Theresa May torna-se primeira-ministra quarta-feira

Pela segunda vez o país terá uma mulher na chefia do Governo. Ministra do Interior confirma liderança do Partido Conservador e entrada em Downing Street. Cameron apresenta a demissão à rainha Isabel na quarta-feira.

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Theresa May deverá tornar-se primeira-ministra Peter Nicholls/Reuters

Confirmada como a nova líder do Partido Conservador, Theresa May, há seis anos anos à frente do Ministério do Interior, não vai ter de esperar muito para começar a governar o Reino Unido. A equipa de assessores de Downing Street fez saber que já está tudo preparado para uma transferência de poder rápida e indolor – e o primeiro-ministro demissionário, David Cameron, disse estar “encantado” com o desfecho deste processo e com a “promoção” de May.

“Ela é forte, competente e mais do que capaz de garantir a liderança de que o país vai precisar nos próximos anos. E ela vai ter o meu total apoio”, declarou David Cameron, na sua última declaração à porta do número 10 de Downing Street. A meio da tarde, depois de ver oficialmente declarada a vitória de Theresa May na corrida à liderança dos tories, o primeiro-ministro demissionário disse que não fazia sentido prolongar o período de transição. “Assim sendo, amanhã dirigirei o meu último conselho de ministros. Na quarta-feira, participarei na sessão de perguntas ao primeiro-ministro na Câmara dos Comuns, e no final irei ao Palácio de Buckingham entregar a minha demissão” à rainha Isabel II, antecipou David Cameron – apanhado pelo microfone a trautear uma musiquinha depois de voltar as costas aos jornalistas e fechar a porta da residência oficial.

Horas depois, May agradecia-lhe as palavras e o voto de confiança, confessando-se “profundamente comovida”, numa breve declaração em tom calmo e solene proferida à porta do Parlamento. A ainda ministra ofereceu apenas um vislumbre do que será a sua liderança: “Vamos dar às pessoas um maior controlo sobre as suas vidas”, prometeu, antecipando para os próximos dias a apresentação de uma “nova visão, forte e positiva” para o país.

Sobre o assunto do momento – e que mais preocupa os britânicos, os europeus e os mercados – repetiu aquele que se tornou o slogan da sua candidatura. “’Brexit’ quer dizer ‘Brexit’, e nós vamos torna-lo um sucesso”, garantiu Theresa May, que apesar da desconfiança com que encara Bruxelas, se manteve ao lado de Cameron e da permanência durante a campanha do referendo sobre a União Europeia.

Como escreve o jornal The Guardian, a ascensão de Theresa May “agrada” a Bruxelas, na medida em que a ministra tem experiência nas negociações comunitárias e é bem conhecida pelos seus parceiros. Mas a sua escolha não abrandará a pressão para que o Reino Unido inicie os procedimentos necessários para o desligamento do bloco europeu o mais depressa possível (de preferência, logo depois do Verão).

“A economia não precisa de mais incerteza. Por isso Theresa May deve assumir o cargo de primeira-ministra e começar a dirigir o país, a determinar o rumo e a promover a união, de forma que a Grã-Bretanha se mantenha aberta para os negócios e para o mundo”, considerou o responsável pelas Finanças, George Osborne, nos Estados Unidos. O ministro garante que a sua correligionária política é a escolha certa para assumir o Governo. “Trabalho com ela há seis anos e tenho a certeza é a escolha para o cargo e que fará um bom trabalho”, acrescentou Osborne, que tal como outros governantes que apoiaram a permanência do Reino Unido na UE, não pretende manter-se em funções no próximo executivo.

Desistência de Leadsom

A ministra de 59 anos acabou por ser consagrada ao fim da manhã, quando a sua única rival na disputa pela liderança do Partido Conservador, Andrea Leadsom, desistiu da corrida. Ao confirmar o fim da candidatura, Leadsom disse que o apoio de apenas 84 deputados, ou 25% da bancada conservadora, seria insuficiente para se afirmar como uma líder credível e compor um de Governo forte – na última ronda de votação, Theresa May conquistou 199 votos, equivalentes a 60% dos deputados do partido.

