Escócia decide continuar no Reino Unido, mas nem tudo fica na mesma

O "não" garantiu a vitória no referendo sobre a independência escocesa com 55,3%. O "sim" ficou com 44,7%.

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Resultados REUTERS/Paul Hackett
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Festejos dos apoiantes do "não" AFP PHOTO / ANDY BUCHANAN
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Festejos dos apoiantes do "não" AFP PHOTO / LEON NEAL
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Apoiantes da independência AFP PHOTO / ANDY BUCHANAN
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Festejos dos apoiantes do "não" REUTERS/Dylan Martinez
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Festejos dos apoiantes do "não" AFP PHOTO/ANDY BUCHANAN
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Jornalistas a ouvir o discurso David Cameron AFP PHOTO / LEON NEAL
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Apoiantes da independência AFP PHOTO / LESLEY MARTIN
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Apoiantes do "sim" AFP PHOTO / LESLEY MARTIN
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Festejos dos apoiantes do "não" REUTERS/Dylan Martinez
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Apoiantes da independência AFP PHOTO / ANDY BUCHANAN
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Apoiantes da independência AFP PHOTO / ANDY BUCHANAN
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Os restos de uma mensagem escrita numa fita de campanha pelo "sim" REUTERS / Cathal McNaughton

O “não” à independência da Escócia ganhou com uma vantagem de dez pontos percentuais, mas o verdadeiro resultado final pode ter mais consequências para o Reino Unido do que se esperava: o primeiro-ministro escocês, Alex Salmond, já avisou que vai cobrar as promessas de maior autonomia feitas por Londres e o chefe do Governo britânico, David Cameron, respondeu com uma proposta de reforma constitucional que também prevê um reforço dos poderes dos deputados ingleses.

As sondagens das últimas semanas indicavam um resultado mais renhido, mas as empresas de estudos de opinião tinham avisado que os cálculos podiam bater muito ao lado, o que acabou por acontecer.

O "não" recolheu 55,3% dos votos e o "sim" 44,7%, depois de várias sondagens terem apontado para um empate técnico. Traduzido em número de eleitores, dois milhões de escoceses deixaram bem claro que preferem continuar a fazer parte do Reino Unido, mais 400 mil do que os defensores da independência.

O "sim" até ganhou com votações expressivas em grandes regiões, como Glasgow e Dundee, mas na grande maioria do território os escoceses votaram preferencialmente a favor da manutenção no Reino Unido.

Em Edimburgo, o "não" registou 61,1% dos votos, sendo este um dos dez círculos em que a rejeição da independência ficou acima da barreira dos 60% – nas ilhas Orkney o “não” obteve 67,2% e nas Shetland 63,7%.

Além de Glasgow, o "sim" venceu em West Dunbartonshire (54%), Dundee (57%) e North Lanarkshire (51%).

A afluência às urnas foi histórica, algo que já não se via numa votação desde a década de 1950 – 84,59% dos eleitores responderam à chamada.

É um resultado que pode ser aproveitado por ambas as partes para reclamar um prémio – maior para Londres, porque o resultado foi mais expressivo do que faziam prever as sondagens mais recentes, e um prémio de consolação bastante generoso para os independentistas, porque foi este referendo que lhes abriu as portas a uma autonomia mais alargada.

Estes dois sentimentos ficaram bem patentes nos discursos do primeiro-ministro escocês, Alex Salmond, e do chefe do Governo do Reino Unido, David Cameron.

Salmond aceitou a derrota, mas incluiu duas palavras no seu discurso que têm como objectivo continuar a deixar Londres em sentido – sim, os escoceses decidiram permanecer no Reino Unido, mas apenas "nesta fase".

"É importante dizer que o nosso referendo foi um processo consentido e acordado e que a Escócia decidiu por maioria não se tornar, nesta fase, num país independente", disse Salmond. "Aceito o veredicto do povo e apelo a todos na Escócia a fazerem o mesmo e a aceitarem o veredicto democrático do povo da Escócia."

O líder da campanha pelo “sim” agradeceu às pessoas que o acompanharam no sentido de voto e sublinhou que ter "1,6 milhões de pessoas" (1.617.989, segundo os números oficiais) a pedir a saída do Reino Unido "é uma votação substancial pela independência da Escócia".

