Pelo menos 278 mortos em investida militar contra manifestantes da Irmandade no Cairo

Número do Minsitério da Saúde. Irmandade Muçulmana fala em mais de dois mil mortos e apela à mobilização contra um "massacre" policial.

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Manifestantes fogem durante a intervenção da polícia KHALED DESOUKI/AFP
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Colunas de fumo eram visíveis esta quarta-feira no centro do Cairo Amr Abdallah Dalsh/Reuters
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Durante a operação para dispersar os manifestantes, foram detidas várias pessoas ENGY IMAD/AFP
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Há pelo menos 278 mortos na sequência da operação das forças de segurança no Cairo e confrontos noutras zonas do país, segundo o Ministério da Saúde. O Nobel da Paz Mohamed ElBaradei, que participava no governo interino pós derrube do Presidente Mohamed Morsi, apresentou a sua demissão.

As forças de segurança egípcias avançaram na manhã desta quarta-feira contra as duas praças que os apoiantes do Presidente deposto Mohamed Morsi ocupavam há mais de um mês no Cairo. As últimas informações dão já conta de mais de uma centena de mortos, mas a Irmandade Muçulmana eleva o número de vítimas para mais de duas mil.

Antes de haver números  oficiais, um jornalista da AFP contou pelo 124 corpos – muitos com marcas de balas – em três morgues improvisadas na praça da mesquita de Rabaa al-Adawiya, que é desde o início da contestação a Morsi o bastião da Irmandade Muçulmana no Leste do Cairo.

A agência francesa divulgou também imagens de corpos de manifestantes carbonizados, o que indicia que as tendas montadas na praça terão sido incendiadas. Um enviado da televisão britânica Sky News deu também dezenas de mortos, disparos de snipers instalados na vizinhança e de muitas mulheres e crianças abrigadas na mesquita. Um jornalista do New York Times escreveu no Twitter que estariam ainda cerca de mil pessoas dentro do acampamento.

Ao longo das últimas semanas, os apoiantes de Morsi ergueram barricadas em redor da grande praça, assegurando que ali só entraria quem estivesse contra o golpe militar de 3 de Julho, quando o Exército, após grandes manifestações da oposição, reassumiu o controlo do país, derrubando o primeiro presidente eleito do Egipto. A imprensa governamental e o Governo interino (tutelado pelos militares) acusavam os islamistas de terem armazenado ali armas – o Ministério do Interior diz que dois polícias terão sido mortos mortos nesta quarta-feira por islamistas que abriram fogo a partir do local.

Responsáveis do ministério avançaram que foram detidos "vários dirigentes" da Irmandade, o movimento que dominou o Egipto após a revolução que derrrubou Hosni Mubarak, em 2011, tendo vencido tanto as legislativas e presidenciais, como o referendo à Constituição, um diploma que a oposição dizia abrir caminho à islamização do país e que foi suspenso pelos militares após o golpe militar.

Ofensiva em marcha
A situação na capital egípcia é confusa e as restrições impostas pelas forças de segurança impedem os jornalistas de confirmar muitas das informações que circulam. O Ministério do Interior anunciou ao início da manhã que estava a usar apenas gás lacrimogéneo para dispersar os ocupantes, mas desde o início da manhão sons de tiroteio ecoam nas imediações das duas praças. À distância é também possível ver negras colunas de fumo a erguer-se da zona e há confrontos em várias ruas.

A praça de Al-Nahda, situada um pouco a norte de Rabaa al-Adawiya, foi dada algumas horas depois como estando “totalmente sob o controlo” das forças de segurança. Imagens divulgadas pela televisão estatal mostraram bulldozers a destruir barreiras construídas na praça. A AFP indica que junto a estas barricadas estavam muitos apoiantes de Morsi, incluindo mulheres e crianças.

As forças de segurança terão entrado ainda em Nasr City, onde existem relatos de que snipers dispararam sobre manifestantes que se encontravam nas imediações da praça de Rabaa al-Adawiya.

A meio da manhã, o governo ordenou a suspensão a circulação de comboios para impedir manifestações nos arredores da capital.

A decisão foi tomada depois de a Irmandade Muçulmana ter lançado um apelo aos egípcios para que respondam à ofensiva com novas manifestações. “Esta não é uma tentativa de dispersão mas uma tentativa de esmagar de uma forma sangrenta toda a voz que se opõe ao golpe de Estado militar. Rabaa apela aos egípcios que venham para as ruas para impedir um massacre”, escreveu no Twitter o porta-voz da Irmandade Muçulmana, Gehad el-Haddad.

A BBC adianta que há já notícia de manifestações em Alexandria, grande cidade do Norte que é um dos bastiões da Irmandade, e em Assuão, no Sul. A agência oficial egípcia avançou também que três igrejas coptas na região central do país, em acções que aquela minoria classificou de retaliação pela ofensiva no Cairo.

Violência anunciada
A Irmandade Muçulmana rejeitou todos os ultimatos do Exército, assegurando que só parará os protestos quando Morsi, detido há mais de um mês, regressar ao poder. O Governo interino descarta tal possibilidade e assegura que só negociará com os islamistas quando estes desistirem dos protestos nas ruas.

As tentativas de mediação internacional para encontrar uma saída para a crise fracassaram e as autoridades egípcias avisaram que seria usada a força para desalojar os manifestantes assim que terminassem as celebrações do fim do Ramadão.

No entanto, nos últimos dias, a hipótese de um ofensiva parecia afastada – a Al-Azhar, a grande mesquita e centro de estudos que é a principal autoridade islâmica do Egipto, convidara todas as partes para encontros destinados a encontrar uma saída consensual para a crise. Várias fontes da segurança diziam também que o uso da força – a opção favorecida pela ala dura dos militares – seria repudiada pela comunidade internacional e poderia levar ao colapso da abrangente coligação que apoiava o plano de transição apresentado pelos militares.

Igualmente polémica é a notícia de que o governo interino nomeou generais para os cargos de governador de 19 das 25 províncias do Egipto, substituindo os que tinham sido indigitados há poucos meses por Morsi. As novas autoridades dizem que o objectivo é reforçar a segurança no país, mas as nomeações são vistas como um sinal do regresso do autoritarismo ao maior país do mundo árabe, menos de três anos depois da revolução. Os seis civis nomeados para os restantes cargos são também antigos dirigentes, ou simpatizantes, do regime de Mubarak e vários dos generais indigitados são conhecidos pela sua hostilidade em relação aos islamistas. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

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