Justiça australiana reconhece terceira opção no registo do género

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Norrie recusa-se a ser do sexo masculino ou feminino AFP

O Supremo Tribunal da Austrália aceitou a possibilidade de uma pessoa poder ser reconhecida perante o Estado como tendo um “género neutro”, além das actuais opções entre feminino e masculino – tornando-se um dos poucos países a admitir esta variante.

De acordo com a decisão judicial, “uma pessoa pode não ser nem do sexo masculino nem do sexo feminino” e “é autorizado o registo de uma pessoa como sendo de um género não especificado”. A decisão, explica a AFP, foi tomada na sequência de um recurso interposto no tribunal de Nova Gales do Sul, que pretendia ver rejeitada uma decisão que já previa a existência da terceira hipótese.

Em 2010, uma pessoa australiana com o nome Norrie, activista pela igualdade de género e que não se identifica como homem ou mulher, deu início a uma batalha legal para poder registar-se como tendo um género “não especificado” – depois de em 1989 se ter submetido a uma cirurgia de mudança de sexo. Norrie registou-se com esta terceira opção, mas poucos meses depois a designação foi-lhe negada por ser ilegal. Norrie disse considerar-se “assassinado socialmente”, pelo que levou o caso ao tribunal de recurso de Nova Gales do Sul, que lhe deu razão em meados de 2013.

Só que a decisão mereceu contestação e acabou nas mãos do Supremo, que agora a confirmou. Norrie, em reacção à nova decisão, citado pela AFP, disse-se “eufórico” e acrescentou que espera que as pessoas percebam que não existem apenas duas opções quando se fala em género sexual.

Porém, de acordo com a decisão judicial, para uma pessoa poder optar pelo “género neutro” terá de juntar alguma documentação médica que justifique a decisão. As consequências no casamento também permanecem por esclarecer, uma vez que o país não reconhece o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Em reacção à decisão do tribunal, Anna Brown, jurista do Centro para os Direitos Humanos, uma associação australiana, congratulou-se com o passo dado, mas alertou à AFP que é “essencial que o sistema legislativo reflicta em completo a realidade da diversidade de géneros na sociedade”. À mesma agência, Samuel Rutherford, director do grupo militante australiano Gender Agenda, destacou que, mais do que uma decisão com efeitos práticos, é “um caminho em direcção à igualdade e contra a discriminação”.

A decisão segue-se ao que já foi feito noutros países, como por exemplo a Alemanha, que, desde Novembro, passou a admitir uma terceira opção de registo para os recém-nascidos. No registo de nascimento passou a existir, além das opções feminino e masculino, a opção "indefinido", que irá indicar que o sexo biológico da criança não pode ser confirmado de forma inequívoca no nascimento, para evitar que médicos e pais tenham de decidir de forma rápida e sem informação suficiente.

A medida permite que a criança com características dos dois sexos (hermafrodita ou intersexual) registe o seu género sexual mais tarde na sua vida adulta, quando ficar definida a sua genitália, se esse for o caso. A nova legislação permite ainda ao indivíduo que fique registado sem ser do sexo feminino ou masculino.

Além da Alemanha, também a Austrália e a Nova Zelândia já permitiam a opção do terceiro género aos seus cidadãos e que a mesma fosse indicada em documentos como o passaporte. Estes países reconhecem que nem tudo se esgota num sistema de dois sexos e que, além do sexo masculino e feminino, há pessoas intersexuais, com características masculinas e femininas, como os hermafroditas e os pseudo-hermafroditas (num hermafrodita há simultaneamente tecido ovárico e testicular, enquanto um pseudo-hermafrodita só tem ou testículos ou ovários e os genitais externos são do outro sexo).

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