No lado errado da História

Os noticiários na televisão enchem-se de imagens da Europa que há menos de um ano só acreditávamos serem possíveis no Sudão, no Chade, no Afeganistão ou noutro terceiro mundo qualquer. Mas agora os refugiados são brancos e estão mesmo aqui à porta.

É um disparate olhar para os desafios que a Europa agora enfrenta com os mesmos olhos do passado. O que aconteceu antes serve apenas para perceber como o homem se comporta em situações de stress e não para copiar e repetir as mesmas receitas.

Tudo o que as nações fizerem “como antigamente” redundará em desastre. O caso dos refugiados é exemplo disto mesmo. Quantos mais muros se erguerem maior será o problema. Quanto mais fronteiras se fecharem, maior será o desejo (e a necessidade) de entrar ilegalmente no que muitos ainda consideram (e para eles é mesmo) o Eldorado europeu.

Mas vamos a factos. A Constituição Europeia, ou melhor, a falta dela, é a má razão pela qual a Europa se vê invadida pelos mais pobres. A união dos interesses transnacionais sobrepôs-se sempre, por cupidez e má consciência, à necessidade de prever o futuro mais próximo.

Os líderes europeus pensaram apenas em dinheiro, em lucro e em ganhar as suas próprias eleições nacionais, fazendo de conta que o “statu quo” da integração apenas tornava a Europa (o mercado europeu) maior (e mais rico). Ninguém teve a “inteligência” simples de perceber que a integração expansionista deixava a Europa na fronteira dos conflitos.

Se tivesse havido um “think tank”, uma comissão, um comissário ou mesmo um ministro europeu do território teria sido talvez mais fácil intuir, no sentido de antecipar, que a narrativa americana antiditaduras do Magreb, anti al-Assad na Síria, anti Mubarak no Egipto e por aí fora... iam fragilizar o velho continente na mesma medida que serviam de rastilho à proliferação de conflitos regionais e, por conseguinte, o poder global dos Estados Unidos da América. Essa falta de inteligência fez com que a guerra ficasse nas fronteiras da Europa deixando-a como o primeiro destino da invasão.

Ainda antes do verão já milhares de náufragos enchiam o Mediterrâneo de cadáveres e as manchetes dos jornais ainda eram feitas sobre o impossível “default” na Grécia.

Ignorando, ou não, o aviso fantasioso que o ministro da Defesa grego, Panos Kammeno, deixou em março último – abrir a porta a todos os migrantes — a Europa assiste agora ao vivo a uma nova série de terror, desta vez com produção própria.

Os noticiários enchem-se de imagens que há menos de um ano só acreditávamos serem possíveis no Sudão, no Chade, no Afeganistão ou noutro terceiro mundo qualquer.

O desafio europeu nunca foi tão grande. Esta Europa, feita de pequenos estados que historicamente sempre foram rivais, ou se une ou se desintegra.

Agora, a Hungria constrói muros para impedir os que sofrem de partilharem o conforto do euro, como antes Estaline fez em Berlim e muito antes o imperador Adriano na “Britannia”.

Toda a gente sabe o que acontece aos impérios que se barricam do lado errado da história.

 

José Manuel Diogo

Especialista em informação e comunicação

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