Maquinista diz que fez curva a 190 quilómetros por hora quando limite era de 80

Troço não tinha sistema de controlo de velocidade.

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Câmaras de vigilância captam momento do acidente na Galiza

Até ao momento a Renfe não adianta as causas que terão estado na origem do acidente de um comboio perto de Santiago de Compostela, que fez pelo menos 78 mortos. Mas após o descarrilamento, numa comunicação por rádio, um dos maquinistas disse que entrou a uma velocidade de 190 quilómetros por hora numa curva onde o limite é de 80 quilómetros.

Segundo o El País, na primeira comunicação por rádio após o acidente e ainda dentro da cabine, antes de saber se havia vítimas, um dos maquinistas repetia “somos humanos, somos humanos”, acrescentando que lhe doíam as costas. “Espero que não haja mortos porque isso cairia na minha consciência”, acrescentou, descrevendo que entraram na curva onde só se podia circular a 80 quilómetros por hora a uma velocidade superior a 190 quilómetros por hora.

Entretanto, o maquinista que seguia no momento do acidente aos comandos do Alvia, Francisco José Garzón Amo, foi chamado para ser interrogado na condição de arguido. Porém, o secretário-geral do sindicato de maquinistas (Semaf) de Espanha, Juan Jesús García Fraile, defende que o acidente se deve a “um conjunto de circunstâncias” e que é preciso esperar para tirar conclusões. O responsável salientou que o maquinista estava há três anos a trabalhar na Corunha nos serviços de longa distância e que está na profissão desde antes de 2000. Por seu lado, o presidente da Renfe, salientou que o maquinista de 52 anos operava naquela linha há mais de um ano.

Eram 20h41 quando o comboio que fazia a ligação de Madrid à cidade costeira de Ferrol, na Corunha, estava a chegar a Santiago de Compostela. Na composição viajavam 222 pessoas. O acidente ocorreu em Angrois, freguesia que fica a quatro quilómetros da estação de Santiago. Até ao momento estão confirmadas 78 vítimas mortais e mais de 140 feridos. As causas do acidente estão por apurar, mas algumas informações iniciais indicam que o comboio circularia a quase 200 quilómetros.

Porém, segundo a conversa apurada pelo mesmo jornal e que está a ser avançada por vários meios de comunicação do país, o maquinista não terá adiantado se o excesso de velocidade teria sido um erro humano ou se tinha existido qualquer tipo de falha técnica que tivesse impedido a composição de reduzir velocidade antes da curva, visto que há muito pouco tempo para desacelerar dos normais 200 quilómetros por hora para os recomendados 80.

O troço de via férrea onde se deu o acidente não estava dotado de um sistema de segurança que obriga o comboio a parar quando o maquinista não obedece à velocidade à qual nele se pode circular. Esse sistema – que consiste numa transmissão de dados permanente entre a via e a cabine do comboio – termina umas dezenas de metros antes do local do acidente.

Até aquele ponto, a via por onde seguia o comboio era uma linha de alta velocidade, dotada com os mais modernos sistemas de segurança e onde, se o maquinista excedesse a velocidade prevista e não reagisse em segundos a um sinal de aviso, a composição pararia imediatamente. Mas precisamente à entrada de Santiago de Compostela a linha de alta velocidade (AVE) desemboca num corredor ferroviário por onde passa também a linha convencional. Isto acontece porque se quis evitar a expropriação de terrenos caros e aproveitar a linha já existente, uma vez que, na malha urbana, tão pouco valia a pena ter uma infra-estrutura para velocidades elevadas dado que a estação se encontra a centenas de metros mais à frente.

Ora, por ser um troço mais antigo, este está dotado de um sistema ASFA (Aviso de Señales y Frenos Automáticos), que é uma tecnologia menos moderna, na qual há uma décalage entre o momento da detecção de que o comboio vai com velocidade excessiva e a actuação do sistema para o fazer parar. Se, como consta das gravações entre o maquinista e a estação, a composição seguia a alta velocidade onde não poderia ir a mais de 80, então o ASFA não tinha tempo suficiente para actuar.

Em Portugal, o sistema Convel (Controlo de Velocidade) usado em mais de metade das linhas portuguesas teria evitado este acidente.

Curva perigosa
Porém, o El País lembra que a curva é conhecida para quem faz habitualmente a viagem entre Madrid e Ferrol, já que aquando da inauguração do novo traçado (a 10 de Dezembro de 2011), precisamente naquela curva, o comboio balançou. Até chegar a este local desde Ourense são cerca de 80 quilómetros praticamente rectos. Esta é também uma das poucas zonas em que o AVE circula num troço que não é totalmente independente – uma opção que foi feita para evitar mais expropriações quando se acrescentou a linha de alva velocidade.
A Renfe confirmou que o comboio circulava com um atraso de cinco minutos, mas não comentou a possibilidade de seguir em excesso de velocidade para compensar o tempo perdido. Algumas fontes da Renfe, citadas pelo La Voz de Galicia, adiantaram que as caixas negras do comboio podem ajudar a explicar as causas do acidente do comboio com oito vagões, além da cabeça e cauda – onde seguem os maquinistas.

Além disso, o presidente da Renfe, Julio Gómez-Pomar Rodríguez, à agência espanhola Efe, adiantou que a linha onde aconteceu o acidente tinha precisamente sido alvo de uma revisão na manhã de quarta-feira. Por seu lado, a rádio Cope diz que a “caixa negra” já está nas mãos das autoridades judiciais que vão conduzir a investigação do acidente.

Entretanto, o Presidente da Xunta da Galiza, Alberto Núñez Feijoó, decidiu declarar sete dias de luto para esta comunidade autónoma. É o pior acidente ferroviário dos últimos 40 anos em Espanha.
 
 

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