Explosão de carro armadilhado ensombra celebrações do Governo grego

Atentado ocorreu na véspera da chegada a Atenas da chanceler alemã, Angela Merkel.

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Peritos inspeccionam os restos do automóvel calcinado Alkis Konstantinidis/Reuters

Um carro armadilhado explodiu antes de o sol nascer junto ao banco central da Grécia, no coração de Atenas. Não provocou vítimas, mas ensombrou o dia em que o Governo de Antonis Samaras queria apenas celebrar o regresso do país aos mercados financeiros – uma espécie de lembrete de que a anunciada retoma económica não cala a revolta dos gregos com a factura que lhe foi imposta para evitar a saída do euro. Angela Merkel, a chanceler alemã que personifica as políticas de austeridade, visita nesta sexta-feira a capital grega.

Uma hora antes da explosão, perto das 6h (4h em Portugal continental) desta quinta-feira, um telefonema para as redacções de um jornal e de um site de notícias alertava que havia “75 quilos de explosivos” num automóvel estacionado junto ao edifício sede do Banco da Grécia. A polícia evacuou a rua – a curta distância da Praça Sintagma e dos escritórios da troika em Atenas – e testemunhas contaram que pouco depois se ouviu uma forte detonação, que fez voar vidros e provocou estragos nas fachadas de vários prédios. A polícia revelou que o carro, do qual sobraram apenas restos calcinados, tinha sido roubado e recolheu imagens de videovigilância de lojas vizinhas para tentar identificar quem ali deixou os explosivos.

Atentados deste género, quase sempre sem provocar vítimas, tornaram-se mais comuns na Grécia desde o início da crise e invariavelmente as suspeitas recaem sobre pequenos grupos anarquistas ou da esquerda radical. O site Greek Reporter escreveu, no entanto, que a polícia investiga a possibilidade de no ataque terem estado envolvidos dois conhecidos operacionais do 17 de Novembro – o grupo armado marxista, responsável por mais de 20 mortes em ataques nas últimas décadas, foi desmembrado em 2002, mas um dos seus líderes fugiu em Janeiro da prisão onde cumpria pena perpétua.

Associando a explosão do carro armadilhado à primeira emissão de dívida pública, um porta-voz do Governo, que une os conservadores da Nova Democracia aos socialistas do Pasok, disse “ser claro que objectivo dos atacantes é tentar mudar a agenda” noticiosa. “Não vamos permitir que estes terroristas o consigam”, afirmou Simos Kedikoglou.

Mas o efeito mediático da acção estava garantido, tanto mais que acontece na véspera da chegada de Merkel a Atenas, para uma visita em que tentará reforçar a ideia de Samaras de que, depois de anos de sacrifícios, “um novo ciclo está a começar” para a economia grega.

Uma mensagem bem diferente da que deixou na visita em Outubro de 2010 (quando mais de 4000 polícias foram mobilizados para garantir a sua segurança) e que tem como pano de fundo as eleições europeias. Com os partidos eurocépticos e antieuropeus a antecipar fortes ganhos, a chanceler alemã quer usar os últimos dados da economia grega como uma prova de que a austeridade foi “a opção certa” para salvar a Grécia e o euro, como disse no fim-de-semana o seu ministro das Finanças, Wolfgang Schäuble.

O Syriza, partido da esquerda radical que mantém uma ligeira vantagem nas intenções de voto face à Nova Democracia, desafiou os gregos a manifestarem-se para mostrar a Merkel que a sua realidade é bem diferente da dos números apregoados – a taxa de desemprego está nos 27,5%, a mais alta da Europa, e o país perdeu um quarto do seu PIB desde 2008. A chanceler vem a Atenas “premiar o trabalho catastrófico do Governo e garantir que a austeridade continua”, acusou o principal partido da oposição.

Mas, após quatro anos de protestos, a resignação cresce e a fadiga instala-se. Quarta-feira, a primeira greve geral do ano – a 36.ª desde o início da crise, segundo cálculos da BBC – paralisou transportes, fechou escolas e reduziu ao mínimo os serviços nos hospitais contra os planos do Governo para despedir 11 mil funcionários públicos e colocar mais em regime de mobilidade. Mas as manifestações em Atenas e em Salónica não terão juntado mais de 20 mil pessoas, segundo cálculos da polícia, citada pela AFP. A revolta, no entanto, permanece a mesma. “O regresso aos mercados não passa de um conto de fadas, ninguém acredita nisso”, afirmou Dimitris P., motorista de autocarros. A realidade, acrescentou um reformado ao seu lado, "são o milhão e meio de desempregados".  
 

   


 

   





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