Compostela: todas as alternativas de traçado incluíam curva onde descarrilou o comboio

Polícia espanhola concluiu análise aos restos do comboio acidentado na Galiza a 24 de Julho. Responsáveis da rede ferroviária foram ouvidos esta manhã.

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Acidente provocou 79 mortos e 150 feridos Adriano Miranda

O presidente da empresa gestora de infraestruturas ferroviárias de Espanha (Adif), Gonzalo Ferre, disse nesta quinta-feira que todas as alternativas de traçado da linha férrea Ourense-Santiago incluíam a curva apertada de Angrois, nos arredores de Santiago de Compostela, onde um comboio descarrilou a 24 de Julho causando 79 mortos e 150 feridos.

“A linha Ourense-Santiago está incluída na planificação estratégica desde o ano 2000. O estudo informativo estabelecia cinco alternativas para o traçado da linha que apresentavam a mesma solução técnica. Todas incluíam a curva”, afirmou o responsável, que esteve a ser ouvido na manhã desta quinta-feira no Congresso de Deputados, que começou com um minuto de silêncio pelas vítimas. 

Segundo Ferre, diversos organismos foram consultados sobre as várias alternativas. “Recebemos mais de 300 alegações, nenhuma fazia referência a esse ponto do traçado [de Santiago de Compostela]”, afirmou.

Além de Gonzalo Ferre, também Julio Gómez-Pomar, presidente da Renfe (rede ferroviária espanhola) foi chamado a prestar esclarecimentos. As intervenções ocorrem no mesmo dia em que a Polícia Nacional espanhola deu por concluída a investigação e análise aos restos do comboio. Na sexta-feira é a vez da ministra da tutela, Ana Pastor, ser ouvida na Comissão de Fomento.

Segundo o jornal El País, os responsáveis ferroviários começaram por lamentar o acidente e endereçar as condolências às famílias das vítimas, agradecendo o apoio dado pelas instituições e pelos cidadãos logo após o acidente.

"Desejo que se conheça toda a verdade sobre o que aconteceu e que isso possa ajudar a tomar todas as medidas para que um acidente como este não possa acontecer no futuro", afirmou Ferre, destacando os "elevados parâmetros" de segurança da rede ferroviária espanhola. Depois falou das características da linha férrea e descreveu todo o processo de construção, para depois esclarecer o funcionamento do sistema de segurança instalado na via.

Sistema não alertou maquinista
“O Sistema Europeu de Gestão de Tráfego Ferroviário (ERTMS, na sigla em inglês) oferece ao maquinista a informação proporcionada pelos sinais, uma vez que com a velocidade que a máquina leva o olho humano não consegue distingui-los”, explicou, acrescentando que o sistema indica ao maquinista a velocidade a que deve circular a cada momento. “Em Espanha temos instalados 1964 quilómetros com o sistema ERTMS, sendo o país da Europa com mais quilómetros instalados com este [sistema de] segurança”, sublinhou.

Mas durante a obra houve uma alteração ao projecto inicial para adaptar a bitola (largura da via) para a medida convencional. “Os responsáveis da Adif decidiram montar a bitola entre Ourense e Santiago de forma convencional para depois a transformar” numa bitola de alta velocidade. Uma solução “transcendental”, segundo Ferre, que admitiu que a decisão afectou a sinalização e os sistemas de segurança, obrigando a descartar o sistema ERTMS.

Segundo explicou, a transição do sistema ERTMS para o ASFA (Aviso de Sinais e Freado Automático) ocorre quatro quilómetros antes do local do acidente. Este sistema, que está instalado em 13.300 quilómetros da rede, permite velocidades até 200 quilómetros por hora e informa o maquinista sobre o que vai encontrar na linha. “Se a via estiver ocupada o sistema alerta o maquinista e se ele seguir o comboio abranda”, disse.

A aproximação à curva de Angrois deve ser feita a um máximo de 80 quilómetros por hora mas o comboio viajava a 179 quilómetros por hora. Porém, o sistema não alertou o maquinista para a velocidade excessiva porque tecnicamente isso só acontece automaticamente se o comboio seguir a mais de 200 quilómetros por hora ou se for detectado algum obstáculo, explicou o responsável da Adif.

Ferre garantiu que depois do acidente foram tomadas todas as medidas de segurança na via, onde foram colocadas balizas que limitam a velocidade a 30 quilómetros por hora naquele local. “Revimos toda a segurança”, afirmou. Também a Renfe está a rever os procedimentos de comunicação entre a locomotiva e os centros de gestão, pessoal de bordo e outras comunicações, tendo admitido que os sistemas de segurança podem ser melhorados.

Na sua intervenção, Gómez-Pomar descreveu os protocolos que foram sendo activados desde que se deu o trágico acidente, sublinhando que até ao descarrilamento o maquinista Francisco José Garzón não comunicou qualquer anormalidade aos centros de gestão da Renfe.

Notícia corrigida às 15h24: corrige designação da bitola utilizada na linha onde ocorreu o acidente

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