Vladimir Putin não vai conseguir livrar-se das Pussy Riot

Maria Alyokhina e Nadezhda Tolokonnikova mostraram uma atitude combativa depois de terem sido libertadas esta segunda-feira.

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“O mais difícil na prisão é ver como destroem as pessoas", disse Alyokhina NATALIA KOLESNIKOVA/AFP-Arquivo
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"Rússia sem Putin", foi o slogan de Nadezhda Tolokonnikova à saída da prisão Ilya Naymushin/Reuters

A lei de amnistia assinada pelo Presidente da Rússia Vladimir Putin para comemorar o 20º aniversário da Constituição, e que levou à libertação das duas activistas da banda punk Pussy Riot, condenadas a uma pena de dois anos de prisão por actos de “hooliganismo” numa igreja de Moscovo, foi denunciada pelas próprias como uma “profanidade”: uma “operação de relações públicas” destinada a acalmar a opinião pública internacional antes da realização dos Jogos Olímpicos de Inverno, em Sochi.

Por isso “se tivesse tido escolha, e pudesse recusar a amnistia, era o que tinha feito”, declarou Maria Alyokhina, a primeira das integrantes da formação punk a sair em liberdade depois de meses na prisão de Nizhny Novgorod, a quinta maior cidade russa onde nasceu o escritor Maximo Gorki. Horas depois, a sua “cúmplice”, Nadezhda Tolokonnikova, deixava o centro hospitalar penal siberiano onde permanecia após tentativas de greve da fome em protesto contra a detenção do grupo. “Viva a Rússia sem Putin”, gritou à imprensa, ao abandonar as instalações sem casaco, apesar de o termómetro marcar 25 graus negativos.

Três integrantes da banda Pussy Riot foram detidas em Moscovo em Agosto de 2012 e acusadas de “hooliganismo agravado por ódio religioso” por causa de um concerto realizado na catedral ortodoxa Cristo o Salvador da capital russa seis meses antes, no auge da campanha eleitoral: numa das canções, intitulada “Oração Punk”, as cantoras pediam à Virgem para “acabar com Putin”.

A amnistia, proposta pelo Kremlin e aprovada pelo parlamento russo na semana passada, abrange cerca de 20 mil prisioneiros, nomeadamente “mães de família” como Alyokhina e Tolokonnikova. A sua companheira, Yekaterina Samutsevich, já tinha saído em liberdade, com pena suspensa, na sequência de um recurso judicial apresentado em Outubro de 2012. A advogada da banda, Irina Khrunova, garantiu que um outro recurso que contesta a validade da acusação inicial, continuará a correr “até que se prove que as mulheres são completamente inocentes do crime por que foram sentenciadas”.

Dois dias antes da entrada em vigor da lei, Putin concedeu um outro indulto que permitiu a libertação do ex-oligarca do petróleo Mikhaïl Khodorkovski, um dos mais proeminentes dissidentes políticos russos que estava preso há uma década numa colónia penal russa próxima da fronteira com a Finlândia. Ao contrário das suas compatriotas, o antigo magnata preferiu não fazer ironia com a iniciativa presidencial, apesar de se ter recusado a “agradecer” o perdão – por razões humanitárias – concedido por Putin. Mas como as duas Pussy Riot, notou a coincidência de ter sido libertado nas vésperas da olimpíada de Sochi, e numa altura em que o Governo russo está debaixo de intensa pressão por causa do seu registo negativo em termos de direitos humanos.

“Isto não passa de uma cortina de fumo”, denunciou Nadezhda Tolokonnikova, acrescentando que a amnistia só foi aprovada para “evitar que os países europeus boicotassem os Jogos Olímpicos russos”. Distinguindo entre o seu caso mediático e o de “muitas outras pessoas que por não aparecerem nos jornais ficam esquecidas”, a activista lembrou que apesar da amnistia, ainda permaneciam detidos “muitos indivíduos que não fizeram nada que justifique a sua reclusão”.

Numa conferência de imprensa realizada em Berlim, para onde foi transportado após a saída da prisão, Khodorkovski foi cauteloso e até diplomático nas referências a Putin, que responsabilizou pessoalmente como o “mandante” da sua detenção – bem como (subentendeu) de todos os “inúmeros prisioneiros políticos que ainda ficaram para trás nas cadeias russas” e cuja causa prometeu promover no exílio.

Mudar as prisões para mudar a Rússia
As duas Pussy Riot também se associaram à luta pelos direitos humanos e a democracia, mas não tiveram os mesmos cuidados, e foram bem mais críticas e directas na sua avaliação de Putin. “Digamos que única coisa que ele conseguiu ao pô-las na cadeia foi aumentar a sua vontade, o seu desejo e a sua confiança de lutar contra o regime [de Putin] de uma forma ainda mais vigorosa”, resumiu o marido de Tolokonnikova à BBC.

“Pude ver como funciona esta pequena máquina totalitária a partir do seu interior: a colónia prisional opera exactamente da mesma maneira que o Governo. É por isso que é tão importante mudar as prisões, porque assim estaremos a mudar a Rússia”, declarou a jovem de 24 anos – que com as restantes companheiras de banda tenciona fundar um programa para ajudar e defender outras “mulheres inocentes que estão a ser transformadas em escravas nas prisões russas”.

Maria Alyokhina também encontrou um paralelismo entre o funcionamento do Governo e a gestão do sistema penitenciário do país. Explicando que foi transportada da prisão para a estação ferroviária de Nizhny Novgorod com o uniforme prisional vestido e sem ter direito a resgatar os seus pertences pessoais e despedir-se das outras reclusas, lamentou o “secretismo e a falta de informação e de transparência” que disse constituírem o “comportamento típico oficial”.
 

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