Relatório confirma que MH17 foi abatido por míssil e critica companhias aéreas

Agência holandesa apresentou esta terça-feira os resultados da investigação ao abate do avião da Malaysia Airlines no Leste da Ucrânia, em Julho do ano passado.

Fotogaleria
Destroços do Boeing 777 durante a apresentação do relatório EMMANUEL DUNAND/AFP
Fotogaleria
Todas as 298 pessoas que estavam a bordo morreram BULENT KILIC/AFP

A autoridade holandesa que investigou o abate do avião da Malaysia Airlines sobre a Ucrânia (voo MH17), no ano passado, concluiu que a aeronave foi atingida por um míssil do sistema russo Buk. A agência não tinha competência para identificar quem disparou o míssil, mas lançou duras críticas às autoridades ucranianas e às companhias aéreas por terem falhado na avaliação dos riscos que existiam naquela região.

Os principais pontos do relatório foram apresentados esta terça-feira, ao fim de 15 meses, e, na opinião dos seus autores  especialistas de sete países liderados pela Holanda , a queda do avião foi provocada pela detonação de um míssil do sistema russo Buk.

O presidente da Autoridade de Segurança Holandesa, Tjibbe Joustra, começou por dizer que o míssil foi disparado numa área de 320km quadrados no Leste da Europa, mas sublinhou que a sua agência não tem autoridade para investigar se essa área era naquele momento controlada pelo Exército ucraniano ou pelos combatentes rebeldes pró-russos — essa investigação está a ser feita num inquérito criminal paralelo e os resultados deverão ser apresentados no início do próximo ano. Mas mesmo essa investigação muito dificilmente será esclarecedora, porque o sistema Buk é usado tanto pelo Exército russo como pelo Exército ucraniano.

O que a investigação holandesa conseguiu provar é que o Boeing 777 da Malaysia Airlines foi, de facto, abatido por um míssil do sistema Buk, que atingiu o avião no lado esquerdo da cabina, matando de forma instantânea os seus ocupantes.

Tjibbe Joustra não fez qualquer referência ao que aconteceu aos restantes ocupantes do avião no momento do impacto, mas um familiar de um dos passageiros disse à BBC que o relatório indica que "toda a gente perdeu a consciência instantaneamente".

Esta é uma das questões mais importantes para os familiares das 298 vítimas, como sublinhou o pai de Liam Sweeney, um jovem britânico que estava a caminho da Nova Zelândia, onde iria assistir a um jogo da equipa de futebol Newcastle United.

"Acho que vão dizer que o avião foi destruído por completo, e espero que toda a gente tenha morrido nesse momento. Penso que quando o míssil atingiu o avião, a descompressão matou todas as pessoas, ou fez com que tenham ficado inconscientes em segundos", disse Barry Sweeney ao programa Today, da BBC Radio 4, antes da apresentação pública do relatório (o documento foi entregue aos familiares antes da conferência de imprensa).

Outras hipóteses afastadas
O presidente da Autoridade de Segurança Holandesa foi claro ao afirmar que o Boeing 777 só pode ter sido abatido por um míssil disparado a partir de um sistema terra-ar Buk. O relatório  que foi aprovado por unanimidade pelos sete países envolvidos  exclui outras teorias que foram sendo avançadas desde Julho do ano passado: o avião não foi atingido por um meteorito; não sofreu problemas técnicos; não se verificou qualquer explosão a bordo; e não foi atacado por um avião militar.

Esta última referência foi dirigida a Moscovo, que num primeiro momento acusou a Força Aérea da Ucrânia de ter abatido o avião da Malaysia Airlines.

Críticas a Kiev e companhias aéreas
Para além da questão do projéctil que derrubou o avião, a investigação liderada pela Holanda analisou a pergunta que muitos fizeram no dia do desastre, 14 de Julho de 2014 como foi possível que um avião comercial estivesse a sobrevoar uma zona de conflito onde já tinham sido abatidos vários aviões militares?

"Nenhuma das partes envolvidas reconheceu os riscos do conflito armado que estava a decorrer no solo", afirmou Tjibbe Joustra, acusando em particular as autoridades de Kiev (responsáveis pelo seu próprio espaço aéreo) e todas as companhias que continuaram a seguir aquela rota.

"Quase todas as companhias" continuaram a sobrevoar a Ucrânia porque pensaram que os seus aviões estariam a salvo, disse Joustra, isto, acrescentou, apesar de haver informação suficiente para que as autoridades e as companhias tivessem decidido cancelar os seus voos naquela área. Não obstante, 160 voos passaram pelo Leste da Ucrânia já depois do dia do desastre. O espaço aéreo naquela zona só viria a ser fechado três dias mais tarde, a 17 de Julho.

"Ninguém pensou na possibilidade de uma ameaça para a aviação civil", acusou o responsável holandês, frisando que o relatório contém várias recomendações para melhorar a segurança da aviação civil no sobrevoo de zonas de conflito.

"Os Estados envolvidos em conflitos devem esforçar-se mais para garantir a segurança. Outras entidades e companhias devem ser mais transparentes", afirmou.

Rússia culpa Exército da Ucrânia
A versão defendida desde o início por vários países ocidentais principalmente pelos Estados Unidos é a de que o avião foi abatido por um míssil do sistema Buk a partir de território controlado pelos rebeldes pró-russos, mas Washington nunca chegou a acusar abertamente Moscovo de estar directamente envolvida.

Também esta terça-feira, antes da apresentação do relatório holandês, o fabricante do sistema Buk, a russa Almaz-Antei, organizou uma conferência de imprensa, onde apresentou a sua versão do que poderá ter acontecido. Segundo a Almaz-Antei, o míssil é de facto do sistema Buk, mas o modelo é de finais da década de 1990 e já não faz parte do arsenal russo, pelo que terá sido disparado pelas forças ucranianas — a Almaz-Antei apresentou também mapas e uma simulação segundo a qual o míssil foi disparado a partir de território controlado pelo Exército de Kiev.

O grupo independente Bellingcat, que se dedica a vasculhar as redes sociais para reconstituir acontecimentos, diz que várias fotografias, vídeos e testemunhos provam que o sistema de mísseis usado para derrubar o MH17 entrou na Ucrânia em Junho do ano passado a partir da cidade russa de Kursk.

Sugerir correcção
Ler 40 comentários