Grécia em corrida em contra-relógio para encontrar solução na Europa

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O ministro das Finanças Yanis Varoufakis desloca-se a várias capitais europeias esta semana ARIS MESSINIS/AFP

Face a uma situação com evolução incerta, procuram-se sinais. A pergunta na cabeça de todos é se haverá uma zona comum em que seja possível um entendimento entre a Grécia e os seus parceiros europeus. O tempo avança, aproximam-se datas-limite, e os sinais são contraditórios.

A via que a Grécia quer seguir está a desenhar-se com a agenda da próxima semana, que promete ser tão frenética como a que passou: o primeiro-ministro, Alexis Tsipras, vai estar em Itália na terça-feira para um encontro com o primeiro-ministro Matteo Renzi, e na quarta-feira em França onde se reunirá com o Presidente François Hollande (a primeira viagem oficial de Tsipras é ao Chipre, e irá antes do fim da semana, em data a definir, a Bruxelas).

Já o ministro das Finanças, Yanis Varoufakis, adiantou a viagem a Paris um dia: chegou no sábado, mas inicia os encontros políticos no domingo, em vez de segunda-feira, como previsto. Varoufakis foi um dos protagonistas da semana. Londres (onde o primeiro-ministro, David Cameron, foi o primeiro a reagir à vitória do Syriza com uma mensagem de cautela), é outra das paragens de Varoufakis, bem como Roma, uma das capitais mais sensíveis à mensagem de que é necessária uma abordagem que permita crescimento,

Mas se após o primeiro telefonema com o seu homólogo holandês e chefe do Eurogrupo Jeroen Dijsselbloem, Varoufakis sublinhou que ambos tinham concordado em desafiar a narrativa de um choque entre a Grécia e os seus parceiros europeus, esta narrativa parece ter conseguido vida própria na primeira conferência de imprensa conjunta em Atenas.

Dijsselbloem recusou a ideia de uma conferência da dívida para discutir não só a dívida grega mas outras dívidas excessivas como a portuguesa: “Já há o Eurogrupo”, que junta os ministros das Finanças da União Europeia, disse. Acrescentou que “passos unilaterais não são o caminho”, e dizendo que já houve progresso na Grécia, concluiu: “Não devemos perder este progresso”.

A chanceler alemã Angela Merkel excluiu o cenário de um novo alívio da dívida pública da Grécia. “Já houve um perdão voluntário da dívida por parte dos credores privados, os bancos já renunciaram a milhares de milhões da dívida grega”, disse Merkel numa entrevista ao jornal Hamburger Abendblatt de sábado, a primeira reacção de viva voz desde que o Syriza ganhou as eleições, há uma semana. “Não vejo como pode haver um novo perdão da dívida”, afirmou.

Varoufakis repetiu a Dijsselbloem a linha do Syriza de que não quer negociar com a troika mas sim com a União Europeia, que não quer uma extensão do programa da troika e que quer sim um novo acordo. “Este Governo foi eleito na lógica de desafiar este programa. Não iremos contra isto pedindo uma extensão”, disse o ministro grego.

Mas foi quando Varoufakis afirmou que a troika era “uma instituição assente em instituições podres”, ou “anti-europeia” (a expressão exacta varia segundo as traduções), que o ambiente gelou. Dijsselbloem sussurrou-lhe algo, a que Varoufakis não respondeu. Quando Dijsselbloem se levantou, mal apertou a mão a Varoufakis, precipitando-se para a saída.

Um coro de vozes levantou-se nos outros partidos gregos. Da Nova Democracia – cujo anterior primeiro-ministro, Antonis Samaras, levou os discos duros dos computadores do gabinete antes da transição – veio a imediata afirmação: “Eles não fazem a menor ideia daquilo em que se estão a meter”. O Partido Socialista (Pasok) considerou que a coligação “chegou a um impasse”.

