Hollande escolhe um gestor de crises para a recta final do Governo

Bernard Cazeneuve deixa o Ministério do Interior, onde enfrentou a vaga de atentados em França, para substituir Manuel Valls.

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Reuters/PHILIPPE WOJAZER

Bernard Cazeneuve vai liderar o Governo francês até às eleições presidenciais de Abril, anunciou esta terça-feira o Presidente, François Hollande, um dia depois de o actual primeiro-ministro, Manuel Valls, se ter apresentado como candidato à presidência. O homem que enfrentou a crise dos refugiados e a onda de atentados terroristas tem agora a tarefa de segurar as rédeas de um governo fragilizado.

Hollande decidiu optar por um dos seus ministros mais próximos para liderar o executivo nos próximos cinco meses. O objectivo de Cazeneuve, um homem que suscita poucos anticorpos se comparado com Hollande ou Valls, é cumprir uma governação tranquila e sem percalços para que as hipóteses do candidato socialista de chegar à segunda volta, a 7 de Maio, não sejam ainda mais prejudicadas. A cinco meses das eleições, quase todas as sondagens dão como certo um confronto entre o candidato da direita, François Fillon, e a líder da extrema-direita, Marine Le Pen.

A escolha de Cazeneuve era já antecipada pela imprensa francesa. O ministro do Interior tornou-se num dos nomes incontornáveis do executivo socialista, sobretudo porque o seu consulado coincidiu com a vaga de atentados que abalaram França nos últimos dois anos. O jornal Le Monde definiu-o como “o homem das missões difíceis” e na política francesa Cazeneuve é conhecido como o “canivete suíço”, por causa da sua capacidade de adaptação a funções muito diferentes.

O seu percurso no Governo demonstra isso mesmo. Começou como secretário de Estado dos Assuntos Europeus e teve um papel vital para conseguir fazer aprovar o pacto de estabilidade exigido por Bruxelas, logo no início da presidência Hollande. A primeira emergência não demorou muito a chegar. Em Março de 2013, rebenta um escândalo de fuga aos impostos que envolve o secretário de Estado do Orçamento, Jérôme Cahuzac, e é chamado Cazeneuve para o substituir.

Um ano depois, o destino é o Ministério do Interior, onde ocupa a vaga deixada por Valls, promovido a primeiro-ministro na sequência da débacle socialista nas eleições municipais. Foi neste cargo que Cazeneuve teve de gerir os efeitos da crise humanitária dos refugiados que nos últimos anos tentaram chegar à Europa. Em França, o ponto mais sensível desta crise foi Calais, onde durante anos milhares de pessoas viveram em acampamentos improvisados em condições muito precárias, com o objectivo de conseguirem alcançar o Eurotúnel e chegar ao Reino Unido.

Terrorismo e críticas

Mas é ao terrorismo de inspiração islamista de que a França tem sido alvo que o rosto de Cazeneuve ficará ligado. Entre o ataque à redacção do semanário satírico Charlie Hebdo, em Janeiro de 2015, e o massacre de Nice, a 14 de Julho de 2016, foram mortas 238 pessoas. As maiores críticas ao seu trabalho vieram na sequência do atentado de Nice, ocorrido durante os festejos do feriado nacional, por alegadas falhas no dispositivo policial. Na altura, o ministério de Cazeneuve foi acusado de ter pressionado uma responsável policial para alterar o relatório sobre as operações de segurança daquele dia – acusação negada pelo próprio ministro.

Os pontos mais polémicos do mandato recente de Cazeneuve foram escolhidos pelos adversários políticos dos socialistas para criticar a nomeação. O porta-voz da Frente Nacional, Florian Philippot, classificou a escolha de “surrealista”. “O ministro do Interior que pôs a polícia nas ruas e viu o islamismo matar é recompensado com Matignon [gabinete do primeiro-ministro] ”, acrescentou.

O deputado da direita que dirige a comissão de inquérito aos atentados do ano passado, Georges Fenech, considera a nomeação de Cazeneuve “chocante”. Entre os socialistas, a escolha foi bem recebida, com vários dirigentes a destacarem a experiência e a capacidade de trabalho do primeiro-ministro. Para o primeiro secretário do Partido Socialista, Jean-Christophe Cambadélis, “França está em boas mãos”.

 

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