Parlamento grego aprova terceiro resgate, mas Tsipras está mais frágil

Primeiro-ministro pode ser forçado a apresentar moção de confiança. Terceiro programa de resgate à Grécia garantido com os votos da oposição.

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Euclides Tsakalotos, ministro das Finanças grego, prepara-se para falar no Parlamento de Atenas Louisa Gouliamaki/AFP

O Parlamento grego aprovou nesta sexta-feira por maioria o terceiro programa de resgate para o país em cinco anos, no valor de 85,5 mil milhões de euros, com 43 votos contra de deputados rebeldes do Syriza, ou cerca de um terço da principal força no Governo. O primeiro-ministro, Alexis Tsipras, poderá avançar com uma moção de confiança, como forma de forçar a união do partido

A confirmar-se a moção de confiança, esta poderia ser votada depois de 20 de Agosto, a data em que o país tem de fazer um pagamento de 3200 milhões de euros ao Banco Central Europeu. Seria uma forma de fazer com que os deputados rebeldes do Syriza mostrassem se estão dispostos a fazer cair ou o Governo de Tspiras, e a convocar eleições antecipadas, ou a apoiá-lo, mesmo que tome medidas com que não estão de acordo. Isto porque o número de deputados da coligação governamental que votaram para aprovar o resgate nesta sexta-feira ficou abaixo dos 120, o mínimo necessário para garantir uma maioria no Parlamento de 300 deputados.

O documento aprovado contém 57 medidas e 40 projectos-lei que incluem privatizações e reformas substanciais nas áreas da saúde, segurança social, pensões e sistema fiscal. O produto de duas semanas de negociações em Atenas entre o Governo de Alexis Tsipras e instituições credoras, que agora deve ser aprovado pelos ministros do Eurogrupo, para que o dinheiro seja desbloqueado e entregue à Grécia.

A votação final aconteceu apenas esta manhã e ao fim de um debate que se prolongou pela noite dentro. A aprovação do documento não estava em risco, uma vez que a oposição já tinha prometido votar favoravelmente, mas o voto tardio representou um novo teste às divisões internas no Syriza e poderá mesmo ser a última gota para se consumar a fractura entre os deputados que apoiam o Governo e os que se opõem por este ter cedido às exigências dos credores.

Estas divisões atingiram um novo patamar nesta quinta-feira. Um grupo de 12 membros do Syriza, entre eles o crítico ex-ministro da Energia, Panagiotis Lafazanis, anunciou a criação de um “movimento unido" contra o novo programa que “mobilizará pessoas em todos os cantos do país”. “A luta contra o novo programa de resgate começa hoje”, anunciam.

A resposta do Governo deu novos sinais de que as fracturas no Syriza podem em breve levar a um cenário de eleições antecipadas na Grécia – Tsipras convocou um congresso do partido para depois do Verão. “Há duas perspectivas diferentes que estão a criar desarmonia”, disse a porta-voz do Governo, Olga Gerovasili. “É possível que no futuro se possam accionar mecanismos que procurem um novo mandato do povo.”

Tsipras quer levar o programa aprovado para a reunião do Eurogrupo desta sexta-feira. Um “sim” dos ministros das Finanças do euro dá tempo a Atenas de receber a primeira tranche do novo empréstimo e reembolsar os 3200 milhões de euros ao Banco Central Europeu (BCE) que vencem a 20 de Agosto. Isto se o Bundestag e os Parlamentos dos restantes credores europeus aprovarem o programa – a Finlândia, um dos países mais críticos do Governo grego, fê-lo nesta quinta-feira.

“Sérias preocupações”
Prosseguiam as discussões no Parlamento grego quando, ao início da tarde de ontem, foi divulgado o estudo dos credores à sustentabilidade da dívida grega – Reuters e Wall Street Journal tiveram acesso ao documento. Conclusão: as mesmas instituições europeias que negociaram o programa de assistência com Atenas escrevem que há “sérias preocupações” quanto à sustentabilidade da dívida.

Os credores europeus concordam com o que escreveu o Fundo Monetário Internacional (FMI) em Julho. A dívida pública de Atenas atingirá os 201% do PIB em 2016 e, mesmo que o Governo cumpra as metas do programa, ela ainda estará pelos 160% do PIB em 2022. O Eurogrupo, por sua vez, estima que a dívida seja já sustentável nesse ano, abaixo dos 110% do PIB.

O texto revelado nesta quinta-feira sugere que não é necessário um corte nominal à dívida, algo que Tsipras reivindica há meses mas que a Alemanha rejeita. Em contrapartida, o documento sugere a “combinação certa de extensão de maturidades e períodos de graça aos pagamentos e juros” – o que é melhor encarado pela Alemanha. Não são apresentados valores para estas medidas, mas, em Julho, o FMI dizia que se os credores não quisessem aceitar um corte na dívida grega, estes teriam de permitir que Atenas não pagasse empréstimos pelo menos durante 30 anos.

Este estudo foi divulgado por volta da mesma altura em que surgiam os dados da economia grega para o segundo trimestre deste ano: o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 0,8% entre Abril e Junho e não caiu os 0,5% que os analistas esperavam. Esta surpresa põe em causa as estimativas dos credores, incluídas no novo programa de resgate, e que dizem que a economia grega cairá entre 2,1 e 2,3% em 2015.

No interior do Parlamento grego, o ex-ministro das Finanças grego, Yanis Varoufakis, aludiu ao tema da dívida. “O acordo não é sustentável”, começou por dizer o ex-ministro. “Reestrutura-se a dívida para que se façam menos empréstimos e depois seguem-se as medidas. Aqui temos o oposto.” No exterior, o analista grego Yannis Koutsomitis, crítico do Governo Syriza, escrevia no Twitter que “os deputados vão votar um empréstimo de 86 mil milhões de euros sem terem visto a análise à sustentabilidade da dívida” divulgada durante a tarde.

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