Marrocos altera lei para proibir que violador case com a vítima

Mudança na lei foi posta em marcha pelo suicídio de uma adolescente de 16 anos, forçada a casar com homem de 23 anos que a violara aos 15. Activistas pedem reforma mais profunda do Código Penal.

Foto
Uma lei para prevenir e combater a violência contra as mulheres está parada há oito anos no Parlamento marroquino Abdelhak Senna/AFP

Quase um ano depois do suicídio de uma adolescente que tinha sido forçado a casar com o homem que a violou, o Governo marroquino anunciou que vai alterar o Código Penal para proibir uma prática tradicional que continua a ser aceite pelos tribunais.

A decisão foi saudada por activistas dos direitos humanos, que lamentam, porém, que a reforma se limite ao artigo 475 da lei penal que, numa das suas alíneas, prevê que quem for condenado por “corromper ou sequestrar uma menor” pode ser libertado se casar com a vítima. Foi esta dupla punição que a família e um juiz impuseram a Amina al-Filali, que, aos 16 anos e após sete meses de casamento, engoliu veneno para ratos por não suportar mais os abusos do homem de 23 anos que a violara.

O caso, noticiado em Março, chocou a opinião pública num país que continua a ser muito conservador, levando vários partidos, organizações civis e activistas a exigir uma revisão da lei. O Governo, dominado por islamistas moderados, afastou inicialmente a ideia – o ministro da Justiça chegou a afirmar em público que a relação entre Amina e o agressor tinha sido consensual – mas acabou por ceder à pressão.

“Alterar este artigo é positivo, mas não responde a todas as nossas exigências”, disse ao jornal britânico The Guardian Khadija Ryadi, presidente da Associação de Direitos Humanos de Marrocos. Para a activista, é urgente reformar todo o Código Penal, que “contém inúmeras provisões que discriminam as mulheres e não as protegem da violência”. Ao mesmo jornal, a presidente da Liga Democrática dos Direitos das Mulheres, Fouzia Assouli, lembrou que a lei “não reconhece certas formas de violência contra as mulheres, como a violação conjugal”, que representará 50 por cento de todos os casos reportados no país, “enquanto continua a criminalizar comportamentos normais como o sexo fora do casamento entre adultos”.

A prática de forçar as vítimas de violação a casar é ainda comum em vários países, do Afeganistão à Índia, onde a perda de virgindade das jovens é vista como uma mancha na honra da família, seja de que forma tenha acontecido, e defendem o casamento como remédio para o “mal”. Em Marrocos, a lei impõe também os 18 anos como idade mínima para o casamento, mas nas zonas rurais a disposição é frequentemente ignorada.

Em 2004, por iniciativa do Rei Mohamed VI, o país reformou a Lei da Família (Mudawana), mas uma lei específica para prevenir e punir a violência contra as mulheres está desde então parada no Parlamento, recorda o Guardian. A actual ministra para o Desenvolvimento Social, Bassima Hakkaoui, anunciou há meses que vai tentar que o diploma tenha em breve luz verde.
 
 
 
 

Sugerir correcção
Comentar