Podemos quer “assaltar o céu” ocupando a “centralidade do tabuleiro” político espanhol

Assembleia constitutiva discutiu organização, modelo de liderança e estratégia. Reunião foi marcada por algumas divergências tácticas mas todos consideram Iglesias o líder indiscutível.

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Pablo Iglesias, à direita, saúda Pablo Echenique, defensor de um modelo alternativo de liderança DANI POZO/ AFP

Pablo Iglesias, líder do Podemos, que irrompeu em Espanha nas eleições europeias, parafraseou Marx e disse que “o céu não se toma por consenso, mas por assalto”. A estratégia política que defendeu perante os participantes na assembleia constitutiva do partido, foi, porém, outra, comum no sistema eleitoral representativo: “ocupar a centralidade do tabuleiro” do xadrez político.

Foi logo na primeira das suas intervenções na assembleia do Podemos, realizada este fim-de-semana no Palácio da Vistalegre, de Madrid, que Iglesias invocou a passagem de uma carta de Marx ao amigo Ludwig Kugelmann, para descrever o fracasso da Comuna de Paris, em 1871. Antes da frase que arrancou aplausos, assumira claramente a ambição de ocupar o espaço de “uma maioria social que aposta na decência”.

Existe uma maioria “que quer que os ricos paguem impostos, que sabe que a única maneira de acabar com a corrupção é democratizar a economia, e que sabe que o problema da crise é que temos sido governados por ladrões”, disse, citado pelo diário El País.

Foram cerca de sete mil os simpatizantes que assistiram à reunião política de Madrid, onde foi discutida a forma de organização, modelo de liderança e estratégia para o ano eleitoral de 2015 do partido saído do movimento Indignados, que elegeu em Maio cinco deputados europeus e conseguiu os 9,7% de votos que o tornaram a quarta força partidária espanhola.

A assembleia, em que foram discutidas dezenas de documentos e propostas de resolução, não foi isenta de divergências, expressas desde logo nas propostas de modelo de liderança: à ideia clássica de um só líder, “para garantir unidade”, defendida por Pablo Iglesias, foi contraposta uma alternativa colegial de três “porta-vozes” por um grupo que integra o também deputado europeu Pablo Echenique.

“Gostaria de deixar de ter esta responsabilidade mas creio que três secretários-gerais não ganham eleições a [Mariano] Rajoy [chefe do actual Governo, conservador] nem a Pedro Sánchez [líder socialista], e um, sim”, argumentou Iglesias, considerado, mesmo por Echenique, o líder indiscutível. “Creio que a pessoa que melhor pode liderar o Podemos no futuro é a que melhor o liderou até agora, e essa pessoa é Pablo”, disse.

"Não sou um macho alfa"

Mas Iglesias teve durante a assembleia uma afirmação que não caiu bem a muitos participantes. Foi quando declarou que quem perdesse as votações em que participarão cerca de 130 mil simpatizantes se devia “afastar”, dizendo que era isso que faria se não tivesse apoio maioritário. “Não construímos o Podemos para nos afastarmos”, reagiu a também eurodeputada Teresa Rodríguez.

Já este domingo, Pablo  Iglesias sentiu necessidade de procurar esclarecer a sua posição, dizendo que não se considera um “imprescindível”. “Sou um militante, não um macho alfa e ponho-me às ordens da maioria.”

Outra proposta promovida pelo grupo de Iglesias que já era polémica antes da assembleia é a de vedar o acesso de militantes de outras forças políticas aos órgãos dirigentes do Podemos. A intenção foi, segundo o El País, muito contestada pelos militantes da Izquierda Anticapitalista, um dos grupos que estiveram na génese do novo partido, e de que faz parte, entre outros, Teresa Rodríguez.

Apesar das divergências tácticas, tanto Iglesias como Echenique garantiram que não há divisões e que no Podemos, palavras do líder, “não tem de haver acordos entre famílias como nos partidos da casta”.

As votações dos simpatizantes prolongam-se até ao próximo domingo, 26. Depois de serem aprovadas a organização interna e a estratégia começará o processo de candidaturas. Está previsto que a direcção do Podemos entre em funções no dia 15 de Novembro.

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