Hugh Grant desafia Cameron e irrita tablóides britânicos

Actor é o rosto da contestação ao projecto do primeiro-ministro de criar um supervisor para a imprensa britânica sem poderes inscritos na legislação. Proposta, votada segunda-feira no Parlamento, divide a coligação no Governo e pode não ser aprovada.

Foto
Grant tem sido atacado pela imprensa tablóide Andrew Winning/Reuters

O actor Hugh Grant está a liderar a pressão mediática sobre o primeiro-ministro britânico, David Cameron, que se arrisca a sofrer uma pesada derrota no Parlamento, depois de os seus parceiros de coligação terem apresentado um projecto de regulação da imprensa alternativo ao proposto pelo líder conservador, considerado demasiado brando em relação aos abusos da imprensa.

A polémica estalou na quinta-feira, quando Cameron pôs fim às negociações que duravam há vários meses entre os vários partidos com o objectivo de decidir a forma e os poderes de uma nova entidade de supervisão da imprensa.

O actual sistema de auto-regulação (os jornais nomeiam os responsáveis da entidade que os supervisiona) foi considerado ineficiente pelo juiz Leveson, que durante meses liderou um inquérito às práticas da imprensa na sequência das escutas ilegais feitas pelo extinto News of the World. No relatório final, o magistrado recomendou a criação de um supervisor independente, mas com poderes inscritos na lei – uma sugestão repudiada pela generalidade dos jornais, a começar pelos tablóides, para quem a medida abrirá a porta à intromissão política na imprensa.

Apesar de não concordar com a proposta, Cameron aceitou discutir a ideia, mas na quinta-feira bateu com a porta, anunciando que iria apresentar ao Parlamento uma proposta própria, que não inclui qualquer nova legislação. A decisão foi repudiada tanto pelo líder dos trabalhistas, Ed Miliband, como pelo vice-primeiro-ministro e líder dos liberais-democratas, Nick Clegg, que decidiram avançar com uma proposta alternativa, prevendo que o regulador tenha poderes instituídos na lei.

Sem os votos dos lib-dem, Cameron não tem a maioria necessária para fazer aprovar a legislação, o que poderá aumentar a contestação na bancada conservadora à manutenção da actual coligação. É aqui que entra Hugh Grant, a celebridade que desde o início do inquérito Leveson mais tem feito pressão para que os políticos aproveitem esta oportunidade para pôr fim aos abusos da imprensa tablóide, que fez a sua fama mundial devassando a vida de celebridades e que quase nunca reconhece o direito à privacidade como entrave a um “furo” jornalístico.

Os tablóides têm reagido de forma extremada – “O velho e orgulhoso estatuto britânico de farol da liberdade de imprensa está sob ameaça”, escreveu neste domingo o Sun on Sunday, jornal que Rupert Murdoch criou para substituir o News of The World. O Daily Mail foi ainda mais longe e denunciou que Grant lidera uma “conspiração cínica” para derrubar o Governo de Cameron: o jornal citava uma fonte do grupo de vítimas Hacked Off, de que Grant é o rosto, segundo o qual o actor teria telefonado a dirigentes trabalhistas ainda indecisos, ameaçando denunciá-los como traidores se votarem ao lado de Cameron.

Mas, nos últimos dias, o actor não poupou nas intervenções públicas, insistindo em que os deputados aprovem um regulador “que não possa ser controlado pela imprensa ou pelos políticos”. E num artigo de opinião publicado no sábado pelo Guardian, Grant critica directamente o primeiro-ministro: “Quando foi forçado a escolher entre honrar as promessas que fez às vítimas de anos de abusos de imprensa ou continuar amiguinho dos donos dos jornais próximos dos conservadores, escolheu os barões”.
 
 
 
 
 

Sugerir correcção
Comentar