Relatório confirma pesticidas em refeição que matou 23 crianças na Índia

Comida foi preparada com óleo armazenado em recipiente que antes continha um insecticida.

Imagem de um dos protestos contra a falta de fiscalização da qualidade dos alimentos
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Imagem de um dos protestos contra a falta de fiscalização da qualidade dos alimentos RAVEENDRAN/AFP
Uma das crianças intoxicadas a ser tratada no  Patna Medical College and Hospital, em Patna
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Uma das crianças intoxicadas a ser tratada no Patna Medical College and Hospital, em Patna AFP

Os resultados preliminares de um relatório confirmam que a refeição gratuita servida numa escola na Índia e que matou pelo menos 23 crianças estava contaminada com níveis muito elevados de pesticidas. A investigação concluiu que o óleo com que a refeição foi preparada tinha sido armazenado num recipiente que anteriormente continha pesticidas.

A cozinheira da escola – localizada no estado de Bihar, no Nordeste do país – terá alertado a directora, enquanto preparava a comida na passada terça-feira, para a aparência estranha do óleo, em termos de tonalidade e cheiro. Mas a responsável pelo estabelecimento de ensino ignorou o alerta, justificando que o óleo tinha vindo da loja do seu marido e que não havia qualquer dúvida sobre a sua qualidade.

Em declarações à polícia, a funcionária insistiu que fora forçada a cozinhar pela directora da escola, Meena Kumari, que poderá agora ser julgada por homicídio por negligência. Abhijit Sinha, um magistrado do distrito de Saran, disse à BBC que se a directora não se entregar na polícia, o mais provável é que os seus bens e propriedade sejam apreendidos.

Ravindra Kumar, um dos responsáveis policiais à frente do caso, citado pela Reuters, avançou que os primeiros resultados do relatório que está a ser feito indicam que o óleo continha uma quantidade inexplicável de um insecticida chamado monocrotofós, um composto organofosforado utilizado como pesticida da agricultura e que quando ingerido é altamente tóxico.

Crianças obrigadas a comer
O óleo estava de tal forma contaminado que as crianças estranharam o sabor da comida, mas foram obrigadas pelas empregadas a ingerirem o arroz, batatas e feijões de soja. Estes últimos é que teriam sido preparados com o produto adulterado. 

Poucos minutos depois, os alunos começaram a ter dores de estômago, a vomitar e a ter convulsões, mas a directora da escola ainda demorou cerca de duas horas a actuar e a reconhecer a ligação entre a refeição e a intoxicação. 

As crianças que morreram tinham entre quatro e 12 anos. O número oficial de mortos é 23, mas o jornal Times of India refere já 27 crianças. Algumas dezenas ficaram doentes mas recuperaram. Três continuam internadas por precaução. 

A comida letal foi servida às crianças no âmbito do programa nacional Refeição a Meio do Dia. O estado de Bihar é o mais pobre do país e um dos mais populosos. A inflação dificultou o acesso aos produtos mais básicos e as condições sanitárias são más.

Protestos e funerais
Além de inúmeros protestos, nomeadamente com os pais a enterrarem os filhos vítimas da intoxicação nos terrenos da escola para que a negligência não seja esquecida, milhares de alunos indianos estão agora a recusar as refeições gratuitas disponibilizadas nas escolas para os mais desfavorecidos, com medo que o incidente de terça-feira se repita. As autoridades têm garantido que a situação foi excepcional.

O ministro da educação de Bihar, PK Shahi, anunciou que o governo estadual vai pagar cerca de três mil euros de indemnização às famílias das crianças mortas. O ministro confirmou ainda que grande parte dos alimentos que o governo local compra para as refeições escolares não são inspeccionados antes de serem servidos às crianças. "Com a escala desta operação, que serve 20 milhões de crianças todos os dias, em zonas remotas, inspeccionar os alimentos é um grande desafio", justificou o governante, citado pela AFP.

Segundo a agência de notícia indiana IANS, a corrupção no sector da distribuição de alimentos gratuitos nas escolas é generalizada e os controlos de qualidade muitas vezes ignorados. Em várias ocasiões, alunos de Bihar denunciaram que encontraram nos seus pratos insectos, rãs, lagartos e ratos. No ano passado, em Pune, no oeste do país, mais de 130 alunos estiveram hospitalizados na sequência de uma intoxicação alimentar, naquele caso devido à presença da bactéria E. coli.

O programa alimentar foi iniciado para combater a fome e a malnutrição infantil, e também o abandono escolar. Actualmente, 120 milhões de crianças têm uma refeição gratuita em 1,2 milhões de escolas.

O programa foi considerado um sucesso, num país onde metade das crianças é malnutrida. Além de alimentar os estudantes, ajudou a acabar com alguns estigmas, já que crianças de diversos meios sociais partilhavam esta refeição em conjunto, dizem os analistas económicos.

 

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