Espanha: Contados os votos, o que vão fazer os políticos?

Na Espanha pós-fim do bipartidarismo não se governa sem pactos. Cenários possíveis num Congresso tão fragmentado como o de Dezembro

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Partidos vão precisar de se entender e negociar pactos para governar AFP/CESAR MANSO

Grande coligação (PP + PSOE + Cidadãos)

É a solução preferida do meio empresarial e foi a que Mariano Rajoy e Albert Rivera mais defenderam ao longo da campanha. “Vou trabalhar para o conseguir”, disse Rajoy. "Desde que seja sem ti", respondeu de cada vez Rivera, os membros do Cidadãos estão prontos “a sentar-se a uma mesa e a não se levantar até que se alcancem os acordos necessários”. No outro extremo, o líder do PSOE foi o mais claro que pôde: “Não vamos permitir um Governo PP nem de forma activa nem passiva [através da abstenção no voto da investidura no Congresso]”, prometeu Pedro Sánchez.

Juntos, PP e Cidadãos não chegam aos 176 da maioria absoluta. Mas à segunda votação já basta uma maioria simples. Como nem um nem outro admitem dialogar com forças nacionalistas, resta-lhes convencer o PSOE a abster-se para deixar passar um executivo de minoria. Uma opção muito arriscada para o PSOE (e que contraria todo o discurso de Sánchez), mas que o “Brexit” britânico pode ter tornado menos difícil, ajudando a justificar este apoio em nome da “estabilidade”.

Rajoy e os seus ministros aproveitaram o último dia de campanha para exacerbar a ameaça da incerteza face aos resultados do referendo britânico. “Nestas circunstâncias é especialmente relevante gerar confiança, credibilidade e ter um Governo com a agenda económica correcta”, afirmou o ministro da Economia, Luis de Guindos. Domingo, Rajoy disse apenas que vai “falar com todos”, mas outros conservadores não deixaram de exigir a Sánchez que se assuma: ou deixa governar quem os espanhóis escolheram ou embarca em “aventuras com extremistas”.

Governo PP (com ou sem Rajoy) + Cidadãos (abstenção do PSOE)

Sem maiorias de esquerda ou de direita no Congresso, este acaba por ser o cenário mais provável. O líder do partido liberal de centro-direita Cidadãos, Rivera, nunca teve problemas em negociar com o Partido Popular – a sua “linha vermelha” chamava-se Rajoy. Com mais ou menos responsabilidades (para além das políticas, que nunca assumiu), o ainda primeiro-ministro, líder do PP desde 2004, tornou-se sinónimo do pior da “velha política”, contra a qual nasceu o partido de Rivera: corrupção em grande escala, financiamento paralelo do partido, portas giratórias, impunidade da banca…

O problema para Rivera é que com o resultado que Rajoy teve ninguém o vai conseguir afastar da liderança do PP. Ao mesmo tempo, grande parte do crescimento dos conservadores consegue-se com votos roubados ao Cidadãos (a campanha do PP fez-me muito na insistência de que votar nas listas de Rivera era “deitar votos ao lixo”), o que dificulta a aproximação. Seja como for, Rivera teve um resultado muito inferior ao que esperava, pelo que não está numa posição de exigir seja o que for ao PP antes de se sentar à mesa com os seus líderes. 

Coligação PSOE + Unidos Podemos

Olhando para os programas, seria o cenário mais lógico e é também o entendimento que mais sentido faz para os espanhóis. Só que os resultados tornaram esta opção impossível. Juntas, as duas candidaturas somam apenas 156 deputados, menos 20 do que os necessários 176 para passar no Congresso sem negociar com outras forças. Mesmo se PSOE e Unidos Podemos chegassem para governar já haveria problemas de sobra. Em tempos de ruptura do sistema partidário, os partidos pensam tanto em estratégia como em propostas (grandes ausentes desta campanha). Os dirigentes do PSOE desconfiam de Iglesias e consideram que aliar-se aos seus rivais à esquerda equivale ao “beijo da morte”. Negociar a sério com o PSOE, por outro lado, obrigaria o Podemos a abdicar de propostas fundamentais para as candidaturas regionais que o apoiam, nomeadamente o referendo sobre a independência da Catalunha.

Governo PSOE + Cidadãos (abstenção Unidos Podemos)

Se Iglesias preconizava uma coligação PSOE + Unidos Podemos, já Pedro Sánchez sempre defendeu que o seu partido é o único capaz de liderar uma “aliança de forças progressistas”, com os dois partidos emergentes do novo panorama político espanhol. Para o líder do PSOE, só este cenário é capaz de oferecer a Espanha uma solução para uma legislatura. Em nome dessa “coligação para a mudança”, Sánchez chegou a oferecer um governo “o mais representativo possível”, com ministros de ambos os partidos. Juntos, os três somam 188 deputados, uma confortável maioria no Congresso de 350.

Mas se o PSOE encontra pontos de contacto entre as suas propostas e as das formações à sua esquerda e à sua direita, é a distância entre os dois novos grandes partidos que se apresenta como insanável. Os espanhóis, prometeu Albert Rivera, votaram para decidir se querem um governo com “o Podemos ou com o Cidadãos”. Ao mesmo tempo, Iglesias considera que o partido liberal nascido na Catalunha é uma espécie de “PP melhorado” e repetiu na noite das eleições que não está disposto a contribuir para um Governo onde estejam o PP ou o Cidadãos.

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