berço da nossa civilização.

Não se trata de defender nem o enforcado Saddam Hussein, nem o torturado até à morte, o coronel Kadhafi, nem o ditador de Damasco.

As intervenções criaram as condições para que as forças militares mais fortes tomassem de assalto o poder ou criassem dentro dos respetivos países os seus territórios de governo.

O Estado Islâmico ocupa faixas de terreno na Síria e no Iraque, sendo que neste último país domina a segunda cidade mais importante e um conjunto de campos de petróleo que lhe permite uma base de financiamento para manter as suas posições.

O mundo árabe e muçulmano não era nada perfeito antes das intervenções militares (longe disso), porém as intervenções vieram derrotar as elites governantes e espalhar um sentimento de humilhação que leva à rejeição do Ocidente.

E não apenas naquele mundo, mas também nos subúrbios das grandes cidades da Europa, EUA e Austrália.

São vários milhares de jovens franceses, alemães, ingleses, australianos que abandonaram as suas famílias e se alistaram nas fileiras do E.I.

Se a situação atual é preocupante, não deixa de o ser no futuro, pois não é de momento imaginável prever como vai assentar a nova ordem que há-de sair destes conflitos.

No Iraque, na Síria, no Irão e sobretudo na Turquia há minorias curdas. No norte do Iraque os curdos têm o controlo do Curdistão iraquiano. No norte da Síria são eles que resistem em Kobane ao E.I.

A Turquia não quer nenhum território curdo autónomo nas suas fronteiras que possa dar alento aos movimentos curdos no país.

O Médio-Oriente é uma região nevrálgica para o mundo, quer pela sua localização, quer pelas suas riquezas. É, por isso, cobiça das grandes potências.

Quanto mais forças militares externas a cada país se envolverem nos vários conflitos, tanto maior será a desestabilização e o fortalecimento de forças extremistas religiosas.

O processo parece caminhar na direcção que apontava Samuel Huntington, mas o choque das civilizações não é inevitável. Neste momento histórico são os extremismos políticos travestidos de jiadismo que têm a dianteira. Há outras forças naqueles países: laicas, religiosas, patrióticas, de esquerda e de direita liberal. Há-de ser desta amálgama que sairá uma alternativa e nunca das botas no terreno.

As monarquias ribeirinhas ao Golfo e a própria Arábia Saudita não estão fechadas a sete chaves face aos ventos da História. Irão viver as sua transformações por muito que as queiram impedir e exportar forças que as impeçam.

Nada vai ficar na mesma em toda a região. As fragilidades estão á vista de todos. Os estremeções do terramoto que varre a região vão continuar. Não chegou ainda a hora da estabilização. O Estado Islâmico sustenta-se com o terror quase paranóico. Não há sociedades que ao pé da Europa se mantenham nesta base.

Muitos mais que botas no terreno são necessárias políticas ativas de solidariedade às forças democráticas daqueles países que as ajudem a elas serem as obreiras do seu futuro. Os EUA e a Europa podem capturar Saddam, matar Osama, assistir à morte brutal de Kadhafi em direto. Não estão a moldar um futuro democrático; a um outro nível estão rivalizar com os jiadistas e os seus shows de horror. Varia a intensidade mas não o choque e o pavor. O choque de civilizações pode levar ao fim de todas.  

Advogado

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