Berlusconi ameaça Governo Monti e quer voltar a candidatar-se

A Itália despediu-se de Silvio Berlusconi sem grande pompa e o antigo primeiro-ministro ainda não parece estar pronto para se despedir do país.

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“A situação está hoje muito pior do que há um ano", disse Berlusconi Tony Gentile/REUTERS

O Presidente italiano está nesta sexta-feira em conversações com os líderes partidários do país para avaliar se o Governo de tecnocratas de Mario Monti ainda tem a maioria necessária para permanecer no poder.

As dúvidas surgiram na quinta-feira, quando a maioria dos eleitos do Povo de Liberdade (PdL), de Silvio Berlusconi, recusou votar duas vezes com Monti, primeiro no Senado, abandonando fisicamente o hemiciclo; depois na Câmara dos Deputados, abstendo-se.

Tanto a moção de confiança no Senado – a propósito de um decreto de lei conhecido como “Desenvolvimento”, que inclui medidas para estimular o investimento em infra-estruturas e modernizar as escolas – como o decreto apresentado na Câmara para cortar nos “custos da política”, reduzindo o número de eleitos regionais ou as viaturas de função, foram aprovados com maioria relativa e o apoio da maior formação, o Partido Democrático, de centro-esquerda. Mas no ar ficou a possibilidade de a direita querer deixar cair o Governo, meses antes das legislativas, previstas para a Primavera.

“Este foi um sinal claro de que não gostamos do caminho que a nossa economia tomou”, disse aos jornalistas Angelino Alfano, secretário do PdL. “Se quiséssemos fazer cair o Governo tínhamos votado contra.”

O líder do PD e candidato anunciado à chefia do Governo, Pier Luigi Bersani, denunciou uma atitude “irresponsável” e apelou à “sabedoria” do Presidente, Giorgio Napolitano, para evitar uma crise política. À espera de indicações do chefe de Estado, o primeiro-ministro, Mario Monti, afirmou que o Governo continua o seu trabalho “normalmente”.

É a Napolitano que cabe decidir se Monti tem condições para se manter no poder ou se as legislativas devem ser antecipadas. Tentando acalmar os mercados , o chefe de Estado desvalorizou o sucedido: “Há tensões pré-eleitorais que até fora de Itália podem ser entendidas sem ser necessário criar alarme sobre a solidez institucional do país”.

Monti chegou ao poder há pouco mais de um ano, quando o último Governo de Berlusconi estava bloqueado entre a perda da maioria no Parlamento e os escândalos que envolviam o primeiro-ministro. Sob pressão de Bruxelas, que temia ver a crise da zona euro arrastar a terceira maior economia da União Europeia, o Cavaliere saiu de cena e Monti assumiu a liderança de um Governo de “emergência nacional”.

Espírito de sacrifício e desespero
“A situação está hoje muito pior do que há um ano, quando deixei o Governo por sentido de responsabilidade e amor ao meu país. Há mais um milhão de desempregados, a dívida cresce, o poder de compra cai, a pressão fiscal está em níveis insuportáveis… Não posso permiti-lo”, avaliou Berlusconi em declarações no final de uma reunião de três horas da cúpula do PdL, na quarta-feira à noite.

Retomando um dos seus discursos habituais, segundo o qual todo o seu envolvimento político é movido por espírito de sacrifício em nome do país, Berlusconi garantiu ser “inundado por pedidos para anunciar o mais depressa possível o regresso ao primeiro plano”. “Muitos me pedem que salve a Itália”, assegurou.

A responsável do PD no Senado, Anna Finocchiaro, acusou o PdL de “descarregar no país a sua ausência de estratégia e a sua indecisão”, referindo-se aos sucessivos anúncios e desmentidos de que Berlusconi vai abandonar a política ou, pelo contrário, voltará a candidatar-se à liderança do Governo. O partido tem eleições primárias marcadas para 16 de Dezembro, mas não é certo que se realizem.

Em causa está de facto algum desespero – de Berlusconi, que se decidir afastar-se da política se arrisca a ficar mais desprotegido face aos processos judiciais que enfrenta, mas também de parte da liderança da direita italiana, que há 20 anos vive à mercê das vontades do político-empresário e foi incapaz de preparar a sucessão. Actualmente, as sondagens dão ao PdL pouco mais de 14% das intenções de voto.

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