Polícia de choque turca avança com canhões de água sobre marcha do 1º de Maio

Primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan tinha dito aos manifestantes para "perderem as esperanças" de celebrar o Dia do Trabalhador na praça Taksim, em Istambul.

Foto
Polícia de choque afastou manifestantes com canhões de água REUTERS / Murad Sezer

Em vários pontos do mundo, sindicatos, activistas e manifestantes assinalaram o Dia do Trabalhador, com festas, comícios e marchas pacíficas, mas também com homenagens silenciosas às vítimas de tragédias recentes no Bangladesh ou Coreia do Sul, e ainda acções de resistência política.

Na Turquia, a polícia de choque turca usou canhões de água, gás lacrimogéneo e disparou balas de borracha para dispersar uma manifestação de milhares de trabalhadores que, desafiando as ordens do Governo, saíram à rua para celebrar o 1º de Maio junto à praça Taksim.

Cerca de 40 mil agentes de segurança foram mobilizados para a cidade de Istambul, alegadamente por razões de segurança: as autoridades alegaram informações relativas a movimentações de “grupos ilegais e organizações terroristas”. No bairro de Besiktas, o aparato foi reforçado com tanques e outros veículos blindados, e um cordão policial foi montado para isolar a praça Taksim.

Pelo seu lado, os manifestantes ergueram barreiras para travar a polícia. Quando as forças de choque investiram sobre as barricadas, os trabalhadores responderam com pedras e foguetes e outros explosivos artesanais – os confrontos fizeram pelo menos 90 feridos. Segundo a Associação de Advogados Progressistas turcas, foram efectuadas 160 detenções.

Na véspera do Dia do Trabalhador, o primeiro-ministro, Recep Tayyip Erdogan, tinha aconselhado os sindicatos a “perder as esperanças” de marchar na praça Taksim, local emblemático dos protestos contra o Governo turco que se prolongaram durante meses no Verão do ano passado. Em 1977, as celebrações naquela praça acabaram em tragédia, quando de um edifício vizinho começaram a voar tiros sobre a multidão, que mataram 34 pessoas.

Apesar da advertência de Erdogan, as organizações sindicais mantiveram a sua convocatória. “Todos os caminhos vão dar à praça Taksim no 1º de Maio”, prometia um comunicado assinado pelos principais sindicatos. “Não deixaremos de marcar presença apesar da proibição ilegal e irracional”, garantia.

Em declarações à AFP, Mahmut Tanal, deputado do Partido Republicano (CHP), a maior força de oposição, insurgiu-se contra a violência policial e a decisão do Governo de impedir as manifestações do Dia do Trabalhador. “As marchas do 1º de Maio são um direito constitucional em quase todo o mundo. Devíamos ser autorizados a manifestar-nos sem ter de enfrentar a polícia e sem provocações do Governo”, considerou.

Sindicatos espanhóis denunciam “operação de propaganda” do Governo
As duas centrais sindicais espanholas aproveitaram as habituais comemorações do Dia do Trabalhador para marchar contra a “recuperação sem emprego” e denunciar a “imensa operação de propaganda” do Governo conservador de Mariano Rajoy. Sob o lema “Por um emprego de qualidade”, os sindicatos organizaram acções em mais de 70 cidades, que mobilizaram milhares de trabalhadores, segundo a imprensa espanhola. Na Galiza, os manifestantes exigiram “trabalho digno”, enquanto em Valência lamentaram que fosse preciso sair à rua para reclamar trabalho. Em Barcelona gritou-se contra a “pobreza laboral e social” e em Bilbau reclamaram-se “menos cortes e mais soluções”.

O secretário-geral da UGT, Cándido Méndez, distinguiu entre o discurso dos empresários que se preocupam com o futuro dos jovens “nem-nem” (nem estudam, nem trabalham) e os “tambores e fanfarra” do Governo, que insiste em falar em recuperação económica ignorando a degradação da situação laboral no país.

