Governo da Bósnia compara efeitos das cheias à guerra de 1992-95

Ministro dos Negócios Estrangeiros diz que pelo menos um quarto da população foi afectada. Inundações e deslizamento de terras arrastaram minas colocadas há mais de 20 anos.

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Pelo menos 500.000 pessoas abandonaram as suas casas na Bósnia-Herzegovina Marko Djurica/Reuters
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As inundações da última semana na região dos Balcãs afectaram um quarto da população da Bósnia-Herzegovina e dezenas de milhares nas vizinhas Sérvia e Croácia. A escala da catástrofe levou os governantes bósnios a fazer comparações com a guerra da década de 1990, quando "muitas pessoas perderam tudo".

Só na Bósnia, cerca de 500.000 pessoas abandonaram as suas casas para fugirem à subida das águas, após três dias em que choveu o que costuma chover em três meses naquela região. Na vizinha Sérvia, são pelo menos 25.000 as pessoas que se viram forçadas a procurar refúgio em zonas mais elevadas.

Mas o número de pessoas afectadas pelas cheias, directa ou indirectamente, é muito superior – o ministro dos Negócios Estrangeiros da Bósnia-Herzegovina, Zlatko Lagumdzija, disse nesta segunda-feira que pelo menos um milhão de pessoas ficou sem acesso a água potável, ou mais de um quarto da população do país. Na Sérvia, cerca de 100.000 pessoas ficaram sem electricidade.

As declarações dos responsáveis políticos apontam para uma tragédia com uma dimensão que só será possível perceber na sua totalidade nos próximos dias e semanas. "As consequências das cheias são aterrorizantes", disse Zlatko Lagumdzija, já depois de o Presidente da Bósnia-Herzegovina, Bakir Izetbegovic, ter afirmado que o país "enfrenta uma catástrofe horrível".

E nem a recordação da guerra de 1992-95 permite minimizar os efeitos das maiores inundações dos últimos 120 anos na região. "A destruição física não é menor do que a destruição causada pela guerra. Durante a guerra, muitas pessoas perderam tudo; agora, voltaram a ficar sem nada", lamentou o ministro dos Negócios Estrangeiros da Bósnia-Herzegovina.

Na região de Maglaj, a cerca de 80 quilómetros da capital, Sarajevo, as águas subiram até aos três metros. A memória de muitos habitantes locais está ainda marcada pela brutalidade da guerra, mas a catástrofe que lhes bateu à porta nos últimos dias deixou-os em choque.

"Pensava que não havia nada pior do que a guerra, mas afinal as coisas podem piorar ainda mais. Rezo a Deus para que possamos salvar a nossa sanidade mental. Primeiro foi a guerra, e agora isto", disse à agência Reuters Hatidza Muhic, que viu a sua casa em Donje Polje ser engolida pelas águas.

O número de mortos ainda é provisório, e assim deverá continuar nos próximos dias, à medida que as equipas de socorro percorrem as zonas afectadas em busca de mais vítimas. Na manhã desta segunda-feira, estavam confirmadas 38 mortes, a maioria na Bósnia-Herzegovina.

Mas se em algumas localidades as águas começaram a recuar, noutras continua a existir o perigo de inundação, principalmente no Norte da Bósnia e no Oeste da Sérvia.

E se as minas explodem?

As atenções das autoridades estiveram centradas nos últimos dias na evacuação de cidades e nas operações de salvamento, mas o cenário poderá tornar-se ainda mais negro nas próximas semanas, com o risco de doenças e de deslizamento de terra, a incerteza quanto à integridade das centrais eléctricas na Sérvia e a deslocação de muitas das minas que continuam enterradas no território da Bósnia-Herzegovina desde a guerra.

O organismo responsável pelas operações de desminagem no país, o BHMAC, emitiu um aviso público a alertar para "a possibilidade de as cheias e os deslizamentos de terras terem movido alguns campos minados e arrancado sinais de aviso". Segundo as informações recolhidas pelo BHMAC, há pelo menos quatro casos confirmados – em Olovo, a cerca de 50 quilómetros da capital, Sarajevo, a subida das águas do rio Krivaja apagou os sinais que marcavam áreas que poderiam estar minadas; em Bosanska Krupa, no Noroeste, um deslizamento de terras arrastou algumas minas de uma zona para outra; e em Visoko, no centro do país, as autoridades marcaram duas novas áreas com avisos de que poderão estar repletas de armamento explosivo.

Na Sérvia, uma das principais preocupações é agora a segurança de duas centrais eléctricas, localizadas nos arredores da capital.

A maior delas, a central Nikola Tesla, a 30 quilómetros de Belgrado, foi ameaçada pelas águas que transbordaram do rio Sava, cujo caudal foi saturado pela chuva que caiu na Croácia.

Tanto a central Nikola Tesla como a Kostolac foram palco de uma operação preparada pelas autoridades e executada por centenas de voluntários, soldados e trabalhadores da empresa energética estatal ao longo de três dias.

Uma dirigente sindical sérvia, Djina Trisovic, disse à agência Reuters que a central Nikola Tesla "já deverá estar em segurança", mas deixou uma frase que sublinha também a incerteza quanto ao desfecho da catástrofe na região dos Balcãs: "Fizemos tudo o que podíamos. Agora está tudo nas mãos de Deus."

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