Hollande acusa gigantes da Net de “cumplicidade” na difusão de mensagens de ódio

O primeiro-ministro, Manuel Valls, vai apresentar nos próximos dias um plano “tão completo como concreto” que incluirá “sanções mais rápidas e eficazes” contra os autores de "declarações de ódio" online.

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O Presidente francês no jantar do Conselho das Associações Judaicas Etienne Laurent/Reuters

Se “os grandes grupos de Internet não querem mesmo ser cúmplices do mal, devem participar na regulação” das mensagens que se difundem online, afirmou o Presidente francês, François Hollande, durante o jantar anual do Conselho Representativo das Associações Judaicas da França. Hollande recuperou algumas ideias já apresentadas pela ministra da Justiça, Christiane Taubira, sobre o combate ao discurso de ódio, ao racismo e anti-semitismo online.

Desde os atentados que fizeram 17 mortos em Janeiro contra o jornal satírico Charlie Hebdo e uma mercearia judaica em Paris que o Governo tem repetido que os grandes actores da Net (Google, Facebook, Apple e Amazon) colaboram pouco com as autoridades e são demasiado permissivos nas suas práticas de moderação. As empresas respondem que cumprem a lei francesa, que distingue os serviços que alojam conteúdos dos sites de informação, considerados “editores”.

Aos alojadores, como o Facebook ou o Youtube, não é exigido que vigiem de forma preventiva tudo o que é publicado na sua plataforma, explica o Le Monde, mas que apaguem todos os conteúdos “ilegais” que lhes sejam assinalados, para além de disponibilizarem aos utilizadores formulários onde estes possam facilmente denunciar discursos ilegais. Para ir mais longe, escreve o diário francês, o Governo terá de mudar a lei.

“Se conseguimos suprimir a circulação de imagens de pornografia infantil nas redes sociais, devemos agir da mesma maneira contra os que fazem a apologia do racismo, do anti-semitismo e do negacionismo” do Holocausto, defendeu Hollande.

Em Londres, o primeiro-ministro, David Cameron, também defendeu que as empresas que fornecem serviços de Internet têm de fazer mais para enfrentar o extremismo online. Uma semana depois do desaparecimento de três adolescentes que terão partido para se juntar aos jihadistas na Síria, Cameron disse que uma delas “seguia [nas redes sociais] 70 extremistas”. “As empresas de Internet têm uma enorme responsabilidade social e esperamos que estejam à altura dessa responsabilidade”, afirmou Cameron no Parlamento.

A Assembleia Nacional francesa já aprovou nos últimos anos uma série de medidas de excepção para lutar contra a pedofilia e a apologia do terrorismo online, permitindo bloquear sites por decisão administrativa (sem que um juiz seja consultado), e reforçando as sanções previstas no código penal. Mas num relatório publicado já este mês, a Comissão Consultiva dos Direitos Humanos, que aconselha o Governo, avisa que “as infracções que criminalizam os discursos de ódio e os abusos da liberdade de expressão são tão específicas que não podem ser integradas no código penal”.

O problema, dizem vários grupos de defesa da liberdade expressão, é o risco de banalizar medidas pensadas como de excepção, transformando-as em prática comum.

“Quando usamos um motor de busca e encontramos páginas e páginas que exibem impunemente conteúdo negacionista, então a indiferença torna-se em cumplicidade”, denunciou Hollande. O que o Presidente francês defendeu, sem referir, é a retirada dos motores de busca de links que reenviem para determinados sites, algo que já aconteceu com serviços ilegais (de telecarregamento, por exemplo) depois de decisões da justiça.

Nos próximos dias, disse o chefe de Estado, o primeiro-ministro, Manuel Valls, vai apresentar um plano “tão completo como concreto” que incluirá “sanções mais rápidas e eficazes” contra “as declarações de ódio”.

Num discurso que tinha como principal objectivo tranquilizar os judeus franceses, Hollande também lembrou que em Janeiro houve mais actos anti-muçulmanos do que ao longo de todo o ano passado. Isto depois de uma polémica que levou a direcção do Conselho Francês do Culto Muçulmano a boicotar o jantar do Conselho das Associações Judaicas. “Hoje, toda a violência é cometida por jovens muçulmanos e, claro, é uma pequena maioria da comunidade muçulmana e os muçulmanos são as primeiras vítimas”, disse o seu presidente, Roger Cukierman. A direcção do Conselho Muçulmano exige um pedido de desculpas público.

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