Franceses fartos da austeridade
Em França, a palavra de ordem foi contra a austeridade. Os cortejos de 1º de Maio organizados pela CGT juntaram mais de 210 mil pessoas (65 mil em Paris), de acordo com os números da central sindical, que, à semelhança do ano passado, criticou duramente as políticas do Presidente François Hollande. “Avisem-me se descobrirem alguma diferença entre a política de Hollande e a de Sarkozy”, pediu o líder da CGT, Thierry Lepaon, que acusou o executivo de “governar para os ricos”. “Chega de austeridade”, repetiram os trabalhadores.

Pelo seu lado, a CFDT, a outra central francesa e que pelo segundo ano consecutivo organizou o seu próprio desfile, insistiu na tecla da Europa. “Queremos dizer que apesar de entendermos que as políticas europeias constituem o problema do momento, acreditamos que a Europa pode ser a solução”, disse Laurent Berger, que receia uma onde de “rejeição da Europa”, com a ascensão da extrema-direita, nas próximas eleições de 25 de Maio.

Condições de trabalho são a principal preocupação na Ásia
A memória do desabamento de um edifício repleto de fábricas de confecção, que matou mais de mil trabalhadores no Bangladesh, ensombrou as comemorações do Dia do Trabalhador naquele país. Milhares de trabalhadores pediram a execução de Sohel Rana, o dono do edifício Rana Plaza que foi construído ilegalmente, e que se encontra preso desde o acidente. Os trabalhadores exibiram cartazes a dizer “Fim às mortes nas fábricas” e disseram que a punição de Sohel Rana tinha de ser dura “para que incidentes semelhantes não voltem a repetir-se”.

Também no Vietname, Camboja, Filipinas e, os trabalhadores chamaram a atenção para as péssimas condições em que trabalham, destacando a falta de segurança de muitos locais de trabalho ou o desrespeito da legislação laboral de muitos empregadores.

Em Phnom Penh, uma concentração de trabalhadores do sector da confecção, no parque da Liberdade, foi rechaçada pela polícia com golpes de bastão – as manifestações estão proibidas desde Janeiro, na sequência de vários protestos pelo aumento do salário mínimo organizados pela oposição. Com a sua acção, a “polícia está a coarctar os direitos dos trabalhadores, que se vêem impedidos de festejar o 1º de Maio de forma apropriada”, lamentou o presidente da Coligação Democrática Unitária dos Trabalhadores Têxteis do Camboja, Ath Thorn.

O 1º de Maio foi assinalado em Jacarta, Kuala Lumpur, Singapura e também em Seul, na Coreia do Sul, onde a jornada adquiriu um tom de homenagem às vítimas do naufrágio do ferryboat Sewol, com mais de 450 pessoas a bordo, no passado dia 16 de Abril: a marcha foi substituída por uma cerimónia simples, num memorial provisório instalado junto do edifício da câmara municipal.

Na capital da Indonésia, foram mobilizados 18 mil polícias para acompanhar as acções sindicais, que se prolongavam até sexta-feira e poderiam atrair entre 30 mil e 50 mil trabalhadores, que se queixam da estagnação dos salários, das deficiências do sistema de saúde e segurança social e ainda dos elevados custos dos transportes e habitação.

Duelo de marchas prolonga braço de ferro entre Governo e oposição da Venezuela
A linha invisível que divide o território de Caracas conforme a simpatia pelo Governo ou o apoio à oposição voltou a evidenciar-se nas celebrações do Dia Nacional do Trabalhador da Venezuela. A Central Bolivariana Socialista de Trabalhadores organizou uma marcha pela cidade até à urbanização El Silencio, e chamou a população a “proteger o progresso social do trabalho” e as “conquistas alcançadas graças às respostas do Governo”.

Pelo seu lado, a Corporação de Trabalhadores da Venezuela e outras organizações que militam na oposição ao Governo ocuparam o Parque do Leste da capital, num comício contra as políticas salariais e económicas desenvolvidas pelo Presidente Nicolás Maduro – que nas palavras do secretário-geral da Federação Unitária dos Trabalhadores do Sector Petrolífero “pretendem legalizar a fome na Venezuela”.

Sugerir correcção
Comentar