"Uma afluência de 86% é uma das mais elevadas de sempre no mundo democrático em qualquer eleição ou referendo. Foi um triunfo para o processo democrático e para a participação na política", frisou Alex Salmond.

Mas a aceitação da derrota fez-se acompanhar por um aviso de que o cumprimento das promessas de Londres vai ser exigido e não só pelos que votaram a favor da independência.

"Os partidos unionistas prometeram devolver mais poderes à Escócia, nos derradeiros momentos da campanha. A Escócia espera que essas promessas sejam honradas rapidamente", declarou o primeiro-ministro escocês.

No dia 9 de Setembro, numa tentativa de garantir a vitória do "não" no referendo, os líderes dos três partidos unionistas – David Cameron (conservadores), Ed Miliband (trabalhistas) e Nick Clegg (democratas liberais) – prometeram apoiar um plano para a devolução de poderes à Escócia traçado pelo antigo primeiro-ministro britânico Gordon Brown.

David Cameron, que jogava grande parte do seu futuro político neste referendo, acabou por conseguir manter-se à tona e lançou um contra-ataque que serve também para aplacar a fúria de muitos dos seus colegas de partido contra as promessas de devolução de poderes à Escócia.

"Ouvimos a voz da Escócia, e agora as milhões de vozes da Inglaterra também devem ser ouvidas", disse o primeiro-ministro britânico, na reacção aos resultados do referendo.

Cameron assumiu ir cumprir as promessas feitas nos últimos dias da campanha na Escócia, mas elevou a parada, comprometendo-se com uma "revolução de devoluções" em todo o Reino Unido, como escreve o jornal The Guardian.

"Algumas das declarações de Cameron deixaram claro que dar mais poderes à Escócia depende não apenas das próximas eleições, mas também de um acordo constitucional mais abrangente que inclua a exclusão dos deputados escoceses de votarem em assuntos que apenas dizem respeito à Inglaterra", escreveu no The Guardian o jornalista Patrick Wintour.

"O primeiro-ministro também prometeu introduzir reformas de apoio ao soundbite 'Votos ingleses para lei inglesas'. Foi uma promessa feita no último manifesto dos conservadores. Foi e é muito popular em Inglaterra. Mas há uma razão para ainda não ter sido aprovada", explica o editor de Política da BBC, Nick Robinson.

"Pode criar duas classes de deputados. Pode significar que um governo tenha uma maioria para aprovar determinadas leis, mas não outras (se, por exemplo, o próximo Governo trabalhista não tiver uma maioria de deputados em Inglaterra). Aquela que é conhecida como 'a pergunta de West Lothian' não tem obtido resposta desde que foi feita pela primeira vez, em 1997", escreve Nick Robinson.

Essa pergunta – por que razão o deputado de Blackburn em Westh Lothian, na Escócia, pode votar em assuntos ingleses, quando o deputado de Blackburn em Lancanshire, em Inglaterra, não pode votar em assuntos escoceses – foi agora reaberta por David Cameron.

A Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte têm os seus próprios parlamentos autonómicos, mas Inglaterra não. E foi mesmo isso que o líder do partido antieuropeu UKIP, Nigel Farage, já veio exigir: "Um parlamento inglês."

É por isso que o jornalista da BBC escreve que o referendo na Escócia pode ter encerrado um debate na Escócia, "por agora", mas acabou por "reacender a explosiva questão sobre onde reside o poder no Reino Unido".

Haverá um acordo em Novembro e um projecto de legislação em Janeiro, disse o primeiro-ministro. Mas sublinhou que a Inglaterra também precisa de uma "solução justa".

Nicholas Watt, do jornal The Guardian, diz que "a rejeição da independência significa que Cameron sobrevive".

"Mas agora tem de manobrar num campo cheio de minas, para garantir que os nacionalistas escoceses do SNP não encontram argumentos para apelar a um novo referendo e garantir ao seu próprio partido que os planos para devolver mais poderes ao Parlamento escocês não deixarão os deputados ingleses em desvantagem."

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