Numa entrevista ao Telegraph, Leadsom, que é secretária de Estado da Energia, também deixou cair outras razões para desistir do duelo: a “tremenda pressão” e os “ataques constantes” de que foi alvo depois de anunciar a sua candidatura – e especialmente depois do seu comentário, que insiste ter sido mal interpretado, sugerindo que Theresa May não estava habilitada para ser líder do partido por não ter filhos.

Mas se Leadsom guardou alguma mágoa do processo, tal não transpareceu no seu breve discurso de desistência, em que elogiou a sua concorrente e se comprometeu a trabalhar com ela. Imediatamente, as vozes conservadoras começaram a afinar o coro de apoio à sua nova líder: uns atrás dos outros, figuras como Michael Gove e Boris Johnson – a dupla que dirigiu a campanha pelo “Brexit” e que depois se digladiou até ver esfumado o sonho de ascender ao topo do Governo – apareceram a elogiar May.

Depois de estudar as regras e estatutos do partido, Graham Brady, o chefe do comité dos deputados conservadores, anunciou a eleição de Theresa May como líder, “com efeitos imediatos”. Os tories desistiram, portanto, de levar até ao fim o processo de selecção numa convenção agendada para Setembro, onde todos os membros do partido seriam chamados a ratificar a escolha dos deputados – a escolha seria entre Theresa May e Theresa May.

Oposição pede eleições

No lado dos conservadores ninguém se mostrou interessado em levantar a questão da legitimidade democrática de Theresa May como futura primeira-ministra, mas a questão do seu mandato político dominou a reacção dos restantes partidos aos desenvolvimentos do dia, com vários responsáveis a exigir a convocação de eleições antecipadas. Desde 1916, o Reino Unido mudou de primeiro-ministro 24 vezes: a nova líder conservadora será a 12.ª a assumir a chefia do Governo sem ter ido a votos.

“Treze meses depois de os britânicos terem ido às urnas, os conservadores mergulharam o país no caos. É simplesmente inconcebível que Theresa May seja coroada primeira-ministra sem sequer ter vencido a eleição interna do seu partido, quanto mais a eleição geral do seu país. Temos de ir a votos: os conservadores não podem ignorar o eleitorado. May não apresentou a sua agenda, não venceu uma eleição, logo não tem direito a governar”, considerou o líder dos Liberais-Democratas, Tim Farron.

Em nome do Partido Trabalhista, Jeremy Corbyn também afirmou que a única solução para a crise política resultante da demissão de Cameron é uma nova eleição – o que, no seu  caso, representa um desafio acrescido, tendo em conta que os trabalhistas abriram a sua própria disputa pela liderança no partido no mesmo dia em que os tories efectivamente encerraram a sua.

A coincidência gerou até um estranho vaivém de jornalistas políticos em Londres, durante a manhã. Com os holofotes já ligados para a apresentação oficial da candidatura de Angela Eagle à liderança dos trabalhistas, chegou o aviso de que Andrea Leadsom se preparava para fazer uma declaração à imprensa: confrontados com o anúncio iminente de um novo Governo, muitos dos repórteres abandonaram a sala, relegando para segundo plano a revolta parlamentar contra Jeremy Corbyn.

As declarações do líder trabalhista acerca de Theresa May inflamaram ainda mais os revoltosos, que o acusaram de querer promover ainda mais instabilidade para se agarrar ao poder. O raciocínio dos deputados é que Corbyn está a tentar condicionar os seus concorrentes – que poderá sempre responsabilizar se o partido se sair mal de umas eventuais eleições.

“O país precisa que o Labour seja forte, e não acredito que Jeremy Corbyn seja capaz”, declarou Angela Eagle, a ex-ministra sombra da Economia que decidiu desafiar o actual líder do partido por acreditar que pode ser uma melhor primeira-ministra. “Não faria isto se não pensasse que tenho algo a oferecer para voltar a unir o partido e o país”, justificou. Além de Eagle, também o antigo porta-voz dos trabalhistas para as questões do emprego e pensões, Owen Smith, poderá avançar para a contenda.

 

 

 

 

 

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