Câmara dos Comuns diz “sim” ao casamento gay e divide os conservadores

A proposta de lei do Governo de David Cameron foi recebida com forte oposição por metade dos deputados do seu partido.

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Está dado o primeiro passo para a aprovação do casamento entre pessoas do mesmo sexo Chris Helgren/Reuters

Foram quase sete horas de debate à boa maneira britânica, com discursos inflamados e trocas de acusações constantes. No fim, o primeiro-ministro, David Cameron, teve o que queria: a câmara baixa do Parlamento aprovou o casamento entre pessoas do mesmo sexo, em cerimónias civis ou religiosas, com 400 votos a favor e 175 contra. A medida deverá entrar em vigor em 2014, apenas em Inglaterra e no País de Gales.

A vontade de Cameron prevaleceu, mas a discussão na Câmara dos Comuns fez aquecer o sangue entre irmãos. A proposta foi aprovada com os votos da maioria dos deputados do Partido Trabalhista, na oposição, e dos Liberais Democratas, parceiros de coligação no Governo. Na discussão sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo, a verdadeira oposição do primeiro-ministro estava dentro de casa, na bancada do seu Partido Conservador.

Um dos mais acérrimos opositores da proposta do Governo foi o conservador Roger Cale, que repetiu um argumento que diz não defender, mas ao qual reconhece “méritos”, e que aponta para a legalização do incesto: “Se o Governo estiver mesmo empenhado nisto, então que acabe com a lei da união civil e crie uma lei que se aplique a todas as pessoas, independentemente da sua sexualidade e dos seus relacionamentos. Isso significa irmãos com irmãos, irmãs com irmãs e irmãos com irmãs. Isso sim, seria um avanço."

“Um passo em frente”
A defesa da proposta de lei coube à ministra da Cultura, Media e Desporto, Maria Miller, também responsável pela pasta das Mulheres e Igualdades. “O casamento é uma das nossas mais importantes instituições. Une as sociedades às famílias e é uma base fundamental para a promoção da estabilidade. Esta proposta defende e desenvolve o casamento”, afirmou a responsável no início da discussão da proposta de lei, um momento ao qual o primeiro-ministro faltou.

Mais tarde — pouco antes da votação —, David Cameron afirmou que o casamento entre pessoas do mesmo sexo constitui “um passo em frente” e vai tornar a sociedade britânica “mais forte”. “O dia de hoje é muito importante. Eu acredito no casamento. Ajuda as pessoas a dedicarem-se uma à outra e acho que os gays também devem poder casar-se”, declarou o primeiro-ministro conservador.

A proposta do Governo britânico não obriga as diferentes igrejas a celebrarem casamentos religiosos. Segundo o documento, as igrejas anglicanas de Inglaterra e do País de Gales não terão sequer de se pronunciar — está estabelecido que, por vontade das respectivas hierarquias, nenhuma celebrará casamentos entre pessoas do mesmo sexo.

As restantes igrejas — incluindo a Igreja Católica — têm liberdade para decidir se autorizam ou não casamentos religiosos. Católicos, muçulmanos e sikhs fizeram campanha pelo “não” e promoveram várias iniciativas e manifestações contra a proposta do Governo, mas os judeus liberais e reformistas apoiam o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

A lei aprovada pela Câmara dos Comuns britânica deixa de fora a Irlanda do Norte e a Escócia. Na Irlanda do Norte não há qualquer iniciativa para promover o debate, mas o governo escocês já manifestou a intenção de trabalhar numa lei semelhante. O líder do executivo, Alex Salmond, já fez saber que qualquer lei que autorize o casamento entre pessoas do mesmo sexo na Escócia também deixará ao critério das várias igrejas a celebração de matrimónios.

A votação desta terça-feira na Câmara dos Comuns aconteceu apenas três dias depois de a Assembleia Nacional de França ter aprovado o primeiro e mais importante artigo de uma proposta de lei semelhante: “O casamento é contraído por duas pessoas de sexo diferente ou do mesmo sexo”.

Com todos os indicadores a apontarem para a aprovação das duas propostas, França e Reino Unido (com excepção da Irlanda do Norte e da Escócia) deverão juntar-se à lista de países e territórios que já consagraram na sua legislação a celebração do casamento entre pessoas do mesmo sexo:

Holanda (2001)
Bélgica (2003)
Espanha (2005)
Canadá (2005)
África do Sul (2006)
Noruega (2009)
Suécia (2009)
Portugal (2010)
Islândia (2010)
Argentina (2010)
Dinamarca (2012)
 
EUA:
Massachusetts (2004)
Connecticut (2008)
Iowa (2009)
Vermont (2009)
New Hampshire (2010)
Nova Iorque (2011)
Washington D.C. (2010)
Tribo Coquille (2009) *
Tribo Suquamish (2011)*
Washington (2012)
Maine (2012)
Maryland (2013)
*Pelo menos um dos parceiros deve ser membro da tribo
 
Brasil:
Alagoas (2011)
Bahia (2012)
Distrito Federal (2012)
Piauí (2012)
São Paulo (2012)
 
México:
Cidade do México (2010)
Quintana Roo (2012)

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