Cuba joga os seus trunfos na cimeira da Comunidade de Estados Latino-Americanos e do Caribe

Brasil quer “converter-se no principal sócio de Cuba”, ocupando o lugar preferencial antes ocupado pela Venezuela.

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Presidentes de Cuba e do Brasil inauguraram a primeira fase do novo terminal de Mariel AFP PHOTO/www.cubadebate.cu

Foi um arranque “informal” antes do início dos trabalhos da cimeira da Comunidade de Estados Latino-Americanos e do Caribe, em Cuba: o Presidente Raúl Castro, e a sua congénere brasileira, Dilma Rousseff, cortaram a fita de um novo terminal de contentores na Zona Especial de Desenvolvimento de Mariel, numa cerimónia presenciada também pelos restantes líderes da região presentes em Havana.

Idealizada por Hugo Chávez e criada em 2011, a Comunidade de Estados Latino-Americanos e do Caribe (CELAC) agrega quase todos os Estados do continente, excepto os Estados Unidos e o Canadá. Nesta segunda cimeira da sua existência, participam 33 países, que discutirão uma série de questões ligadas à integração regional – além de uma “declaração de Havana”, o encontro deverá produzir comunicações separadas de apoio ao processo negocial entre o Governo da Colômbia e os rebeldes das FARC, e uma outra em que os líderes manifestam o seu desejo de reconhecer a América Latina como uma “zona de paz”.

Mais do que pelos documentos que serão assinados, a cimeira em Cuba é importante pelas mudanças que projecta no xadrez diplomático regional – por exemplo, o investimento político e económico do Brasil em Cuba é um sinal do interesse em “posicionar-se [no país] no momento em que se começa a pôr fim ao bloqueio económico”, como confessou o antigo ministro do Desenvolvimento do Governo de Lula da Silva. Dilma Rousseff confirmou que o Brasil quer “converter-se no principal sócio de Cuba”, ocupando o lugar preferencial antes ocupado pela Venezuela.

Igualmente significativa é a presença do Presidente mexicano, Enrique Peña Nieto, em Havana: as relações entre os dois países congelaram durante os mandatos de Vicente Fox e Felipe Calderón, mas o Governo de Peña Nieto parece interessado em recuperar a sua relação privilegiada com Cuba (a nova abertura mexicana ficou patente com o perdão de 70% da dívida cubana, em Novembro passado).

E como destacava o correspondente do El País em Havana, o facto político mais relevante da cimeira será a legitimação internacional do regime cubano e a consolidação do país como “actor principal” no espaço regional. “A foto de família, com mais de 30 chefes de Estado do continente, poderá ser esgrimida pelo Governo de Raúl Castro como um importante trunfo diplomático, resultado de uma política externa mais realista”, escrevia o diário espanhol.

As obras do novo porto de Mariel, a cerca de 50 quilómetros de Havana, são “o projecto económico mais ambicioso empreendido nos últimos 50 anos na ilha”, como notava a BBC, e um elemento fundamental do plano de reformas económicas promovido por Raúl Castro. O objectivo é converter a Zona Especial de Desenvolvimento de Mariel numa zona franca: uma espécie de “Hong Kong cubano”, com um parque tecnológico, comercial e de serviços, e um regime legislativo especial e regulamentos laborais diferentes dos que vigoram em Cuba, de forma a atrair investimento estrangeiro.

A nova infra-estrutura – uma complexa obra de engenharia, que resultou de uma colaboração entre os governos cubano e brasileiro – está dotada para receber embarcações de grande porte e calado de 18 metros, com capacidade até 200 mil toneladas. Segundo as projecções, o terminal pode movimentar mais de 800 mil contentores por ano. Será administrado por uma empresa sedeada em Singapura. “Uma das melhores operadoras portuárias mundiais”, garantiu Raul Castro.

Mas a cerimónia no porto de Mariel não foi a única a desviar as atenções dos jornalistas que cobriam a cimeira da CELAC, e que acompanharam os encontros mantidos pelos diversos líderes estrangeiros com o ex-Presidente Fidel Castro. O líder histórico da revolução cubana, que está afastado do poder desde 2006, recebeu (separadamente) as presidentes do Brasil e da Argentina. Dilma Rousseff agradeceu a participação de médicos cubanos no novo programa brasileiro para a expansão da cobertura da rede de cuidados de saúde no seu país; Cristina Kirchner pronunciou-se sobre as “pressões especulativas sobre o câmbio dos países emergentes” e as “manobras dos bancos, com a cumplicidade de grupos económicos, exportadores e importadores”.
 
 

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