Detido espião alemão suspeito de trabalhar para os EUA

Trabalhador dos serviços de informação externa terá agido por motivos financeiros, diz imprensa alemã. Caso pode aprofundar crise política.

Foto
Antiga base da agência norte-americana NSA perto de Munique, Sul da Alemanha Christof Stache/AFP

Pior era difícil: pouco depois de os alemães ficarem chocados com as revelações de espionagem da agência norte-americana NSA sobre cidadãos alemães e com a notícia de que até o telemóvel da chanceler, Angela Merkel, foi alvo de escutas, vem ao lume a suspeita de que um funcionário dos serviços de informação externa da Alemanha vendeu informação confidencial aos EUA. Mais: parte da informação era relativa a uma comissão parlamentar que investiga justamente as escutas da NSA na Alemanha.

O alemão de 31 anos foi detido por suspeitas de espionagem. Seria um técnico de apoio do BND, sigla da agência de espionagem alemã. Segundo a imprensa local, terá agido por motivos financeiros, tendo oferecido serviços a russos mas trabalhado com americanos. Segundo o tablóide Bild, o homem encontrou-se com agentes norte-americanos na Áustria pelo menos três vezes entre 2012 e 2014. Por centenas de documentos secretos (em sua casa foram encontrados 218 numa drive externa) terá recebido 25 mil euros, diz ainda o Bild.

Duas comissões parlamentares investigam temas relacionados com as escutas da NSA – uma o alcance da espionagem dos EUA na Alemanha, e outra uma eventual ajuda dos próprios serviços secretos alemães nas suas actividades em relação aos cidadãos comuns.

Em paralelo, a justiça alemã abriu em Junho um processo contra pessoas desconhecidas pela actividade de escutas à chanceler pela NSA, citando provas existentes suficientes, deixando, no entanto, para já de lado outra sobre escutas aos alemães em geral.

 “A questão é grave, não há dúvidas”, disse o porta-voz de Angela Merkel, referindo-se ao funcionário do BND detido. O embaixador norte-americano em Berlim foi chamado ao Ministério dos Negócios Estrangeiros e convidado a explicar “rapidamente” a questão.

Num comentário no Süddeutsche Zeitung, o editor de Internacional Stefan Kornelius diz que, a serem verdade estas alegações, “não há palavras para descrever a crise política que se seguirá”.

“A suspeita de actividade de espionagem concreta contra a comissão de investigação do Parlamento é grave e tem de se lidar com ela como com um crime grave”, reagiu Konstantin von Notz, membro da comissão e do partido os Verdes.

A tensão sobre as questões de espionagem já era grande, e a Alemanha vinha a pressionar os EUA para assinar um “acordo de não espionagem”, o que os EUA recusam, argumentando que não o têm nem com o seu aliado especial, o Reino Unido.

Responsáveis sublinham que ainda não se sabe se o espião vendeu mesmo informação aos EUA, apenas aos EUA ou também a outros países, como a Rússia – o que terá chamado a atenção para ele teria sido o contacto com agentes russos. Mas as suspeitas foram suficientemente fortes para que a chanceler fosse informada, assim como os nove membros da comissão parlamentar às escutas da NSA.

Merkel tem seguido uma linha suave de resposta às alegações sobre a espionagem dos EUA, que é um tema muito sensível na Alemanha por causa de anteriores abusos de regimes como o nazi ou o da Alemanha de Leste. Ainda assim, quando se tratou do seu próprio telefone, a reacção de Berlim subiu de tom.

A chanceler é vista como muito próxima dos EUA em algumas questões – o público alemão considera que é demasiado próxima em algumas matérias. Muitos alemães têm reservas, por exemplo, em relação às sanções à Rússia e à posição em relação à Ucrânia, muito semelhante à dos Estados Unidos, e ainda mais sobre o acordo transatlântico de comércio livre.

Sugerir correcção
Comentar