Paris recebe cimeira do clima em pleno estado policial

Mais de quatro mil pessoas subscreveram abaixo-assinado que insiste na realização da marcha pelo clima de domingo, apesar da proibição do Governo. A França terá 120 mil polícias e militares nas ruas durante a cimeira.

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Está planeada uma corrente humana de dois quilómetros em vez da grande marcha de domingo. Jean-Sebastien Evrard/AFP

Paris estava já em alerta securitário para a cimeira do clima das Nações Unidas antes dos mortíferos ataques do dia 13. Espera-se a chegada de mais de 150 chefes de Estado, entre os quais os presidentes dos Estados Unidos, China, Índia e Rússia. Para além deles, devem aterrar nos próximos dias na capital cerca de 40 mil diplomatas, especialistas e activistas ambientais. As operações de segurança são exigentes e há semanas que o Governo francês anunciou o fecho das fronteiras para assegurar que o maior evento diplomático na sua história recente não estaria em risco. Acabou por ter de o fazer antes, atingido antes de tempo no coração de Paris. Morreram 130 pessoas à mão de fundamentalistas islâmicos.

A França respondeu com medidas draconianas. A polícia arromba portas por todo o país sem mandados judiciais e decreta prisões domiciliárias sob ordens do Ministério do Interior. São os novos poderes administrativos do estado de emergência. A lei é suficientemente vaga para permitir excessos de zelo: estas operações são válidas desde que as autoridades acreditem que os alvos sejam uma ameaça à ordem pública. Os números crescem a passo rápido desde o dia 13. Segundo os últimos números do estado de emergência, citados pelo Libération, a polícia fez 1836 buscas, apreendeu 293 armas de fogo, deteve 232 pessoas e pôs 305 em prisão domiciliária.

O ambiente policial vai tornar-se mais drástico com a cimeira do clima. Sobretudo em Paris. Há já dezenas de milhares de polícias e militares a patrulharem as ruas do país, mas o Governo destacou mais 8000 agentes só para as duas semanas de encontros na capital: 2800 vão fazer a segurança do recinto, em Bourget, e outros 6300 vão acompanhar os chefes de Estado no resto da cidade. A França terá 120 mil agentes de polícia, gendarmes, militares e pessoal de controlo de fronteira ao longo da COP21.  

O Governo proibiu mais de 200 iniciativas civis agendadas para os dias da cimeira. A lista inclui a grande marcha pelo clima deste domingo, para a qual se esperavam dezenas de milhares de pessoas. Em vez dela, os organizadores convocaram um cordão humano de dois quilómetros para o percurso planeado. Acabará diante a sala de espectáculos Bataclan, onde morreram 90 pessoas nos atentados do dia 13. Uma das organizações quer que os participantes deixem os sapatos em seu lugar no ponto de partida da marcha, a Praça da República.

Mas domingo pode não ser um dia pacífico. A polícia pôs pelo menos seis activistas ambientais em prisão domiciliária esta semana. Usou os poderes do estado de emergência e revistou a casa de várias pessoas ligadas a protestos passados. Acusam-nos de estarem a preparar “acções reivindicativas violentas” para os dias da cimeira e dizem que a ameaça terrorista ao evento não os permite dispersar a atenção com manifestações desse género. As prisões têm a duração exacta da cimeira e terminam no mesmo dia: 12 de Dezembro. O jornal Le Monde escreve que a polícia tem mais ordens de prisão na calha, mas que ainda não conseguiu alcançar todos os seus alvos.

“Nós, organizações da sociedade civil estamos convencidas de que não conseguiremos atacar o aquecimento climático renunciando as nossas liberdades e direitos fundamentais”, escreveu neste sábado a Coligação Clima, que representa 130 organizações civis e sindicatos de protecção dos direitos humanos e do ambiente. Um membro do seu órgão jurídico está entre os detidos na sua residência.

Há pelo menos um grupo que promete furar a proibição da marcha de domingo. Vários intelectuais franceses publicaram esta semana um abaixo-assinado no Libération contra aquilo que entendem ser a deriva securitária da França e em que prometem marchar no evento proibido. Ao fim da tarde de sábado tinham mais de 4200 assinaturas. A polícia diz ter identificado mais de 50 suspeitos de estarem a planear uma manifestação ilegal para domingo. Caso se façam valer as penas previstas em estado de emergência, cada um pode ser condenado a seis meses de prisão e a uma multa de 7500 euros.  

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