Enquanto os EUA bombardeiam jihadistas, Assad aproveita para aumentar ataques

O mundo tem os olhos em Kobani, cidade curda que resiste aos jihadistas com apoio aéreo internacional. No resto da Síria, o regime ganha terreno e pode conquistar Alepo, criando uma nova crise de refugiados.

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Ferido de um ataque aéreo das forças de Assad em Duma, subúrbio de Damasco Badra Mamet/Reuters

Desde Agosto que o regime sírio aumentou a pressão sobre zonas controladas por rebeldes moderados, matando de caminho centenas de civis por mês. As notícias destes ataques é que têm chegado menos – foram substituídas pelos bombardeamentos aéreos da coligação formada por Barack Obama contra os jihadistas do autoproclamado Estado Islâmico.

Só no último mês, a força aérea de Bashar al-Assad lançou 1592 ataques e matou pelo menos 396 pessoas, deixando outras 1500 feridas, diz o Observatório Sírio dos Direitos Humanos. Aviões e helicópteros lançaram as chamadas barrel bombs (barris de aço cheios de explosivos e de munições) nas regiões de Alepo, Hama, Deraa, Iblid, Quneitra e nos subúrbios rurais de Damasco.

“Todos os dias há um massacre no Leste de Ghutta”, dizia no fim de Outubro à Associated Press o activista Hassan Taqieldeen. Ghutta, nos arredores orientais de Damasco, que se estendem até Duma, foi o cenário do ataque com gás sarin que matou mais de mil pessoas a 21 de Agosto de 2013. “O regime ataca pelo menos 20 vezes por dia”, descrevia Taqieldeen.

De acordo com este activista, que vive em Duma, a nova piada na região é que os habitantes “deviam mudar o nome de Duma para Dumani”. “Talvez se rimar com Kobani os americanos oiçam a palavra e nos prestem atenção.” Kobani é o nome da cidade curda síria junto à fronteira com a Turquia que tem sido alvo de grande parte dos raides aéreos internacionais contra os jihadistas.

Pela mesma altura, o principal grupo da oposição no exílio avisava que mais de 300 mil pessoas em áreas controladas por rebeldes de Alepo, a maior cidade do país, no Norte, estavam em risco de ser sujeitas a uma “campanha de fome prolongada”, táctica que Assad usou durante meses para forçar a rendição das forças que controlavam Homs e alguns subúrbios de Damasco.

“O regime de Assad intensificou a sua campanha de ataques aéreos em zonas residenciais por toda a Síria, particularmente em Alepo”, disse Hadi Bahra, o chefe da oposição.

Terça-feira, o Governo da Turquia afirmou temer a chegada às suas fronteiras de “2 a 3 milhões de refugiados” (a juntar aos mais de 1,5 milhões que o país já acolhe) caso Alepo caia nas mãos do regime ou dos radicais. “A única força que combate tanto o Estado Islâmico como o regime sírio é o Exército Livre da Síria [primeiro grupo armado da oposição, criado no Verão de 2011 por desertores e civis]. Mas esta força não consegue alcançar os seus objectivos precisamente por se bater contra estes dois grupos”, disse o ministro dos Negócios Estrangeiros turco, Mevlut Cavusoglu, em Ancara.

O enfraquecimento da oposição moderada e do Exército Livre da Síria só conduzirá a avanços dos jihadistas e das forças do regime, o que deixará a Síria “ainda mais instável”, avisou o ministro.

Nas últimas semanas, para além de terem marchado vitoriosos em Adra, um subúrbio de Damasco, e de terem conseguido entrar em parte de Jobar, bairro da capital, os combatentes de Assad avançaram muito na província de Alepo, reclamando o controlo de várias vilas, incluindo na região estratégica de Handarat, a norte de Alepo e junto a uma das últimas estradas que permite aos rebeldes chegarem aos reforços e alimentos que trazem da fronteira turca.

Há analistas que acreditam que os Estados Unidos só começaram a largar bombas na Síria depois de o negociarem com Assad – mais provável é que que haja um simples acordo tácito, com Damasco a aproveitar estes ataques, certo que não será um dos alvos.

O regime chegou a dizer que Washington não tem legitimidade para o que está a fazer, mas o ministro dos Negócios Estrangeiros de Assad, Walid Moallem, já afirmou que “se o objectivo deles é atacar o ISIS [Estado Islâmico do Iraque e do Levante, como o Estado Islâmico se fazia chamar até ao Verão], está tudo bem”.

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