Merkel e Hollande dão tudo por tudo para evitar agravamento da guerra

Líder alemã e Presidente francês viajaram para Kiev e depois para Moscovo. Uma decisão norte-americana sobre eventual fornecimento de armas à Ucrânia será tomada “em breve” por Obama

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A chanceler alemã, Angela Merkel, e o Presidente francês, François Hollande, que esta quinta-feira viajaram para Kiev e esta sexta se deslocam a Moscovo – para apresentarem uma nova proposta de paz na Ucrânia – estão a jogar aquela que pode ser uma das últimas cartadas diplomáticas para evitar um agravamento da guerra.

Aquela que será a mais ambiciosa acção diplomática para tentar pôr fim ao conflito coincide com um agravamento da situação no terreno e com o aumento da pressão de senadores norte-americanos para o fornecimento de armas ao Exército ucraniano, que tem sido obrigado a recuar no Leste.

“O tempo urge e ninguém poderá dizer que a França e a Alemanha em conjunto não tentaram tudo”, afirmou François Hollande, quando, esta quinta-feira de manhã, anunciou, de surpresa, a iniciativa. “Passámos em alguns meses de um diferendo a um conflito e à guerra”, de tal maneira que “estamos numa guerra e numa guerra que pode ser total.”

Hollande, que à tarde viajou para Kiev, com Angela Merkel, lamentou que os “apelos e conversas” não tenham produzido efeito e sublinhou que a abordagem diplomática “não pode ser prolongada indefinidamente”.

Mais ou menos à mesma hora, em Bruxelas, os embaixadores da União Europeia chegavam a acordo para juntar mais nove entidades e 19 pessoas, incluindo cinco russos, à lista dos alvos de sanções associadas ao conflito na Ucrânia. Uma decisão final sobre o endurecimento destas medidas deve ser tomada na próxima semana. O Presidente francês lembrou que as sanções “tiveram o seu efeito, mas não conseguiram cessar as hostilidades”.

Na capital ucraniana os dois líderes reuniram-se com o Presidente, Petro Poroshenko, para apresentarem a sua proposta de resolução do conflito “baseada na integridade territorial da Ucrânia”, disse o chefe de Estado francês, antes de partir. Esta sexta-feira, farão o mesmo em Moscovo, com o Presidente russo, Vladimir Putin.

“Não vamos para falar mas para procurar um texto que possa ser aceitável por todas as partes”, disse o Presidente francês.

Numa primeira reacção à iniciativa franco-alemã, o primeiro-ministro ucraniano, Arseni Iatseniuk, disse que Kiev não aceitará qualquer plano que ponha em causa a sua integridade territorial, soberania ou independência. O politólogo ucraniano Taras Berezovets pensa que “Merkel e Hollande prepararam alguma coisa para satisfazer Putin.” “O essencial é que o preço não se revele demasiado caro para a Ucrânia”, afirmou, segundo a AFP.

Moscovo fez saber que o Presidente russo espera que Merkel e Hollande tenham tido em conta medidas anteriormente por si propostas – disse Iuri Ushakov, conselheiro de política externa de Putin, citado pela Reuters. “Estamos prontos para falar de forma construtiva e a contar conseguir acordos que contribuam para a estabilização da situação”, disse.

A iniciativa de Merkel e Hollande para acabar com uma guerra que já fez mais de 5300 mortos em dez meses – pelo menos 24 mortos, entre os quais 19 civis, nas últimas 24 horas – coincidiu com a presença em Kiev do secretário de Estado norte-americano, John Kerry, que voltou a ouvir o pedido ucraniano para o envio de armas.

Kerry manifestou apoio à iniciativa franco-alemã, tal como a União Europeia e a NATO. “A União Europeia apoia todas as iniciativas destinadas a contribuir para uma solução política”, disse a responsável pela Política Externa, Federica Mogherini.

O secretário de Estado norte-americano considera a “agressão russa” uma ameaça à Ucrânia e disse que Moscovo deve “fazer escolhas”. “Não estamos à procura de um confronto com a Rússia. Ninguém está. Nem Poroshenko, nem os Estados Unidos, nem a União Europeia” mas “não podemos fechar os olhos quando combatentes russos com uniformes sem distintivo atravessam a fronteira”, disse. A Rússia tem sistematicamente negado ter soldados no país vizinho, admitindo apenas a presença de alguns voluntários russos.

Kerry apelou a um compromisso imediato de Moscovo com um “cessar-fogo real, que não seja apenas um pedaço de papel com palavras”. Para o chefe da política externa dos Estados Unidos, uma solução pacífica passa pela “retirada de armas pesadas da linha de cessar-fogo”, seguida da “retirada de tropas estrangeiras e de armas pesadas da Ucrânia”.

Senadores pressionam para envio de armas

Quanto ao pedido de armas, nada adiantou. Afirmou apenas que uma decisão será tomada “em breve” pelo Presidente. Em Washington, o senador John McCain disse, em nome de um grupo de uma dezena de senadores republicanos e democratas, que se Barack Obama não tomar uma decisão nesse sentido, o Senado aprovará legislação que o permita.  

Os Estados Unidos repetiram durante muito tempo que não havia alternativas a uma solução pacífica, mas nos últimos dias a hipótese de envio de armas foi admitida não oficialmente, e sob anonimato, por responsáveis militares e da administração. Até agora foi apenas fornecido à Ucrânia equipamento “não letal”: coletes à prova de bala, equipamento médico ou radares.

Um eventual envio de armas norte-americanas seria encarado por Moscovo como uma ameaça à segurança da Rússia e provocaria um “dano colossal” às relações com os Estados Unidos, avisou Alexander Lukashevich, porta-voz do ministério dos Negócios Estrangeiros.

O fornecimento de armas é um cenário que também não agrada a diversos governos europeus. “A França não entra no debate sobre o fornecimento de armas à Ucrânia”, disse Hollande. Ministros da Defesa de vários governos que participaram esta quinta-feira numa reunião da NATO, em Bruxelas, manifestaram, de acordo com a Reuters, preocupação de que uma iniciativa desse tipo leve a um agravamento do conflito.

“Mais armas na zona não nos aproximam de uma solução e não acabarão com o sofrimento da população”, disse a ministra alemã da Defesa, Ursula von der Leyen. O seu colega dos Negócios Estrangeiros, Frank-Walter Steinmeier, afirmou que enviar armas seria “atirar mais lenha para a fogueira”. Philip Breedlove, comandante da NATO na Europa, considera, segundo a BBC, que essa solução poderia levar a uma “reacção mais estridente da Rússia”.

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