Polícia usa novos poderes para prender activistas ambientais em França

O Governo proibiu mais de duas centenas de mobilizações civis para a cimeira do clima, em Paris. Agora aproveita o estado de emergência para prender activistas que podem tentar furar a decisão.

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Polícias diante o terreno em que se organiza a Cimeira do Clima, em Paris Loic Venance/AFP

A França está a usar os novos poderes policiais sob o estado de emergência para fazer buscas e ordenar prisões domiciliárias a activistas ambientais que pensam que podem estar a preparar acções de protesto para a Cimeira do Clima das Nações Unidas, que arranca na segunda-feira, em Paris. Só nesta semana, seis activistas foram postos em prisão domiciliária na região de Rennes. Um deles é Joël Domenjoud, do órgão jurídico da Coligação do Clima, um grupo que representa 130 organizações civis e sindicatos de protecção dos direitos humanos e do ambiente.

As ordens de prisão domiciliária a que o Le Monde teve acesso terminam no dia 12 de Dezembro, o dia em que termina a cimeira COP21. Sob o estado de emergência – decretado na noite dos ataques a Paris e entretanto estendido até Fevereiro –, o Ministério do Interior e autoridades locais podem ordenar buscas e prisões domiciliárias sem mandado judicial, desde que acreditem que essas pessoas ou locais representam uma ameaça à ordem pública. Em alguns casos, as detenções na residência significam 12 horas por dia em casa e três apresentações diárias numa esquadra de polícia.

Na ordem de prisão domiciliária a um activista, a polícia diz ter conhecimento de comunicados que “apelam a acções reivindicativas violentas”. No contexto da grande mobilização policial para a cimeira, explicam as autoridades, os agentes não podem ser “desviados para responderem a riscos de ordem pública ligados a tais manifestações”.

O Governo francês proibiu mais de 200 iniciativas civis agendadas para os dias da COP21, incluindo a grande marcha ambiental deste domingo em Paris, para a qual se esperavam dezenas de milhares de pessoas. As autoridades temem que a chegada de dezenas de milhares de pessoas e mais de uma centena de líderes mundiais provoquem novos atentados. Foram destacados mais 3000 polícias para proteger as equipas diplomáticas e quase o mesmo número para fazer a segurança do terreno da cimeira.    

O Ministério do Interior quer chegar com ordens de prisão domiciliária a ainda mais activistas antes da cimeira, segundo escreve o Le Monde. Por enquanto, a polícia chegou principalmente a pessoas que sabe já terem participado em ZAD (Zonas a Defender), informalmente tratados como “zadistas”. A ZAD é uma modalidade de protesto, não uma organização: faz-se pela ocupação de terrenos em que geralmente se preparam obras que podem prejudicar o ambiente, o que muitas vezes provoca confrontos com a polícia. Em Outubro de 2014, numa ocupação em Pont-de-Buis, Finisterra, um jovem zadista morreu com a explosão de uma granada de atordoamento lançada pela polícia.

A polícia entrou na casa de Elodie e Julien durante a noite de terça-feira. Trazia uma ordem do prefeito da localidade e procurava “pessoas, armas ou objectos susceptíveis de estarem ligados a actividades de carácter terrorista”. Mas a razão para a busca na residência destes agricultores de alimentos biológicos era outra: o casal participara há três anos num protesto zadista contra a construção de um aeroporto em Notre-Dame-des-Landes, no Noroeste do país, um dos protestos mais mediáticos do movimento. A zona, aliás, continua ocupada, embora o primeiro-ministro francês tenha prometido em Outubro que a “minoria violenta” não “porá em causa a autoridade do Estado”.

Revistaram livros, telemóveis e computadores. Saíram só de manhã, sem que encontrassem provas de que algum deles planeava um protesto para a cimeira de Paris. Antes de o fazer, sublinharam: “Sob o estado de emergência, todas as concentrações estão interditas, e organizar uma manifestação é ilegal.”

Entretanto, um grupo de personalidades francesas lançou esta semana um abaixo-assinado com o nome “Desafiemos o estado de emergência”, no qual se propõe a ir à marcha deste domingo, apesar da proibição policial – muitos preocupam-se com uma deriva autoritária em França sob esta ordem jurídica

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