O adultério deixou de ser crime na Coreia do Sul

Lei de 1953, que previa penas de prisão para quem arriscasse uma relação fora do casamento, já pouco era aplicada

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O tribunal considerou que a lei já não fazia sentido numa sociedade moderna como a sul-coreana Ed Jones/AFP

O tribunal constitucional da Coreia do Sul aboliu nesta quinta-feira uma lei controversa sobre adultério que considerava as relações extraconjugais um delito passível de prisão.

Por sete votos contra dois, os juízes decidiram-se pela inconstitucionalidade desta lei, em vigor desde 1953 e desenhada para proteger os valores da família.

“Mesmo que o adultério deva ser condenado como imoral, o poder público não deve intervir na vida privada dos indivíduos”, explicou o presidente do tribunal Park Han-Chul.

Esta foi a quinta fez que esta instância judicial superior foi chamada a pronunciar-se sobre a legalidade deste texto que fazia da Coreia do Sul um dos raros países não muçulmanos do planeta a considerar a infidelidade como um acto criminoso.

Ao longo dos últimos seis anos, mais de 5500 pessoas foram acusadas pelo crime de adultério. Mas o número de acusações tem vindo sempre a descer e as penas de prisão eram cada vez mais raras.

Em 2004, 216 pessoas foram presas por adultério, em 2008 foram 42 e depois desse ano, apenas 22 pessoas acabaram a cumprir pena por terem mantido relações extraconjugais.

Estes números reflectem as mudanças na sociedade sul-coreana, onde a modernização ultra-rápida choca em vários aspectos com as tradições conservadoras. “A percepção dos direitos individuais em matéria de vida sexual mudou”, decretou o juiz  Park.

Para Ahn Chan-Ho, um dos juizes que votou contra a abolição da lei, o texto de 1953 é um elemento chave da protecção dos valores familiares. Ao abolir esta lei, o Supremo Tribunal estaria a “abrir as portas a um festival do deboche”, argumentou

Segundo a lei agora morta, o delito de adultério só podia ser examinado se fosse apresentada uma queixa. O processo de instrução era abandonado se, entretanto, a queixa fosse retirada, o que acontecia frequentemente, muitas vezes depois de um acordo financeiro entre as partes.

Originalmente, a lei destinava-se a proteger os direitos das mulheres numa altura em que o casamento não lhes garantia nenhuma protecção. O divórcio, extremamente mal visto na sociedade, era a última das alternativas para as mulheres que, na sua esmagadora maioria, não possuíam rendimentos.

Agora, até as associações conservadoras reconheceram que os tempos mudaram. “O adultério deve ser moral e socialmente censurado, mas uma lei como esta é inapropriada numa sociedade moderna como a nossa”, comentou Ko Seon-Ju, membro de uma associação familiar

“Foi uma ferramenta eficaz para proteger os direitos das mulheres mas entretanto a legislação sobre a igualdade de género melhorou”, acrescentou. “O adultério deve ser um problema resolvido pelo diálogo entre os cônjuges, não pela lei.”

À espera da decisão do Tribunal Constitucional estava a Unidus Corp, um dos maiores fabricantes mundiais de preservativos. Recebida a boa notícia, as suas acções subiram 15% na Bolsa de Seul.

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