Retirar barricadas
O episódio surge no final, tenso, de uma semana de frenesim em Atenas, em que a discussão para um acordo de Governo demorou uma hora, a apresentação do Executivo um dia, e logo foram anunciadas as primeiras acções, a maioria com o objectivo de “aliviar a crise humanitária”, uma promessa de campanha: medidas como electricidade para famílias que não a podem pagar, por exemplo. Também foi anunciada a suspensão da privatização do porto de Pireu, ou a recontratação de funcionários públicos despedidos, medidas que deverão irritar a troika, podendo ser vistas como uma marcha-atrás nas reformas (alguns analistas gregos sublinham, no entanto, que não houve verdadeiras reformas dos anteriores Governos, apenas cortes cegos).

Uma acção do novo Executivo foi especialmente notada pelo seu simbolismo: o ministro da Protecção dos Cidadãos e Ordem Pública ordenou que fossem retiradas as barricadas da frente do Parlamento grego. Estas foram postas para proteger os deputados de manifestantes anti-austeridade e não saíam do lugar desde 2010, apesar de no último ano as manifestações terem diminuído e já quase não haver protestos em frente ao Parlamento.

Entre as medidas anunciadas, uma destacou-se pelo potencial de desentendimento entre o Syriza e o seu estranho parceiro de coligação, os Gregos Independentes. A responsável pela pasta da Imigração Tasia Christodoulopoulou anunciou que crianças que nasçam na Grécia filhas de migrantes terão nacionalidade grega, ao contrário do que hoje acontece. A imigração é um potencial ponto de fractura na coligação, que poucos esperam que seja muito duradoura.

Mas se é certo que os dois partidos têm mais diferenças do que semelhanças, também é verdade que se os Gregos Independentes usarem o seu potencial de chantagem e deitarem o Governo abaixo serão castigados em eleições, o que pode significar nem sequer entrar no Parlamento para um partido que acabou de obter apenas 4,7% (a linha para entrar é de 3%). Por outro lado, analistas esperam que o Syriza use o apoio de outros partidos, como o Pasok ou O Rio (To Potami) para fazer aprovar medidas deste género.

Negociar para ganhar
Por enquanto, os partidos da coligação estão fixados nas negociações com a União Europeia, que é o mais urgente. E aqui, a escolha do parceiro de coligação do Syriza já indiciava uma vontade de negociar duro. Se Alexis Tsipras quisesse a posição alternativa, de tentar conversações mais suaves, poderia ter optado pelo partido O Rio, que defendia uma negociação com a garantia à partida de que não haveria o risco de hostilizar a União Europeia.

“Não vamos procurar uma solução catastrófica, mas também não vamos consentir uma política de submissão. O país está a levantar a sua cabeça”, disse Tsipras.

O medo é que sem uma extensão do programa da troika – o actual termina a 28 de Fevereiro, se não for prolongado – e sem novo financiamento, a Grécia possa ficar sem dinheiro (o Banco Central Europeu já disse que não poderá dar liquidez ao país). Varoufakis falou de uma “ponte” entre os programas anteriores e um novo acordo, mas não é claro como esta poderia ser conseguida.

Países como Espanha, Itália ou França temem, pelo seu lado, que concessões à Grécia fortaleçam os seus partidos eurocépticos ou que defendem alternativas à austeridade. Países como a Alemanha, a Finlândia ou Holanda têm medo que as mesmas concessões possam levar a países como Portugal e Espanha a pedir o fim dos seus programas de austeridade.

Pelo seu lado, o Governo grego tem de conseguir ganhos mais do que marginais para não ser rapidamente hostilizado pelos seus eleitores. Mas uma negociação falhada com a União Europeia, e sobretudo uma saída da Grécia do euro, também não seria do seu interesse, levando a uma situação desastrosa a curto prazo.

As consequências de uma Grécia fora do euro são mais fáceis de imaginar (desvalorização da moeda, corridas aos bancos, etc, tudo o que já aconteceu a países que entraram em bancarrota) do que as consequências para a moeda única e a própria UE de uma saída da Grécia – não há precedentes, nem está previsto em qualquer tratado uma saída quer do euro quer da UE. 

Mas como dizia o jornalista grego Nick Malkoutzis, o facto de um cenário não interessar a nenhuma das partes não o torna impossível.

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