Papa condena violência dos jihadistas e recorda sírios e iraquianos perseguidos

Foi para um campo de refugiados em Ankawa, vila cristã do Curdistão iraquiano, que Francisco telefonou durante a Missa do Galo. “Vocês são como Jesus na noite de Natal”, disse-lhes, lembrando todos os que foram obrigados a fugir.

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“Que a indiferença se transforme em proximidade e a rejeição em hospitalidade", pediu o Papa ALBERTO PIZZOLI/AFP

Um ano depois de ter pedido aos cristãos que continuassem “a rezar ao Senhor para que poupe ao amado povo sírio mais sofrimentos” e a Deus para “curar as feridas do amado Iraque”, o Papa voltou a falar da Síria e do Iraque. “A Deus, salvador do mundo, peço que olhe os nossos irmãos e irmãs do Iraque e da Síria que há tanto tempo sofrem os efeitos do conflito e, com os que pertencem a outros grupos étnicos e religiosos, sofrem uma perseguição brutal”, disse na sua mensagem de dia de Natal, no balcão da Basílica de S. Pedro.

O ano que agora acaba foi aquele em que os jihadistas do autoproclamado Estado Islâmico (EI) conquistaram vastas áreas do Iraque e obrigaram à fuga de mais de 1,5 milhões de pessoas só para o Curdistão iraquiano, a região autónoma do Norte do Iraque. A maioria são cristãos de Mossul, a segunda maior cidade do país, e de cidades e vilas próximas. Muitos são yazidis, uma minoria pré-islâmica que os radicais consideram “adoradores do diabo”, vindos de outras zonas do Iraque mas também da Síria.

Foi para um campo de refugiados em Ankawa, vila cristã dos arredores de Erbil, capital do Curdistão, que Francisco telefonara durante a Missa do Galo. “Vocês são como Jesus na noite de Natal. Ele também não tinha lugar e teve de fugir para o Egipto para se salvar”, disse aos refugiados o argentino, num telefonema por satélite proporcionado pela televisão italiana católica TV2000. “Abraço-vos e desejo-vos a todos um santo Natal.”

Em 2003, quando os norte-americanos invadiram o Iraque, viviam no país 1,5 milhões de cristãos. Na Síria, antes da revolta de 2011, os cristãos eram 10% de uma população de 22 milhões. Hoje, haverá uns 400 mil cristãos no Iraque (fora do Curdistão) – alguns regressaram a Bagdad nos últimos meses, em fuga dos radicais, quando nos anos da guerra civil e das bombas tinham fugido da capital para o Norte, então mais seguro.

Na Síria, é impossível saber quantos restam, mas serão muito poucos nas zonas controladas pelo Estado Islâmico. “Só ficaram algumas famílias de pessoas mais velhas que não puderam vir embora e são obrigadas a pagar um imposto ao ISIS [Estado Islâmico do Iraque e de al-Shams, outro dos nomes do EI]”, disse à televisão Al-Arabiyah Sulaiman Youssef, académico sírio que estuda as minorias.

Numa carta em apoio aos cristãos destes países árabes, conhecida na segunda-feira, já Francisco denunciara “uma organização terrorista de uma dimensão que não imaginámos possível, que comete todo o tipo de abusos e ataca alguns de vós que foram violentamente expulsos das vossas terras, onde há cristãos desde o tempo dos apóstolos”. Nesse texto, pede-lhes que “perseverem” e que permaneçam na região.

Na manhã de dia 25, na mensagem Urbi et Orbi (à cidade e ao mundo), o argentino evocou de novo “as numerosas pessoas dispersas, deslocadas e refugiadas, crianças, adultos e pessoas idosos, da região e do mundo inteiro”, apelando a “que possam receber a ajuda necessária para sobreviver ao rigor do Inverno e regressar aos seus países”.

Francisco pediu a paz “em todo o Médio Oriente”, a partir da Terra Santa, mas também na Nigéria, “onde demasiadas pessoas são injustamente afastadas do afecto dos seus próximos e feitas reféns ou massacradas”. E pediu o diálogo e a pacificação na Líbia, no Sudão do Sul, na República Centro-Africana e na República Democrática do Congo, repetindo alguns dos conflitos a que já se referira há um ano.

Desta vez, lembrou ainda “todos quanto sofrem na Ucrânia”, pedindo a Jesus que “permita àquela amada terra superar as tensões, vencer o ódio e a violência e reaprender um novo caminho de fraternidade e reconciliação”.

Lágrimas e crianças
“Verdadeiramente, há tantas lágrimas neste Natal”, lamentara na Missa do Galo, depois de elogiar “as pessoas simples, por oposição aos arrogantes, orgulhosos, os que estabelecem as leis de acordo com os seus critérios pessoais”.

Em todos estes conflitos, há “demasiadas crianças vítimas de abusos e exploradas debaixo dos nossos próprios olhos e com o nosso silêncio cúmplice”, denunciou. Depois, deixando por momentos de seguir o texto que preparara, lembrou as crianças mortas em bombardeamentos, incluindo lá, onde nasceu o filho de Deus”, na Terra Santa. “Que Jesus salve as demasiadas crianças vítimas da violência, objecto de tráfico e de maus-tratos, ou obrigadas a tornar-se soldados”, pediu.

“Quem levará conforto às famílias das crianças mortas no Paquistão, a semana passada?”, perguntou em seguida. Foram 133 os alunos de uma escola mortos num ataque de um grupo de taliban paquistaneses na cidade de Peshawar. “Temos a coragem de receber com ternura as dificuldades e os problemas dos que nos estão próximos?”, questionara na véspera o Papa argentino. “Ou preferimos soluções impessoais, talvez eficazes mas despojadas do calor do Evangelho? De quanta ternura precisa hoje o mundo!”

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