NATO reforça apoio à Ucrânia à espera de uma possível trégua

Estados Unidos e União Europeia reforçam apoio à Ucrânia, mas o Presidente ucraniano acredita que será possível decretar um cessar-fogo nesta sexta-feira.

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O Presidente da Ucrânia (à esq.) conversa com Barack Obama e David Cameron ALAIN JOCARD/AFP

O arranque da cimeira da NATO no País de Gales ficou marcado por uma ténue esperança de que os combates no Leste da Ucrânia conheçam a partir desta sexta-feira a primeira paragem, se não definitiva, pelo menos de longa duração.

Essa esperança não surgiu reflectida nos discursos dos principais intervenientes, excepção feita ao Presidente da Ucrânia, Petro Poroshenko, que tentou tudo para manter na agenda a importante reunião de sexta-feira com os representantes russos em Minsk, na Bielorrússia, que vão negociar sob o olhar atento da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa.

Nem o secretário-geral da NATO, Anders Fogh Rasmussen, nem os principais chefes de Estado e de Governo quiseram dar muito crédito ao plano de paz discutido entre Poroshenko e Vladimir Putin na quarta-feira, talvez por acreditarem que a intenção do Kremlin seria esvaziar a cimeira da Aliança Atlântica e congelar o anúncio de novas sanções por parte dos Estados Unidos e da União Europeia.

A dureza das palavras não foi propriamente uma novidade, mas é sempre possível chegar um pouco mais longe. Rasmussen, por exemplo, afirmou que a Rússia está “a atacar” a Ucrânia, uma expressão que ainda não tinha sido utilizada para descrever o envolvimento russo no conflito no Leste da Ucrânia, que Moscovo sempre negou.

“Estamos perante uma mudança dramática do clima de segurança. A Leste, a Rússia está a atacar a Ucrânia”, acusou o secretário-geral da NATO.

Quanto ao plano de paz discutido numa conversa telefónica entre os presidentes da Ucrânia e da Rússia na quarta-feira, Anders Fogh Rasmussen disse que “o que conta é o que está a acontecer no terreno”.

“Continuamos a testemunhar, infelizmente, o envolvimento russo na desestabilização da situação no Leste da Ucrânia. Por isso, continuamos a apelar à Rússia que retire as suas tropas das fronteiras ucranianas, que trave o envio de armas e de combatentes para a Ucrânia, que deixe de apoiar os militantes armados, e que inicie um processo político construtivo”, acrescentou o secretário-geral da NATO.

Também o Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, e o primeiro-ministro britânico, David Cameron, quiseram deixar bem claro o apoio da organização à Ucrânia, numa cimeira que descreveram como “tão vital para o futuro como foi no passado”.

“A Rússia rasgou as regras com a anexação autodeclarada da Crimeia e com as suas tropas em território ucraniano, minando a soberania de um Estado”, escreveram Obama e Cameron num texto assinado em conjunto.

Mas as palavras dos dois líderes foram para além do conflito na Ucrânia, virando-se para o tema dos gastos no sector da Defesa, a que muitos países europeus têm tentado fugir devido à crise económica.

“O Reino Unido e os Estados Unidos são dois de apenas quatro membros da NATO que cumprem o objectivo de gastar 2% do seu Produto Interno Bruto em Defesa, e outros Estados devem urgentemente aumentar os seus esforços para chegarem ao mesmo nível. Isso enviaria uma mensagem poderosa aos que põem em causa que a nossa determinação colectiva está mais forte do que nunca”, defendem Barack Obama e David Cameron.

Os dois líderes reforçaram a ideia que a NATO não irá ficar de braços cruzados se a segurança de algum dos seus membros for posta em causa, numa clara referência aos receios de países como a Polónia, a Estónia e a Lituânia de um eventual alastramento da guerra na Ucrânia aos seus territórios.

“Temos de usar a nossa capacidade militar para assegurar uma presença persistente na Europa de Leste, para tranquilizar os membros da NATO e deixar claro à Rússia de que cumpriremos sempre o Artigo 5 sobre defesa colectiva”, frisaram o Presidente norte-americano e o primeiro-ministro britânico.

Antes das primeiras declarações dos líderes da NATO, o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, avisou que o eventual apoio à entrada da Ucrânia na Aliança Atlântica põe em causa as negociações com vista ao fim dos combates no Leste do país.

Apesar de apenas repetirem a posição já conhecida de Moscovo, as declarações de Lavrov surgem num momento crucial – no primeiro dia da cimeira da NATO; um dia depois de o Presidente russo ter anunciado as suas condições para a paz no Leste da Ucrânia; e na véspera da segunda ronda de conversações em Minsk, na Bielorrússia, em que Putin e o Presidente ucraniano, Petro Poroshenko, dizem depositar muitas esperanças.

No final de uma reunião com o secretário-geral do Conselho da Europa, Thorbjorn Jagland, o ministro russo acusou vários países, em particular os Estados Unidos, de incitarem as autoridades de Kiev a pedirem a adesão à NATO, algo que pode "fazer descarrilar todos os esforços".

"É preciso travar estas tentativas. Deixem de provocar aproximações deste tipo a partir do exterior, e trabalhem em conjunto com o objectivo de garantir a unidade nacional da Ucrânia", disse Sergei Lavrov.

A mensagem de Moscovo ganha uma nova dimensão depois de o primeiro-ministro interino e demissionário da Ucrânia, Arseni Iatseniuk, ter pedido ao Parlamento que deixe cair a política de não alinhamento em relação à Aliança Atlântica.

A eventual adesão da Ucrânia à NATO foi contemplada na cimeira de 2008, em Bucareste, mas o antigo Presidente Viktor Ianukovich suspendeu o processo quando foi eleito, em 2010, com o argumento de que a integração não recolhia o apoio da maioria dos ucranianos. Na semana passada, o actual primeiro-ministro deu o primeiro passo para voltar a pôr a Ucrânia a caminho da NATO – depois de o Parlamento revogar a política de não-alinhamento, o país pretende formalizar o pedido de adesão.

O secretário-geral da NATO e o Presidente dos Estados Unidos deram um apoio indirecto à pretensão de Kiev, dizendo que a organização mantém as portas abertas a quem preencher os requisitos de adesão.

Apesar de todas as trocas de acusações, o Presidente ucraniano esforçou-se por passar a mensagem de que é preciso esperar para ver o que sai da reunião desta sexta-feira em Minsk.

“O elemento-chave do meu plano de paz é um cessar-fogo. Espero que seja implementado amanhã [sexta-feira]", escreveu Petro Poroshenko na rede social Twitter.

Do lado dos separatistas pró-russo surgiram declarações no mesmo sentido. O líder da autoproclamada República Popular de Donetsk, Andrei Purgin, admitiu decretar um cessar-fogo, mas frisou que é preciso esperar para ver. “Se houver um verdadeiro cessar-fogo da parte deles, então talvez também decretaremos um cessar-fogo”, disse Purgin.

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