Oito pessoas morrem por dia em fuga de países pobres e em guerra

Relatório da Organização Internacional para as Migrações denuncia falta de informação. "Os migrantes sem documentos não são criminosos, mas sim seres humanos necessitados de protecção e de assistência, com direito a assistência jurídica, e merecedores de respeito."

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Naufrágio em Lampedusa, há um ano, fez mais de 360 mortos ALBERTO PIZZOLI/AFP

Pelo menos oito pessoas morrem todos os dias ao tentarem encontrar refúgio e melhores condições de vida em países mais ricos, a maioria na travessia do Mediterrâneo entre o Norte de África e a Europa. Os números estão num relatório da Organização Internacional para as Migrações (OIM), que sugere uma realidade ainda mais dramática: por cada morte reportada, pelo menos outras duas podem estar a passar despercebidas às autoridades.

O documento da OIM começou a ser trabalhado após a morte de quase 400 pessoas ao largo da ilha italiana de Lampedusa, no dia 3 de Outubro de 2013, e foi apresentado nesta segunda-feira, a quatro dias do primeiro aniversário do naufrágio.

Chama-se "Fatal Journeys: Tracking Lives Lost During Migration" (viagens fatais: detectar as vidas perdidas durante as migrações) e inclui a informação que foi possível recolher sobre as mortes de migrantes nos últimos 14 anos, um pouco por todo o mundo – no Mediterrâneo, mas também na fronteira entre o México e os Estados Unidos, por exemplo.

O número de homens, mulheres e crianças que morreram a fugir de países em guerra ou com graves problemas socioeconómicos é substancialmente superior nas viagens para a Europa. Desde o ano 2000, pelo menos 40.000 pessoas morreram nessas circunstâncias em todo o mundo, 22.000 das quais ao tentarem chegar ao continente europeu. Só neste ano morreram 4077 pessoas, de acordo com os números da OIM – 3072 na travessia do Mediterrâneo.

O director-geral da OIM, William Lacy Swing, chama a atenção para a realidade que pode estar escondida por trás dos números a que a sua organização teve acesso, e apela a uma melhor resposta por parte dos governos, da sociedade civil, das organizações internacionais e do mundo empresarial.

"Numa altura em que uma em cada sete pessoas em todo o mundo é migrante, é paradoxal que o mundo desenvolvido responda de forma dura às migrações. As oportunidades limitadas para uma migração segura leva os candidatos a migrantes a caírem nas mãos de contrabandistas, alimentando um comércio sem escrúpulos que ameaça a vida de pessoas desesperadas. Temos de pôr um fim a este ciclo. Os migrantes sem documentos não são criminosos, mas sim seres humanos necessitados de protecção e de assistência, com direito a assistência jurídica, e merecedores de respeito", escreve William Lacy Swing no relatório.

O responsável lembra os naufrágios mais mortíferos em Lampedusa e em Malta, no último ano, para dizer que "chegou a hora" de enfrentar o problema.

"Há um ano, o mundo assistiu com horror quando cerca de 360 migrantes perderam a vida ao tentarem nadar até às costas da ilha italiana de Lampedusa. Infelizmente, o horror parece não ter fim: quase 500 migrantes morreram ao largo de Malta poucas semanas antes da publicação deste relatório. Dois sobreviventes contaram que os contrabandistas afundaram deliberadamente a sua embarcação quando alguns migrantes se recusaram a passar para uma embarcação menos segura, depois de terem sido forçados a trocar de barco várias vezes desde o início da sua viagem, no Egipto. Duas semanas depois, apenas foram identificados 11 sobreviventes; testemunhas dizem que seguiam a bordo pelo menos 100 crianças", recorda William Lacy Swing.

Citado pelo jornal britânico The Guardian, o autor do relatório, Frank Laczko, salienta os poucos recursos destinados à recolha de informação sobre vítimas mortais, e afirma que "não há nenhuma organização mundial actualmente responsável pela monitorização sistemática do número de mortes".

"Apesar de serem gastas avultadas somas na recolha de informação sobre migrações e controlo de fronteiras, muito poucas agências recolhem e publicam informação sobre mortes de migrantes", lamenta o responsável pelo departamento de investigação da OIM.

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