Mariano Rajoy admite pela primeira vez que o PP fez pagamentos extra

Presidente do Governo espanhol explicou o seu envolvimento no "caso Bárcenas". Socialistas insistem que deve demitir-se.

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Rajoy: o que Bárcenas disse é mentira AFP/Susana Vera

O presidente do Governo espanhol, Mariano Rajoy, admitiu esta quinta-feira no Parlamento de Madrid que o seu Partido Popular fez pagamentos extras. Não admitiu que os recebeu, mas a dúvida ficou quando disse: "Sempre declarei os meus rendimentos e as minhas declarações de rendimentos estão à vista".

“Fizeram-se pagamentos? Sim. Pagaram-se remunerações complementares em virtude dos cargos? Sim. Pagaram-se verbas por gastos inerentes ao desempenho dos cargos? Também, como em todo o lado. É justo. Pagou-se por um trabalho, pagou-se e incluía-se o pagamento na contabilidade. Declarar os rendimentos privados às Finanças é uma responsabilidade individual. No que me diz respeito, asseguro-vos que sempre declarei todos os meus rendimentos. As minhas declarações de renda e de património dos últimos dez anos estão à vista de todo o mundo. E parece-me que têm mais valor do que o que está escrito à toa num papel amachucado”.

Rajoy foi acusado pelo antigo tesoureiro do PP, Luis Bárcenas, de ter recebido um complemento salarial quando era ministro do Govenro de José Maria Aznar. Isto apesar de ser proibido pela Lei das Incompatibilidades, que impede detentores de cargos públicos de receberem qualquer remuneração além do seu salário.

Bárcenas mantinha uma contabilidade paralela, alimentada por um cofre financiado ilegalmente por empresas, e os documentos dessa contabilidade foram entregues ao juiz que investiga o caso. Os papéis têm registos de pagamentos feitos a Rajoy. Bárcenas disse que Rajoy sabia que a contabilidade paralela existia e beneficiava dela.

"Nunca recebi nem distribuí dinheiro negro [pago à parte]. Nem neste partido, nem em nenhum sítio. É falso", dissera Rajoy no dia 2 de Fevereiro, quando o caso foi revelado nos jornais espanhóis.

No Parlamento, Rajoy não falou na primeira pessoa. De qualquer forma, excluiu qualquer ilegalidade nesses pagamentos à parte porque, disse, declarou todos os seus rendimentos às Finanças e negou todas as outras declarações do seu antigo tesoureiro, que o implicam directamente e ao PP. "O meu papel nesta história foi este: cometi o erro de acreditar num falso inocente. Enganou-me? Sim. Era fácil para ele porque eu não condeno ninguém com base em suposições", disse Rajoy.

O chefe do Governo disse que a história de Luis Bárcenas, que foi tesoureiro do PP, começou em 2009. "Soubemos que o tesoureiro tinha sido imputado no 'caso Gürtel'", outro caso de corrupção na direita espanhola. Lembrou que havia muitas acusações contra o tesoureiro, mas que estas foram retiradas, e recordou que houve um ministro socialista, e um juiz, Baltazar Gárzon, que foram afastados por usarem meios ilegais na investigação. Justificou a confiança que deu a Bárcenas com a atitude da Justiça - chegou a retirar as acusações contra Bárcenas.

Depois, disse, chegaram documentos à imprensa, Bárcenas fez acusações. "São falsas as suas acusações, as suas meias verdades e as interpretações dos media", disse Rajoy, que chegou a falar de fascismo e estalinismo ao dizer que está a ser julgado na praça pública sem possibilidade de defesa.

A oposição exigiu várias vezes que fosse ao Parlamento explicar-se, Rajoy rejeitou-o sempre. Só o desgaste provocado pelo início dos depoimentos de Bárcenas fez o PP ceder e aceitar que Rajoy fosse responder perante as Cortes. Os socialistas ameaçaram com uma moção de censura – "Não me ameacem. Se cada vez que um presidente de um Governo socialista tivesse que vir a esta câmara e tivéssemos apresentado uma moção de censura, tinha havido muitas".

A sessão deverá ser longa e Rajoy terá que se submeter às perguntas de todos os partidos da oposição com assento nas Cortes. Os socialistas admitem recorrer à moção de censura se Rajoy não se demitir; os populares têm a maioria absoluta no Parlamento. "Não façam isso", apelou Rajoy, que, depois de explicar os seus ganhos, passou ao ataque cerrado aos socialistas. "Porque querem sabotar a confiança dos mercados? O que esperam conseguir a troco de levar a Espanha à ruína?", perguntou, bramindo a arma da crise financeira contra a possibilidade da moção de censura.

"O senhor, longe de ser a solução para esta crise política, agravou-a porque não se portou como um presidente do Governo, portou-se como um presidnete de um partido", respondeu o líder socialista, Alfredo Rubalcalba. O que está em causa, disse o socialista, é a existência de uma contabilidade paralela no PP, com contribuições de empresas, que durou 20 anos. "Uma contabilidade falsa", disse, acusando Rajoy de querer passar a ideia de ser uma vítima. "Quando foi que o senhor Bárcenas passou de tesoureiro inatacável a delinquente? Quando rompeu o silêncio forjado durante 20 anos".

Rubalcalba foi desmontando a defesa de Rajoy, lembrando, por exemplo, as mensagens de telemóvel que este enviou a Bárcenas, tranquilizando-o e mantendo o seu apoio, quando já se sabia que o antigo tesoureiro era um "delinquente fiscal". O que está em causa, disse o socialista, é a ilegalidade da contabilidade e o pagamento ilegal a governantes: "Os ministros têm que aceitar que não podem ganhar mais do que o salário de ministros", disse Rubalcalba, que defendeu que Rajoy tem que se demitir.
 

Notícia corrigida às 11h40: declaração completa de Rajoy sobre os pagamentos à parte feitos pelo seu partido.

Mariano Rajoy sobre Bárcenas: "Enganei-me ao confiar em quem não devia"


 
 
 
 
 
 
 
 
 

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