Dany le rouge abandona o Parlamento Europeu com uma última defesa emocionada da Europa federal

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Daniel Cohn-Bendit esteve 20 anos no Parlamento Europeu FREDERICK FLORIN/AFP

O eurodeputado Daniel Cohn-Bendit – Dany le rouge– está longe de ser o único que vai abandonar o Parlamento Europeu (PE) na actual legislatura, que termina esta semana, mas será seguramente aquele que mais falta fará nos próximos cinco anos.

Depois de quatro mandatos durante 20 anos no PE, o eurodeputado franco-alemão – filho de judeus alemães mas que passou grande parte da vida em França, tendo aliás sido candidato pelos partidos ecologistas dos dois países de forma alternada – decidiu que não se recandidatará nas próximas eleições europeias de 22 a 25 de Maio.

A idade – 69 anos – um recente cancro na tiróide e um grande cansaço físico, foram as razões invocadas para justificar uma decisão que é lamentada tanto pelos aliados como pelos adversários.

“Vai fazer falta ao PE na próxima legislatura”, disse-lhe Martin Schulz, presidente do PE, do alto da sua tribuna no final da última intervenção de Dany na sessão plenária do PE, em Estrasburgo. Todos os líderes dos principais grupos parlamentares exprimiram a mesma simpatia e tristeza pela partida de uma figura mítica do PE, orador ímpar que sempre exprimiu as suas convicções com uma rara energia e uma emoção assumida sem pudor.

Baptizado Dany le rouge desde que liderou a revolta estudantil de Maio de 1968 em França – por causa da cor política e do cabelo ruivo – o ainda eurodeputado abraçou nas últimas décadas as causas ecologista e da construção de uma Europa federal, a que dedicou toda a sua energia.

Assumindo-se como uma espécie de “despertador de consciências” no PE, Dany era o único deputado capaz de, sem papas na língua, chamar as coisas pelos nomes, não hesitando por exemplo em acusar de “hipócritas” em pleno debate os parceiros vira-casacas ou chamar “cretinos” aos eleitos da extrema-direita. Provocador inveterado, nunca perdeu a oportunidade de “picar” os responsáveis europeus que discursaram no PE, de Durão Barroso a Tony Blair (ex-primeiro ministro britânico), sempre que os apanhou em contradição com o interesse europeu.

A austeridade imposta à Grécia em troca de ajuda externa motivou um dos seus discursos mais violentos contra os Governos da UE, que considerou “completamente loucos” e “hipócritas” com as exigências de redução brutal das despesas públicas e aumentos de impostos feitos a Atenas, acusando-os mesmo de estarem “a fazer dinheiro à conta da Grécia” com os seus empréstimos.

Na sua última intervenção no PE, durante um debate desta quarta-feira dedicado à invocação do centenário da Primeira Guerra Mundial, Cohn-Bendit, muito comovido, reiterou um vibrante apelo à construção de uma Europa federal enquanto única garantia de “futuro do bem estar social” e de “uma Europa em que os cidadãos poderão viver bem, e em paz”.

Segundo disse, foi o fim dos Estados “hegemónicos” – responsáveis pelas duas guerras mundiais do século XX – que permitiu a emergência da Europa “como a conhecemos hoje”. “O nacionalismo não é apenas a guerra, é o egoísmo. O hegemonismo é o egoísmo. E se temos uma crise política hoje na Europa, é talvez porque há tendências hegemónicas na Europa”, avisou, frisando: “Se continuarmos assim, destruiremos tudo o que construímos”.

Para o ex-revolucionário de 1968, os europeístas têm de ser “felizes” a defender e a impulsionar a ideia europeia.

“O que me preocupa é que os europeus tenham medo de lutar e que se sintam desarmados face às ideologias dos eurocépticos de direita e de esquerda”, lamentou, lançando um apelo. “Não tenham medo de enfrentar as estupidezes que a extrema-direita e a extrema-esquerda dizem quando falam da Europa, enfrentem-nos com determinação”.

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