Negociações entre Grécia e troika sem sinais claros de convergência

Com a perspectiva de novo pagamento ao FMI agendado para 5 de Junho, agora de 300 milhões de euros, um acordo definitivo ainda não está à vista. As principais divergências estão nas reformas do IVA e do sistema de pensões.

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Yanis Varoufakis está a debater com a troika as condições para a entrega do empréstimo ALKIS KONSTANTINIDIS

As negociações entre a Grécia e os seus parceiros da zona euro continuaram esta terça-feira a não dar sinais claros de avanços em direcção a um acordo, com as hipóteses de chegada a um entendimento já na reunião do Eurogrupo por teleconferência agendada para quinta-feira a serem vistas neste momento como muito reduzidas.

O sentimento de urgência em relação a um acordo vai, no entanto, aumentando, à medida que se aproxima o dia 5 de Junho, dia em que a Grécia tem de efectuar o pagamento de 300 milhões de euros ao FMI.

Em declarações à agência Reuters, um responsável político europeu, que preferiu não ser identificado, queixou-se de que as “linhas vermelhas” traçadas pela Grécia nas negociações são “muito rígidas”, não se tendo chegado a um acordo em relação a questões fundamentais como a dimensão do excedente orçamental primário que deve ser exigido ao país e as medidas ao nível do IVA e da Segurança Social que é preciso tomar para o concretizar.

Este responsável admite que os governos da zona euro podem vir a aceitar uma descida da meta para o excedente orçamental privado para um valor entre 1% e 1,5% do PIB. Todavia, para que tal aconteça, exige-se que a Grécia tome medidas mais agressivas de consolidação. A este nível, as instituições que compõem a troika ainda não estão satisfeitas com aquilo que Atenas está disposta a fazer ao nível do IVA e da reforma da Segurança Social. E, por isso, não se espera que um acordo seja obtido até quinta-feira.

Do lado grego, as informações fornecidas por responsáveis políticos do Governo Syriza dão conta da continuação da realização de reuniões com a troika, algumas pessoalmente, outras por videoconferência, para tentar que um acordo seja depois assinado no Eurogrupo a tempo de evitar uma falha de pagamento por parte da Grécia a algum dos seus credores.

O minstro das Finanças, Yanis Varoufakis, entretanto, confirmou que o executivo estava a ponderar a possibilidade de introduzir uma taxa sobre os levantamentos de dinheiro feitos nas caixas automáticas. Esta medida teria como objectivo a criação de incentivos para a utilização dos cartões nos pagamentos efectuados, aumentando assim a percentagem de transacções comerciais que ficam registadas.

No entanto, algumas horas depois, o ministério emitiu um comunicado a anunciar que a proposta tinha sido retirada das negociações.

O ministro recusou em absoluto que o Governo esteja a pensar em qualquer tipo de imposto ou taxa sobre os depósitos bancários, algo que, caso fosse anunciado, agravaria ainda mais a tendência de fuga dos depósitos que se tem sentido no sector bancário grego desde o final do ano passado.

Na segunda-feira, as expectativas em relação a um acordo tinham melhorado depois de o primeiro-ministro, Alexis Tsipras, ter conseguido obter dentro do Syriza um apoio maioritário à sua estratégia negocial com a troika. Isso acabou por ser lido como uma espécie de carta branca para que o executivo grego chegue o mais cedo possível a um acordo com os parceiros europeus, mesmo que tal envolva algumas cedências do Syriza em relação às promessas feitas durante as últimas eleições. Na prática, contudo, a convergência entre Atenas e a troika continua a ser reduzida.

E se não pagarem ao FMI?

A ausência de avanços mais claros nas negociações faz aumentar os receios de que a Grécia possa vir a falhar os pagamentos que tem de fazer aos seus credores. O momento que é agora considerado decisivo é a próxima prestação do empréstimo ao FMI que tem de ser paga a 5 de Junho. São 300 milhões de euros, que os responsáveis do Governo grego dizem que apenas terão disponíveis se entretanto for libertada a tranche que falta no empréstimo da zona euro.

Em Junho estão ainda agendadas mais três prestações a pagar ao FMI num valor total de quase 1300 milhões de euros.

Uma vez que começa a escassear o tempo para que a Grécia fique em condições para pagar os 300 milhões a 5 de Junho (é preciso um acordo do Eurogrupo e ainda a ratificação dos parlamentos de alguns países), começa a colocar-se a possibilidade de se ter de recorrer a um procedimento administrativo previsto nas regras do FMI e que permite a um país pedir para que vários pagamentos a realizar num determinado mês sejam todos pagos em conjunto. Neste caso, a Grécia poderia pagar os 1600 milhões ao FMI mais tarde no mês de Junho, o que lhe poderia dar mais tempo para chegar a um acordo com os outros países do euro.

Se não for encontrada uma solução e a Grécia falhar mesmo o pagamento ao FMI, as consequências imediatas são ainda difíceis de prever. Por um lado, as agências de rating não consideram nas suas regras que falhar o pagamento a uma instituição pública como o FMI possa ser classificado como default. E o próprio FMI demoraria pelo menos duas semanas a anunciar oficialmente o não pagamento, o momento a partir do qual a Grécia poderia ver-se a braços com os pedidos de pagamento antecipado das dívidas por parte de outros credores oficiais.

Mais graves e imediatas poderiam ser as consequências para os bancos gregos de um default do Estado face ao FMI. Perante a notícia da falha num pagamento, os bancos sofreriam um duro golpe nas suas contas. Primeiro, seria provável que mais depositantes decidissem tirar o seu dinheiro dos bancos, agravando ainda mais as necessidades de financiamento das instituições. Depois, os títulos de dívida pública que os bancos têm nos seus balanços passariam a valer ainda menos.

Perante este cenário, o BCE (que neste momento garante a liquidez dos bancos através da concessão de empréstimos de emergência) poderia decidir reavaliar se os bancos gregos podem ser de facto considerados solventes. Se achar que não são, tem, de acordo com as suas próprias regras, de lhes fechar o acesso ao financiamento de emergência, o que significaria a falência imediata das instituições, a necessidade de o Governo grego impor controlos de capital e a criação de todas as condições para que a Grécia saia do euro.

Muitos duvidam, contudo, que, perante a gravidade das consequências, o BCE arrisque tomar esse tipo de decisão sem um apoio político claro dos governos da zona euro.

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